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PM leva computador do Condepe com dados sobre denúncia de violência policial

Na máquina levada pela Polícia Militar estavam nome, endereço e contato dos denunciantes, além de relatório sobre violência policial. Apreensão será denunciada pelo conselho à OEA

São Paulo – O Conselho Estadual de Direitos Humanos (Condepe) informou, nesta terça-feira (22), que um computador com nome, endereço e contato de pessoas que denunciaram violência policial foi apreendido pela Polícia Militar pela manhã, em uma ação de busca e apreensão na sede da entidade, no centro de São Paulo. Na CPU apreendida está também o relatório da comissão que analisa violência policial no estado, que estava para ser finalizado nas próximas semanas.

“Nossa preocupação é com os dados sigilosos que estão na CPU. São relatórios dos conselhos, informações de pessoas que fizeram denúncias e um relatório sobre violência policial”, afirma a presidenta do conselho, Maria Nazareth Cupertino, em entrevista coletiva. “O problema é esse computador não estar no Condepe. Lá estão todas as denúncias que se referem à violência policial e o nome endereço e contato dos denunciantes”, disse.

O computador foi levado por volta das 7h, sem a presença de nenhum conselheiro. O órgão enviou um oficio para a Secretaria de Segurança Pública informando que existem dados sigilosos no computador e que é preciso garantir este sigilo. O conselho pretende fazer uma denúncia da apreensão do computador a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA).

Na mesma operação da polícia e do Ministério Público, batizada de “Ethos”, 41 pessoas foram presas (na maioria advogados) acusadas de movimentar dinheiro do crime organizado em sua conta bancária e de criar uma espécie de banco de dados com os nomes e endereços de agentes penitenciários e de seus parentes que poderiam ser mortos quando a facção julgasse necessário.

Entre elas está o vice-presidente do Condepe, Luiz Carlos dos Santos, preso em sua casa, em Cotia, na região metropolitana de São Paulo, acusado de receber uma mesada de cerca de R$ 5 mil da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) para “plantar” denúncias falsas de violação de direitos humanos com o intuito de desestabilizar a segurança do estado. Até hoje, ele teria recebido cerca de R$ 130 mil, segundo a acusação.

Segundo o subprocurador-geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais do Ministério Público de São Paulo, Mário Sarrubbo, as investigações revelaram que duas pessoas ligadas ao PCC tentaram ser eleitos para o Condepe, sem sucesso. Eles resolveram então cooptar o vice-presidente do órgão para atividades ilícitas.

“Se estivessem no Condepe, haveria grande possibilidade do avanço sobre as forças de segurança do estado. Além disso, eles poderiam fazer um trabalho no sistema penitenciário, com intuito de usar o nome do Condepe”, declarou em entrevista coletiva.

Em nota, os conselheiros reiteraram o princípio da presunção de inocência. “Ao contrário do que se tem afirmado, nenhuma denúncia de violação de direitos humanos apresentada pelo conselheiro Luiz Carlos se mostrou inconsistente, sendo todas devidamente embasadas em processos administrativos e posterior apuração.”

Nazareth afirmou que o órgão acredita em perseguição. A conselheira lembrou que “foram presas 41 pessoas e só o Luiz é mencionado”. O Condepe afirmou que essa é a primeira denúncia contra Santos que chega à entidade e que o órgão não se pronunciará sobre a prisão do seu vice-presidente enquanto não tiver acesso aos autos do processo. O Conselho se colocou à disposição da Justiça para contribuir com a apuração dos fatos.

O Condepe lembrou que nos últimos anos Santos tem se dedicado a “denunciar práticas de violência policial, a cobrar apuração das chacinas no estado de São Paulo, bem como a apontar violação de direitos no sistema prisional”, segundo a nota. “Em um momento de ascensão de discursos e práticas que violam os direitos humanos, reafirmamos o papel do Condepe na defesa do Estado democrático de direito, das liberdades constitucionais, do direito à livre expressão e manifestação, refutando quaisquer intenções de criminalização dos movimentos sociais e dos defensores dos direitos humanos.”

Leia aqui a nota na íntegra.

Informações sigilosas

Membro do Condepe e presidente eleito do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Rogério Giannini participou da coletiva de imprensa e refutou a apreensão do computador do Conselho, que possui dados estritamente sigilosos, referente a vítimas de violações dos direitos humanos.

“Precisamos ficar atentos ao método. Fomos surpreendidos com a notícia de uma operação gigante, mas o curioso é que só estão pontuando a prisão temporária do nosso vice-presidente. Mas grave mesmo é a apreensão de um computador que não é do Luís Carlos, mas do Condepe, com informações sigilosas. Apesar de haver uma ordem judicial para a apreensão, o Condepe é uma instituição do estado. Retirar um instrumento de trabalho com informações sigilosas parece um ato excessivo”, sugeriu.

Giannini também ressaltou que muitas denúncias apuradas pelo Condepe saem antes na imprensa. 

“As pessoas vêm aqui para reiterar a denúncia, para pedir orientação. E, assim, o Condepe segue o seu cerne legal de trabalho. De forma alguma existem aqui denúncias falsas, para levantar dúvida sobre qualquer instituição policial. Pelo contrário, muitas dessas denúncias são públicas. Luiz Carlos tem uma atuação contundente, é uma pessoa que tem sua trajetória, o que o fez ser eleito vice-presidente. Se nos autos do processo houver algum crime que ele tenha praticado, que a justiça se encarregue, mas ligar isso ao fato de que o Condepe esteja a serviço do crime organizado, de plantar falsas denúncias para as imagens das corporações serem manchadas, é absurdo!”, disse.

Para ele, é necessário reafirmar o papel do Conselho na defesa irrestrita dos direitos humanos, “seja na questão da violência policial, na questão da internação compulsória, na questão do sistema prisional. Ou seja, toda pauta de preservação dos direitos humanos continuará sendo defendida pelo Condepe”.

Confirmando tratar-se de algo inédito na história do Conselho, Giannini questiona o clima de culpabilização imediata e a tentativa de ligar qualquer malfeito do vice-presidente ao Conselho.

“O Condepe é conduzido por pessoas altamente esclarecidas, com representação do Executivo, do Parlamento, do Judiciário, da Procuradoria, da Defensoria Pública do Estado. Não estamos falando de um bando de gente desinformada e desavisada que vai lá e planta denúncias falsas. Isso é muito grave”, finaliza.

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