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Lei Maria da Penha: eficácia incomoda machistas e conservadores

A mudança social provocada pela Lei 11340 – Maria da Penha, criada há três anos para coibir as agressões no ambiente doméstico, pode ser comprovada pelos números da Central de Atendimento à Mulher, ligado à Secretaria Especial de Políticas para Mulheres.

Apenas no primeiro semestre deste ano, o Ligue 180 registrou 161.774 atendimentos, número 32,36% superior ao mesmo período no ano passado.

Definida pelo relatório global “Progresso das Mulheres no Mundo e 2008/2009”, da Organização das Nações Unidas (ONU), como uma das três legislações mais avançadas para enfrentamento da violência contra as mulheres no mundo, a Lei Maria da Penha passou a sofrer ataques de setores conservadores do Legislativo e do Judiciário devido a sua eficiência e à constatação de que as agressões contra a mulher não terminarão em pagamentos de cestas básicas por parte do agressor

Na manhã desta quinta-feira (27), o Coletivo de Mulheres da CUT-SP convidou a direção da Central, a promotora de Justiça Eliana Vendramini e a coordenadora do Observatório da Mulher, Rachel Moreno, para debater os desafios atuais da lei e a implementação do Pacto de Enfrentamento a Violência contra a Mulher no Estado de São Paulo.

Presidente da CUT-SP, Adi Lima, iniciou os debates destacando como a entidade pretende atuar na defesa da Lei Maria da Penha. “A Central ajudou a construir essa conquista e promoverá campanhas para dar visibilidade a ela nos locais de trabalho e aumentar a consciência das pessoas sobre a necessidade de denunciar as agressões que persistem em nosso meio. Também cobraremos do Estado o investimento em políticas públicas para prevenção dos crimes e proteção das vítimas”, afirmou.

*O Judiciário e as delegacias*
Para Eliana Vendramini, os movimentos sociais precisam cobrar diuturnamente para que as delegacias cumpram seu dever.

“Nas delegacias não falta gente, falta é boa vontade”, comentou, citando o direito a medidas protetoras de urgência como ao abrigamento e ao afastamento do agressor, que não são apresentadas à vítima.

Outra lacuna apontada por Eliana está no poder Judiciário. “Em alguns casos, como em São Caetano, fazem o que chamam de Justiça restaurativa, porém, de forma ilegal. A vítima já trava uma luta atroz na delegacia, é humilhada e ainda houve que deve se reconciliar com o agressor? Isso contraria a nossa lei e a legislação de enfrentamento à violência contra a mulher no mundo”.

Segundo ela, é preciso esclarecer a questão da representação nos processos. A Lei Maria da Penha estabelece que a vítima tem o direito de dizer em uma audiência especial porque não quer processar o agressor.

Eliana Vendramini ressaltou ainda a importância de levar à sociedade uma visão da lei diferente daquela que a mídia vende. “Quando a Lei Maria da Penha entrou em vigor, tentaram desvirtuar dizendo que era muito rigorosa, prendia demais. Precisa explicar para um adulto que ele não pode ameaçar ou lesionar alguém? Não se trata de uma injustiça, mas a resposta a quem é perigoso para a sociedade.

A promotora lembrou às mulheres a importância de protocolar reclamações sobre o mau atendimento no setor Judiciário. “A Constituição determina que toda reclamação que entra no poder público deve ter resposta. Se tivemos algum problema com a delegacia da mulher, devemos enviar uma reclamação ao promotor e à corregedoria. O mesmo acontece no caso de um juiz. Porém, tudo deve ser documentado para que tenhamos o registro dos obstáculos que enfrentamos”, assinalou.

*O movimento feminista e o controle social*
Rachel Moreno abordou a questão das Casas Abrigo para as quais as mulheres são encaminhadas quando correm risco de morte. “Por motivo de segurança, a vítima é enviada a outra cidade e aí devemos pensar em como irá proceder para conseguir creche para os filhos e emprego. Será que as empresas que ganham isenção fiscal não podem oferecer contrapartidas sociais como contratar essas mulheres?”

Rachel disse ainda que é preciso mudar a mentalidade por meio da educação formal e informal. “Quanta violência as crianças assistem na TV? O que há na mídia além da propagação da violência e do machismo embutidos desde novelas até programas humorísticos?”

Para ela, é fundamental que o movimento feminista se aproprie do controle social das políticas públicas conquistadas. “As mulheres que sofrem com a violência não são acolhidas por nós para que atuem como instrumento de conscientização. Precisamos nos munir de dados, informações e argumentos para cobrar o poder público e transformamos mais mulheres em lutadoras de seus direitos”, afirmou.

A coordenadora do Observatório da Mulher comentou ainda a atuação do Estado de São Paulo na luta contra a violência. “São Paulo e Minas Gerais foram os dois últimos Estados a assinar o Pacto de Enfrentamento a Violência Contra a Mulher e isso só aconteceu após muita pressão porque o Serra entendia que era algo eleitoreiro. A delegada Rose – deputada estadual pelo PSDB – juntou todas as propostas que apresentamos e enviou à Secretaria Especial de Políticas Para as Mulheres. Há um candidato à presidência aqui no Estado e é capaz de o governo passar a imagem de ser o autor do melhor programa de enfrentamento à violência. A sociedade não deve se esquecer da resistência que enfrentamos do governador para assinar o pacto”, destacou.

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