Fruto de luma lógica de trabalho que desconsidera os limites físicos e psíquicos dos trabalhadores – verificada em todos os setores produtivos – as Lesões por Esforços Repetitivos (LER) ou os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) constituem-se num dos mais graves problemas de saúde enfrentados pelos trabalhadores nas últimas décadas no Brasil e no mundo.
LER é uma terminologia guarda chuva que engloba várias alterações das partes moles do sistema musculoesquelético devido a uma sobrecarga que vai se acumulando com o passar do tempo, comprometendo seriamente – muitas vezes de forma irreversível – os tendões, articulações e músculos. Vão desde dores musculares (mialgia) e inflamações nos tendões e sinóvias (tenossinovites) até alterações graves do sistema modulador da dor, responsável pela regulação da relação entre o estímulo potencialmente provocador da dor e as reações sensitivas do organismo a esse estímulo
O que a princípio surge como uma sensação de desconforto, pontadas, formigamento ou dores na execução do trabalho, que se estendem para os períodos de descanso, acaba evoluindo para dores insuportáveis, inchaços, atrofias, perda de força muscular e da coordenação motora, Altamente incapacitante, até tarefas simples como escovar os dentes, pegar um copo e outros objetos tornam-se impossíveis de realizar. As repercussões na identidade, na vida profissional, familiar e social dos trabalhadores e trabalhadoras são devastadoras!
O sofrimento causado por sentimentos de incapacidade e de inutilidade gerados por esta situação são ainda maiores em razão do preconceito. Como a doença não tem sinais visíveis, muito menos a dor, homens e mulheres adoecidos são hostilizados, tratados como mentirosos, preguiçosos, gente que faz “corpo mole”, etc. tanto no espaço no trabalho, como por aqueles que deveriam assegurar os seus diretos previdenciários e trabalhistas.
A via-crúcis percorrida pelo reconhecimento da doença, tratamento, reabilitação e indenização como acidente de trabalho vai da empresa – cujos profissionais do Serviço Especializado de Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT), via de regra, culpam o trabalhador pelo adoecimento e se recusam a emitir a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), – aos peritos do INSS que, salvo exceções, colocam os trabalhadores sob suspeição como se estivem simulando doenças para “se encostar” no INSS.
Fruto de exigências desmesuradas do trabalho, da injustiça e do sentimento de desamparo que esta situação toda gera, a depressão e outros problemas psíquicos são quase inevitáveis entre os trabalhadores lesionados
Humanização do trabalho deve ser premissa das ações de prevenção
Nesta data em que se celebra o Dia Internacional pelo combate às LER-DORT queremos chamar a atenção para a importância da prevenção e para os direitos dos trabalhadores lesionados.
Conforme estudo realizado pelo Ministério da Previdência Social as LER DORT atingem todos os setores produtivos, com grande incidência na agricultura, indústria e setor financeiro, sendo verificada também no setor de transporte e na construção civil.
A prevenção das LER-DORT passa fundamentalmente por tornar as exigências do trabalho compatíveis com os limites humanos. Isto implica em mudanças na base técnica e organizacional do trabalho, em especial na diminuição da intensidade e dos ritmos de trabalho, que são acelerados por máquinas e/ou por metas de produção abusivas, sobrecarregando física e psicologicamente os trabalhadores e trabalhadoras.
Ginástica laboral, premiações (muitas vezes meramente simbólicas) e outras medidas que algumas empresas adotam tentar dar uma “cara mais humana” às relações de trabalho não resolvem o problema, se não houver uma mudança efetiva nas condições que geram o adoecimento. Ritmo e redimensionamento das metas, adequando-as às possibilidades reais de os trabalhadores executarem as tarefas são aspectos chaves.
Sabemos que mudar as condições de trabalho que levam ao adoecimento não é uma tarefa fácil, porque exige mudanças na forma como o trabalho é organizado, planejado e gerenciado, coisa que patrão nenhum quer mexer, exceto para ter mais lucros, pois para eles o que interessa é produzir cada vez mais, com menos trabalhadores, utilizando à exaustão o trabalho humano.
Sindicato organizado nos locais de trabalho e estratégias de prevenção e promoção de saúde desenvolvidos com a participação dos trabalhadores e trabalhadoras são pré-requisitos para humanizar o trabalho e evitar o adoecimento.
Duas publicações do INST-CUT da série Cadernos de Saúde do Trabalhador podem ajudar no trabalho neste tema (clique abaixo para ter acesso):
Lesão por Esforços Repetitivos -€“ LER, escrito pela Dra. Maria Maeno, Médica, Pesquisadora da Fundacentro
Prevenção da LER/DORT: que a ergonomia pode oferecer, escrito pela psicóloga, Prof. Dra. Regina Heloisa Maciel
O Protocolo de LER, recém produzido pelo Ministério da Saúde é outra ferramenta importante para esclarecer sobre a doença e os caminhos para assegurar os direitos. (clique aqui para download)
É importante, ainda, fazer valer a aplicação da NR 17 (Ergonomia) e seus anexos, que estabelecem parâmetros para adaptar as condições de trabalho às características psicofísicas dos trabalhadores e trabalhadoras.
Humanizar as Perícias Médicas e garantir os direitos previdenciários
A CUT tem desenvolvido um conjunto de ações pela humanização das perícias médicas do INSS, cujas condutas, salvo exceções, têm ido na contramão da boa prática médica e do papel do INSS como seguradora pública, que deveria ter como premissa o preceito constitucional de seguridade social e assegurar os direitos previdenciários dos trabalhadores nos momentos em que mais necessita, que são as situações de afastamento do trabalho por motivo de doença ou acidente de trabalho.
Contraditoriamente, são freqüentes cessações de benefícios sem a devida recuperação dos trabalhadores; o não reconhecimento da relação de causalidade de inúmeras doenças com o trabalho, em especial as LER-DORT e doenças mentais – que hoje ocorrem em dimensões epidêmicas e são os principais motivos de afastamento do trabalho – ; o descompasso de tempo entre a cessação de benefício e a perícia para avaliar um pedido de prorrogação ou de reconsideração deixando os trabalhadores por meses sem qualquer rendimento; o descaso e humilhação imputadas por peritos que tratam os trabalhadores como fraudadores.
A humanização das Perícias Médicas do INSS é uma reivindicação antiga que visa resguardar os direitos dos trabalhadores, contribuintes do sistema, e reverter a lógica meramente securitária predominante no INSS, que coloca os trabalhadores adoecidos sob suspeição de fraude, imputando-lhes uma trajetória de humilhações em situações que requerem afastamento do trabalho.
É direito dos trabalhadores a preservação da sua saúde no trabalho, assim como a reparação dos danos por ele causados, dentre outras formas, preservando os direitos trabalhistas (férias, recolhimento do FGTS, cômputo de tempo para aposentadoria, etc.) durante o período de afastamento por doença do trabalho.
Neste 28 de fevereiro a CUT reitera a Campanha pela Humanização das Perícias Médicas do INSS e está cobrando do governo medidas para resolução dos problemas extensamente denunciados em audiências e pronunciamentos públicos.