Aprovado na Câmara e na comissão de Educação do Senado, o PLC 37/2013, de autoria do ex-deputado e atual ministro da Cidadania, Osmar Terra, deverá punir mais duramente dependentes de crack e cocaína
A população mais pobre, que já está sendo prejudicada com os cortes de investimentos em saúde e educação, com perdas de direitos trabalhistas e fortemente ameaçada pelo projeto de desmantelamento da Previdência, tem outro motivo para se preocupar: o avanço de projetos que pretendem endurecer ainda mais a atual Lei de Drogas (Lei 11.343/2006).
De acordo com dados da Plataforma Brasileira de Políticas de Drogas (PBPD), a população carcerária do Brasil aumentou 81% após a aprovação da Lei de Drogas, em 2006. Em 2016, eram 726 mil pessoas presas por crimes relacionados a drogas – incluindo os 40% de presos provisórios.
Essas pessoas presas refletem a desigualdade no país: 74% são negros e 45% nem chegaram a concluir o ensino fundamental. E a maioria estava desarmada, sozinha e com pequenas quantidades de droga, em torno de 10 gramas a 15 gramas.
A mais adiantada das propostas é o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 37/2013, apresentado em 2010 pelo então deputado e atual ministro da Cidadania Osmar Terra (MDB-RS). Aprovado em plenário pelos deputados em 2013 e pela Comissão de Educação do Senado, foi distribuído ontem (11) à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). O relator designado é Styvenson Valentim (Pode-RN), o capitão Styvenson, da Polícia Militar.
“Em resumo, o PLC é mais um motor para o super encarceramento ao propor o aumento de pena de prisão para pessoas condenadas por tráfico, institucionaliza a internação forçada e abre as portas para as comunidades terapêuticas”, diz o advogado Cristiano Maronna, secretário-executivo da PBPD.
Além disso, a proposta traz de volta a abstinência como objetivo do tratamento da dependência, quando as políticas mais modernas voltadas ao tratamento de saúde de usuários estão focadas na redução de danos e investimentos nas determinantes do sofrimento psíquico que empurra as pessoas para o uso excessivo de drogas e ao rompimento de laços afetivos e familiares.
E ao estimular as comunidades terapêuticas, que já existem e recebem recursos públicos, inserindo-as no Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad), possibilita que esse setor dominado por igrejas evangélicas possa vir a influir nas políticas para o setor como forma de garantir reserva de mercado.
Criminalização
Apesar das medidas ultrapassadas, baseadas mais em aspectos morais e religiosos do que comportamentais e científicos, o PLC 37 não pode ser considerado um total retrocesso quando comparado à legislação em vigor. “A atual Lei de Drogas também é muito ruim ao criminalizar o que a sociedade tolera”, explica Maronna, lembrando o elo com o aumento no número de prisões no Brasil. Em 2017, a população carcerária brasileira foi a terceira maior do mundo.
Para o especialista, o caminho é no sentido oposto: descriminalização das drogas com práticas de redução de danos relacionados ao uso de drogas por pessoas que não podem, não conseguem ou não querem parar de consumi-las. Isso requer o cuidado da pessoa em liberdade e o respeito à autonomia.
A melhora da qualidade de vida, das relações sociais e o próprio entendimento dos efeitos da droga e de seus possíveis prejuízos são considerados ganhos terapêuticos. Exemplo bem sucedido foi o programa De Braços Abertos, criado em São Paulo pelo ex-prefeito Fernando Haddad (PT).
“Vejo com muita preocupação o processo que transformou uma agenda em bandeira política, baseada no discurso de ódio. A legislação penal já é dura com a intervenção penal que se dá. Com a redução no campo das democracias, com decreto elogiando a letalidade da polícia, o uso excessivo das forças, é o abandono da racionalidade.”