12mar2024 – Por Norian Segatto
O Projeto de Lei 3945/2023 (que cria o Dia das Comunidades Terapêuticas) é um escárnio em todos os sentidos. De autoria do senador Flávio Arns (PSB-PR), sobrinho do ex-arcebispo de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns, de quem parece ter recebido o sobrenome, mas não a capacidade de compreender a dimensão do sofrimento humano, o PL foi aprovado pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado, em 28 de fevereiro.
E, pasmem, recebeu o voto favorável do relator do projeto, senador Paulo Paim (PT-RS), político que se notabilizou por defender trabalhadores, aposentados e a camada mais vulnerável da população. Lamentável que o consistente trabalho do senador ao longo de décadas venha a ser manchado pela decisão de criar um dia em homenagem a uma instituição que sistematicamente é alvo de denúncias de maus tratos, opressão religiosa e financiamentos públicos pouco transparentes.
Diversas entidades do campo da saúde mental e dos direitos humanos, como o Fórum Estadual Antimanicomial, conselhos de psicologia, Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) entre outros, já se posicionaram de forma contrária à criação de uma data em homenagem aos modernos manicômios, que voltaram com cara nova e práticas antigas.
Denúncias em série
Em 2017, o Relatório Inspeção Nacional em Comunidades Terapêuticas, produzido pelo Conselho Federal da Psicologia, Ministério Público Federal e Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura identificou uma série de denúncias como conversão religiosa compulsória, maus tratos, trabalho forçado, torturas de diversos tipo e “cura gay” entre outros. No #22 PodSin (podcast do Sindicato), a presidente do CRP-RJ, Céu Cavalcanti, faz um emocionado relato de um atendimento que fez de uma pessoa trans que conseguiu fugir de uma comunidade terapêutica. É esse tipo de prática que o Senado quer homenagear.
Recentemente, o CNDH emitiu a recomendação 02/2024 para que o Congresso não aprove o PL 3945, destacando a importância de alinhar as políticas de saúde mental com os princípios dos direitos humanos, conforme expresso em acordos e tratados internacionais.
O texto aponta para a falta de análise dos órgãos de controle social sobre as comunidades terapêuticas, contrariando legislação do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e reforça a ausência de mecanismos que estabeleçam critérios específicos para o funcionamento dessas comunidades, bem como de protocolos de monitoramento e avaliação.
Em novembro de 2023, o programa Fantástico, da Rede Globo, exibiu uma longa matéria apontando denúncias contra comunidades terapêuticas. Parece que os senadores estavam dormindo naquele domingo à noite e não viram o que realmente são as tais CTs.
O SinPsi-SP se une às vozes críticas à aprovação do PL e conclama para que o senador Paulo Paim faça jus ao seu histórico de luta e não apoie a criação de um dia que homenageia entidades que ferem os direitos humanos básicos.