São Paulo – O Metrô de São Paulo começou a “redemitir” ontem (22) funcionários que haviam sido dispensados após a greve da categoria, entre 5 e 9 de junho, mas que foram reincorporados dois meses e meio depois, em 27 de agosto, graças a uma liminar da 34ª Vara do Trabalho de São Paulo. As “redemissões” se respaldam em decisão emitida em 7 de outubro pela desembargadora Iara Ramires da Silva de Castro, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2), anulando as recontratações então concedidas pelo juiz de primeira instância Thiago Melosi Sória, que está em férias. A palavra final sobre as liminares será proferida por um colegiado de dez desembargadores em sessão ainda sem data para ocorrer.
Ao analisar as “provas” apresentadas pelo Metrô para sustentar as demissões, o mesmo magistrado havia ordenado a reintegração de outros 23 trabalhadores em 30 de setembro, elevando para 35 o número de funcionários readmitidos após a campanha salarial – dois voltaram após terem sido punido por engano e 33, por intervenção da Justiça. No total, foram 42 demissões ordenadas diretamente pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) como “lição” aos grevistas. Os desligamentos ocorreram assim que o mesmo TRT-2 julgou a greve dos metroviários como “ilegal e abusiva”.
O Sindicato dos Metroviários de São Paulo afirmam que as demissões ocorreram por motivações políticas, uma vez que a maioria dos funcionários punidos possuía algum tipo de atuação sindical dentro da empresa. Dois deles estavam diretamente vinculados ao Sindicato dos Metroviários e um, à Federação Nacional dos Metroviários. De acordo com a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo, o Metrô incorreu em “práticas antissindicais” ao demitir massivamente os grevistas – inclusive alguns que sequer participaram ativamente das paralisações.
Ao menos sete metroviários foram informados ontem (22) sobre o novo desligamento. Outros três esperam receber a notícia ainda hoje. Os dez foram os primeiros a retomar suas funções após as demissões, pois estavam incluídos no primeiro “lote” de julgamentos realizados pela 34ª Vara do Trabalho. Em 27 de agosto, Alckmin havia adiantado à RBA durante sua campanha de reeleição que entraria com recurso para que os metroviários readmitidos fossem novamente desligados da empresa. Um dia depois das eleições, dia 6 passado, o governador cumpriu sua promessa.
Na nova decisão, a desembargadora Iara Ramires da Silva de Castro derruba e classifica como “lastimável ilegalidade” as resoluções do juiz Melosi Sória. E diz que, ao conceder liminar em favor dos trabalhadores, o magistrado bloqueou o direito de defesa do Metrô. “Reintegrar os empregados sem nem ter ouvido a ré (empresa) desrespeita o princípio fundamental do contraditório”, argumentou. “A tutela antecipada foi concedida antes da audiência inaugural, o que impediu que o juiz examinasse possível intuito protelatório por parte da ré, não existindo razão da reintegração prematura dos obreiros nesse estágio processual.”
Iara Ramires alegou ainda que as readmissões foram “açodadas” – precipitadas – e podem causar “consequências e resultados” ao Metrô. A desembargadora, porém, não teceu qualquer comentário sobre o cerne da decisão do juiz Melosi Sória. Depois de analisar as alegações, documentos, áudios e vídeos fornecido pela empresa, o magistrado apontou exaustivamente em seu despacho a inexistência de provas que embasassem as demissões por justa causa dos metroviários.
Para o magistrado, o “vício formal” das dispensas e a ausência de elementos objetivos que pudessem sustentá-las foram tantas que “não revelam a prática das faltas graves atribuídas aos empregados dispensados”. Por isso, Melosi Sória havia concluído que “há grande probabilidade de acolhimento, na decisão final, do pedido de declaração de nulidade das dispensas”.
Daí a decisão liminar de reintegrar os trabalhadores, para evitar os prejuízos decorrentes de demissões que não se sustentam. “O direito dado ao empregado de se defender pressupõe a obrigação da empregadora de expor os fatos que levaram à dispensa por justa causa, sob pena de impedir a defesa”, lembrou o magistrado, antes de partir para a análise das alegações da empresa.
Histórico
O Metrô demitiu os dez funcionários ora readmitidos, entre outros motivos, com base na denúncia de que eles teriam impedido fechamento de portas do trem H58 na estação Tatuapé, na Linha 3-Vermelha, às 20h15 do dia 5 de junho. Os metroviários sempre negaram as insinuações, que não vieram acompanhadas de qualquer tipo de prova além do relato de supervisores.
“Analisando a gravação de vídeo que registrou a conduta dos substituídos, vejo que, embora os trabalhadores estivessem na plataforma, não aparecem impedindo o fechamento das portas do trem”, reconhece o juiz Melosi Sória. “Tanto as imagens quanto a gravação de áudio da conversa entre os operadores em serviço e os depoimentos testemunhais prestados no inquérito policial não trazem a individualização da conduta de cada trabalhador dispensado.”
O magistrado continua, argumentando que as testemunhas indicadas pelo Metrô disseram que não houve violência ou dano ao patrimônio da empresa, como alegou o governador Geraldo Alckmin ao anunciar os desligamentos. Isso era o que vinham dizendo os funcionários demitidos – e o que havia demonstrado a reportagem da RBA ao recorrer a documentos oficiais da empresa.
“A simples presença de uma pessoa no local em que houve a prática de um ato grave não pode ter o efeito de se fazer presumir a participação nesse ato”, ponderou o juiz. “Essa participação deve ser descrita individualmente para que se possa examinar a extensão e gravidade do comportamento de cada pessoa envolvida e sua aptidão para levar à punição disciplinar.”
Entre os dez readmitidos, três também são acusados por invadir a estação Ana Rosa, que integra as linhas 1-Azul e 2-Verde, “danificando fechaduras e impedindo a entrada dos empregados em serviço” às 6h15 do dia 6 de junho.
Na decisão, o juiz escreve que, apesar de a empresa ter ajuntado ao processo boletins de ocorrência registrando as supostas depredações, nenhuma testemunha narrou o tal arrombamento da fechadura da estação. “Não há prova de que esses trabalhadores efetivamente danificaram a fechadura da estação Ana Rosa ou utilizaram métodos violentos para ingressarem no local e impedirem o trabalho dos demais.”