‘Ocupação Laerte’ apresenta participação da cartunista no movimento sindical, na luta pelas Diretas Já e pela anistia, suas parcerias, a trajetória profissional e seu ativismo nas questões de gênero
Uma retrospectiva com mais de dois mil trabalhos de Laerte está em cartaz até 2 de novembro no Itaú Cultural, em São Paulo. Com curadoria do filho da cartunista, Rafael Coutinho, a Ocupação Laerte aborda os percursos político, criativo e afetivo de um dos nomes mais importantes dos quadrinhos brasileiros por meio de desenhos, cartuns, quadrinhos, ilustrações e curtas-metragens.
Trata-se de uma espécie de passeio pelos caminhos do Minotauro, monstro da mitologia grega que guarda um labirinto inescapável e que é figura recorrente na obra de Laerte. Aliás, este é o tema que inspira a cenografia, assinada por Fred Teixeira, que apresenta um espaço em que o espectador decide por qual da cinco entradas (e saídas) começa a percorrer os vários momentos da carreira de Laerte. Dentre as obras, constam 300 originais, 400 imagens digitais que podem ser visualizadas em tabletes e 1.500 impressas.
A mostra resgata desde a participação da artista na imprensa sindical por meio da Editora Oboré, passa pela sua luta pelas Diretas Já, pela Anistia, apresenta sua atuação nos veículos da grande imprensa, trata sobre suas parcerias com Angeli, Glauco e Toninho Mendes na Circo Editorial, sobre a mudança de estilo a partir de 2004 e o recente ativismo em questões de gênero.
Seus principais personagens compõem, é claro, o ambiente: Piratas do Tietê, Muchachas, os moradores de O Condomínio, Deus, Overman, Los 3 Amigos e, é claro, Hugo, que assim como Laerte, mudou de gênero e virou Muriel. Há também homenagens da cartunista a amigos e personagens que admira e uma autocaricatura em que ela dança com o minotauro, feita especialmente para a exposição.
Um dos destaques é a década de 1980, que conta com uma maior quantidade de obras. Mas a atuação de Laerte na imprensa sindical também é um importante percurso da mostra. “São tirinhas que ficaram presas na memória de um período político importante – o da ditadura – e permaneceram nos arquivos da Oboré por muito tempo”, afirma Rafael Coutinho.
No hotsite da Ocupação Laerte, Sérgio Gomes, jornalista e diretor da Oboré, relembra esta época: “Durante dez anos seguidos, o Laerte não foi a nenhum lançamento, a nenhuma vernissage, nada. Durante dez anos, o Laerte trabalhou durante o dia para a classe trabalhadora – de manhã na Oboré – e à noite para o jornal mais importante da burguesia, que era a Gazeta Mercantil”, diz o diretor da empresa de comunicação popular.
Mais que 40 anos de produção, as paredes da Ocupação apresentam, na verdade, vários Laertes. Ou várias Laertes. (O que menos importa aqui é o gênero, apesar de ele estar muito presente na vida e obra da artista nos últimos anos, desde que assumiu sua transgeneridade, em 2009.) “Nas paredes está uma gama de temas e assuntos – ciência, cosmos, humor, sexo, história, morte, guerra e gatos. Há dias bons e ruins, fragilidade e agressão, o bom e o mau gosto, o gosto dos outros”, apresenta Coutinho. E resume: “Cada caminho leva a uma compreensão do todo. Todos juntos não levam a lugar nenhum. Devolvem reflexões, a multiplicidade de Laertes e a sua própria natureza: dúvidas, avaliações cautelosas, sempre evitando armadilhas morais, preconceitos e maniqueísmos no julgamento do mundo”.
Estão lá o humor, o talento, a genialidade, complexidade e a militância de Laerte. Apesar de a exposição não esgotar toda a riqueza da artista, há boas doses de todos estes elementos.
Confira aqui a roda de conversa sobre a mostra que Laerte teve com a psicanalista Maria Rita Kehl, a escritora Ivana Leite e o ilustrador Elor Guazzelli.
Ocupação Laerte
Quando: até 2 de novembro
De terça a sexta, das 9h às 20h, sábados, domingos e feriados das 11h às 20h
Onde: Instituto Itaú Cultural
Avenida Paulista, 149, piso térreo, São Paulo (SP)
Mais informações: (11) 2168-1777
Hotsite: Ocupação Laerte Virtual