São Paulo – No último dia 6, o ex-ministro Paulo Vannuchi foi anunciado como um dos três novos integrantes da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). A escolha ocorreu durante a Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Antigua, na Guatemala. Vannuchi vai cumprir mandato de 2014 a 2017 ao lado de James Cavallaro, dos Estados Unidos, e do reeleito José de Jesús Orozco Henríquez, do México.
“Essa vitória é de muita importância, pois reforça a participação do Brasil nas discussões de Direitos Humanos do nosso continente”, disse a ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em nota emitida pelo governo federal. “Paulo Vannuchi tem sua história de vida ligada aos direitos humanos. Vannuchi foi um grande ministro para o Brasil e, com certeza, será muito importante na Comissão Interamericana de Direitos Humanos.”
Aos 63 anos, o ex-ministro da Secretaria de Direitos Humanos de Luiz Inácio Lula da Silva, entre 2005 e 2010, teve a seu favor o histórico de militante e de estudioso do tema. O jornalista foi preso na década de 1970 pela resistência à ditadura (1964-1985). Naquele período, foi um dos 34 signatários do manifesto entregue à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) denunciando os nomes de 233 torturadores.
Em seguida, já na fase final do regime, foi um dos organizadores do livro-documento Brasil Nunca Mais. Trata-se de um trabalho construído em segredo, com o apoio do então cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, a partir dos processos movidos pela repressão contra os presos políticos. Os arquivos do Judiciário reveleram a identidade de violadores de direitos humanos e a prática sistemática de tortura.
A redemocratização e a fundação do PT levaram Vannuchi a prestar assessoria política a Lula, ao partido e a sindicatos e outras organizações da sociedade civil, até a nomeação para o ministério. Após deixar o governo, passou a ser colaborador da Rádio Brasil Atual e da TVT com comentários diários sobre o cenário político do país.
Em entrevista à RBA concedida antes da viagem à Guatemala, ele afirmou que a comissão precisa retomar o trabalho de mediadora, que perdeu de vista para adotar o alinhamento automático às vítimas de violações de direitos humanos.
Além disso, avalia Vannuchi, a Venezuela se equivocou ao ameaçar deixar o sistema regional, mas tem razão em suas queixas sobre o papel que os Estados Unidos exercem sobre a comissão. “Houve um desequilíbrio entre as duas funções básicas do sistema, que são a defesa dos direitos humanos, quando eles são violados, e a promoção, com ações antes de eles serem violados. Na falta de dinheiro, apareceram doações, mas elas vieram para um item: liberdade de imprensa. E pegaram a Venezuela como espécie de bode expiatório. Qualquer que seja o problema da Venezuela, é um governo de sensibilidade popular, social, de anteposição à hegemonia norte-americana na região.”
A CIDH, com sede em Washington, nos Estados Unidos, tem sete integrantes e é um dos dois organismos do sistema interamericano de direitos humanos. A comissão funciona como um órgão de mediação entre Estados e vítimas de violações dos direitos básicos. No geral, causas são aceitas quando há clara negação do direito de defesa, esgotamento da possibilidade de recursos ou morosidade do sistema judicial. Caso não se chegue a uma solução amistosa após as recomendações emitidas pelo colegiado, o caso segue para a Corte Interamericana, sediada em San José, na Costa Rica.
Em 2011, sugestões feitas pela CIDH sobre a Usina Hidrelétrica de Belo Monte provocaram irritação no governo Dilma Rousseff, que decidiu retirar a candidatura de Vannuchi, interrompendo um período de 16 anos de presença brasileira na comissão – entre 1995 e 2002, o jurista Hélio Bicudo exerceu a função, sucedido pelo cientista político Paulo Sérgio Pinheiro.
“A força da candidatura é principalmente pelo respeito pelo Brasil e a vontade clara do sistema de ter o Brasil dentro. Se o Brasil não fica dentro, participando ativamente, é como se o sistema ficasse faltando uma parte do próprio corpo, fragilizado”, disse Vannuchi durante a entrevista concedida em 22 de maio, na qual considerou ainda que a postura de Dilma acabou tendo um resultado favorável por suscitar discussões sobre o desequilíbrio nas atitudes da CIDH.
A eleição é a segunda vitória da diplomacia brasileira em menos de 30 dias. No dia 8 de maio Roberto Azevêdo foi eleito para o cargo de diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). Foi a primeira vez que um representante do continente americano chegou ao posto mais alto do órgão.