Derrubada do decreto de Dilma que fortalecia atuação dos conselhos populares na administração pública contou com apoio de partidos da base aliada, como PMDB, PP e PSD – apenas PT, PCdoB e PSOL defenderam a manutenção. Tema agora vai ser discutido no Senado
Depois de horas de discussão e obstrução do PT, PCdoB e do PSOL, o plenário da Câmara rejeitou ontem (28) o decreto presidencial que criou a Política Nacional de Participação Social. A rejeição se deu com a aprovação do Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 1491/14, apresentado pela oposição, anulando o decreto presidencial. O PDC, de autoria do deputado Mendonça Filho (DEM-PE), líder de seu partido, tem agora que ser apreciado pelo Senado.
A Abong, diversas entidades da sociedade civil e movimentos sociais já manifestaram seu apoio ao projeto, que sofreu ataques da mídia e de diversos partidos no Congresso desde seu lançamento.
O decreto 8.243/2014, da presidente Dilma Rousseff, cria a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e afirma que o objetivo é “consolidar a participação social como método de governo” que determina aos órgãos governamentais, inclusive as agências de serviços públicos, promover consultas populares. Na prática, a proposta obriga órgãos da administração direta e indireta a criarem estruturas de participação social. A discussão da matéria durou cerca de três horas, mas o texto ainda precisa de aprovação no Senado para que o decreto presidencial perca a validade.
Foram quase três horas de obstrução dos petistas, que estavam acompanhados do PCdoB e do PSOL, na tentativa de impedir a derrubada do decreto. De acordo com o líder do governo, deputado Henrique Fontana (PT-RS), o decreto presidencial apenas fortalece um conjunto de conselhos que amplia a representação da sociedade em processos de orientação e consulta sobre políticas públicas.
Durante a discussão, deputados do PT e do Psol disseram várias vezes que a oposição pretendia criar um “terceiro turno eleitoral” durante a votação do projeto para sustar o decreto de participação.
Para o líder do governo, deputado Henrique Fontana (PT-RS), o decreto apenas fortalece um conjunto de conselhos. “Ele melhora e amplia a participação da sociedade no controle da gestão pública”, declarou.
É o mesmo argumento do deputado Afonso Florence (BA), que é vice-líder do PT. “Não há uma linha sequer neste decreto que prove a subtração de prerrogativas do Legislativo. Ele fortalece a democracia, com a participação da sociedade civil, dos movimentos sociais organizados, setores empresariais, acadêmicos, instituições de pesquisa”, opinou.
Base aliada?
O governo perde, assim, a primeira votação na Câmara dos Deputados depois da reeleição da presidenta Dilma Rousseff. A oposição obteve o apoio de partidos da base, como PMDB, PSD e PP.
Um exemplo vem do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que convocou a sessão extraordinária para votar a matéria, contrariando o governo federal. Alves fez questão de conduzir a votação cobrando pressa nos encaminhamentos dos líderes contrários à medida.
Nos bastidores, alguns parlamentares atribuíram a atitude do presidente da Câmara à derrota sofrida na disputa pelo governo do Rio Grande do Norte nas eleições do último domingo. Quem se elegeu foi o adversário Robinson Faria (PSD), com apoio do PT e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso justificaria a tese de que Alves voltou para a Câmara com desejos de retaliação, sem espaço para diálogos com o líder do governo, Henrique Fontana (PT-RS).
Manifesto pela democracia
O decreto da presidenta Dilma Rousseff passou a sofrer ataques da imprensa e da oposição conservadora assim que foi lançado. Em resposta, um grupo de juristas, acadêmicos, intelectuais e líderes de movimentos sociais lançou um manifesto em defesa da PNPS, para ser entregue ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e ao presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Os primeiros signatários do manifesto foram os juristas Fabio Konder Comparato, Celso Bandeira de Mello e Dalmo Dallari, José Antônio Moroni (do Instituto de Estudos Socioeconômicos, Inesc) e João Pedro Stédile (do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST).
O documento defende o decreto afirmando que “contribui para a ampliação da cidadania de todos os atores sociais, sem restrição ou privilégios de qualquer ordem, reconhecendo, inclusive, novas formas de participação social em rede”. E sustenta que a proposta não possui nenhuma inspiração antidemocrática, “pois não submete as instâncias de participação, os movimentos sociais ou o cidadão a qualquer forma de controle por parte do Estado Brasileiro; ao contrário, aprofunda as práticas democráticas e amplia as possibilidades de fiscalização do Estado pelo povo”.