“Vai ter Copa. O que não vai ter é água em São Paulo”. Com esse mote, a CUT, o SinPsi e os movimentos sindical, social e estudantil fizeram ato público na zona oeste de São Paulo, na manhã desta quinta-feira (5/6), com o objetivo de esclarecer a população sobre a irresponsabilidade na falta de investimentos do governo do estado em recursos hídricos, resultando na falta de abastecimento de água para a população.
O ato partiu da Praça Victor Civita, em Pinheiros, e seguiu com carro de som até o prédio da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). Quem pegou o microfone alertou sobre o problema, embasado em avaliações preocupantes da Agência Nacional de Água (ANA), como as que podem ser lidas aqui.
Segundo a CUT, dirigentes e lideranças afirmaram que não há previsão de obras e serviços que, em curto ou médio prazo, resolvam a gestão de água.
Para o presidente do SinPsi, Rogério Giannini, a situação vem para derrubar uma bandeira que o PSDB sempre levantou com muito orgulho.
“Sempre se falou muito na eficiência da gestão do partido do nosso governador, Geraldo Alckmin. E agora essa crise toda, que vemos em outros setores da administração também, como o dos transportes públicos, muito bem ilustrado hoje pelo primeiro dia de greve dos metroviários. Está aí o resultado de 20 anos de governo do PSDB no maior estado brasileiro”, afirmou.
O ato público foi realizado numa parceria entre a CUT e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Levante Popular da Juventude, União Nacional dos Estudantes (UNE), Marcha Mundial de Mulheres e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), entre outras entidades.
Membro do MAB, Liciane Andriole é natural de Santa Catarina, onde foi atingida por barragem, e mostrou sua indignação durante o ato.
“A sociedade paulista está sem água e isso é muito grave. Temos duas décadas de falta de investimentos na rede de abastecimento de água. Estamos aqui para lutar por um direito básico, mas com a mesma força com que lutamos pelas pessoas atendidas pelo movimento do qual faço parte”, disse Liciane.
O Movimento de Atingidos por Barragens atende famílias e pessoas ameaçadas e expulsas de suas casas pelos empreendimentos das barragens. Atua em 17 estados, com o objetivo de formar e informar a população atingida por barragem.
“Há um modelo no setor elétrico, hoje, com uma visão totalmente privatista, que não respeita a vida das famílias que moram à beira do rio. O MAB mobiliza e organiza essas pessoas para a busca da conquista de seus direitos. Nesse momento, o movimento está debatendo a constituição de uma política nacional de tratamento dos atingidos por barragens. Hoje não há uma lei que beneficie e reconheça os atingidos por barragem”, explicou a companheira, membro do MAB há dez anos.
Batucada
A batucada Carlos Marighella, conduzida por jovens do Levante, marcou a percussão e as ruas foram tomadas pelo vermelho das bandeiras e o verde e amarelo nas camisetas da CUT São Paulo em alusão à Copa.
Representantes dos movimentos pretendiam entregar um documento cobrando medidas do secretário estadual de Recursos Hídricos, Mauro Arce, mas o governo estadual recusou e se limitou a agendar uma reunião para o próximo dia 2 de julho.
Além da capital e municípios da área metropolitana de São Paulo, a falta de água atinge a região de Campinas, afetando diretamente cerca de 25 milhões de pessoas, ou 62,5% do total de 40 milhões de habitantes do estado mais rico do Brasil.
Emprego e economia em risco
Para o presidente da CUT São Paulo, Adi dos Santos Lima, a falta de abastecimento de água nas residências é grave, mas não é a única preocupação da Central.
“Também estamos preocupados com a falta de abastecimento nas empresas, pois várias já estão dando licença remunerada aos funcionários porque a contratação de caminhões-pipa para a produção é onerosa. A crise pode também causar fuga de indústrias e, o que é pior, desemprego”.
O grande problema, segundo Adi, é o modelo de gestão que o governo de São Paulo vem imprimindo no estado, que não valoriza o funcionalismo público e não implanta políticas públicas.
“Em vez de investir em tecnologia e nos seus próprios funcionários, o governador Alckmin prefere entregar para a iniciativa privada aquilo que é de sua responsabilidade”, denunciou.
A previsão é de que, no Sistema Cantareira, acabará em novembro o volume morto, que é a água estocada abaixo do nível de captação das comportas. Num cenário otimista – com o qual só a Sabesp conta – esse recurso vai durar até março de 2015, contradizendo as previsões meteorológicas que apontam baixíssimo volume de chuva no próximo período.
Vagner Freitas, presidente nacional da CUT, ressaltou a estagnação que a economia paulista vem sofrendo há 20 anos com o descaso do tucanato, que fez com que o estado, que já foi a locomotiva do país, seja hoje uma vergonha nacional. Ele também criticou duramente a postura de Alckmin pelo não investimento de recursos enviados pelo governo federal, já que São Paulo foi a federação que mais recebeu dinheiro do PAC para projetos de saneamento básico.
“É um governador que confunde luta política com representação da população e pune o povo com a falta de água por conta de uma disputa pequena, tacanha. Governar é uma obrigação com a população. Não podemos parar o Brasil e transformá-lo num campo de guerra por causa de uma eleição”, disse Freitas.
Gentil Teixeira de Freitas, secretário de Energia Elétrica da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas do Estado de São Paulo (Ftiuesp), recordou que, no racionamento de energia em 2001, o PSDB pôs a culpa em ‘São Pedro’.
“Os tucanos não investiram no país naquele período e a situação em São Paulo é semelhante”.
Caos anunciado
“Todo esse sistema de abastecimento sempre trabalhou no limite e qualquer evento não previsto, como a falta de chuva e as altas temperaturas do verão, poderiam causar o caos que está acontecendo agora”, afirmou Edson Aparecido da Silva, assessor da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU) e coordenador da Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental.
Ele lembrou que o governo paulista é alertado há 10 anos para os riscos desse problema e explicou que, agora, não basta investir em obras, pois são necessárias também ações estruturantes para redução de perdas, que chegam a 35% na distribuição de água segundo a Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp).
“A responsabilidade por essa escassez é do governo estadual do PSDB, assim como a enorme quantidade de vazamentos e a falta de manutenção. Não houve sequer substituição das tubulações, todas velhas, e, o mais grave, ainda há tubos de amianto, substância cancerígena, levando água para a população”, destacou o deputado Marcos Martins (PT), representando a Assembleia Legislativa paulista.
Água como mercadoria
Arthur Miranda, vice-presidente da UNE, ressaltou que o movimento se juntou aos trabalhadores/as para denunciar a falta de compromisso com a população.
“Alckmin esconde o rodízio no abastecimento por razões eleitoreiras e essa política falida se reflete em outras áreas, como nas universidades públicas cada vez mais sucateadas”.
Para Gilberto Cervinski, da coordenação do MAB, a questão “é uma luta estratégia pela água pública, pois em São Paulo a escassez é resultado do processo de privatização da Sabesp, no qual a prioridade do governo do PSDB foi a lucratividade e a remessa aos acionistas da companhia”. O governo Alckmin é acionista majoritário da Sabesp, com 50,3% das ações, e é o maior beneficiado com os lucros que chegam a R$ 2 bilhões anuais.
Sonia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres, relatou a lida diária feminina diante dos transtornos causados pela falta de água.
“O problema atinge principalmente as mulheres mais pobres, que têm que acordar de madrugada para encher a máquina de lavar e o tangue para ter água no dia seguinte. É momento de dar um basta nessa gestão que não investe em creches, nem no combate à violência contra a mulher. É como se São Paulo não tivesse governo estadual”.
“Essa crise é mais uma expressão da forma como o governo estadual trata direitos como mercadoria e é fundamental lutarmos contra isso. É uma gestão que insiste em não construir um processo de investimento público e com debate social sobre algo tão elementar como a água”, destacou Lira Alli, do Levante Popular da Juventude.
Além dos movimentos social e estudantil, o ato contou com a participação de diversos sindicatos filiados à CUT/SP nos ramos da alimentação; financeiro; metalúrgico; químico; urbanitário; transporte; serviço público estadual e municipal; educação e saúde, entre outros.