Nesta quarta-feira (31), milhares de servidores públicos do estado de São Paulo realizaram o “Bota-fora de Serra”, marcando com bom humor e ironia o 31 de março, dia em que o governador tucano se licenciou para concorrer à Presidência da República.
No “almoço de gala”, com direito à bandinha representando a orquestra e animada música de fundo (comer, comer é o melhor para poder crescer), foram servidas no vão livre do Masp coxinhas de galinha a R$ 4,00 – “cardápio do Executivo” – para lembrar o valor irrisório do vale-refeição pago pelo governo estadual ao funcionalismo.
Convidados, o governador José Serra e seu secretário de Gestão Pública, Sidney Beraldo, não apareceram à mesa de negociação composta por lideranças dos professores, servidores da saúde, judiciário e funcionários de escolas, representando as cerca de 40 entidades do funcionalismo estadual, ao lado do presidente da CUT-SP, Adi dos Santos Lima, e dos deputados estaduais Roberto Felício e Adriano Diogo, do Partido dos Trabalhadores.
“Precisamos refletir profundamente sobre o que os sucessivos governos do PSDB fizeram e continuam fazendo com o nosso Estado, onde se multiplicam os pedágios e avança a terceirização. A CPFL (Companhia de Energia) está para ser privatizada. Entra tucano e sai tucano e só aprofunda a crise”, frisou Adi.
Além de pagar um tíquete de R$ 4,00, explicou Benedito Augusto de Oliveira (Benão), presidente do Sindicato dos Servidores da Saúde, o governo Serra ainda tem a capacidade de fixar no Hospital das Clínicas a quantia de calorias que isso pode significar: “é um verdadeiro atestado de burrice”. Benão alertou para a falta de respeito e de materiais básicos, com a saúde do Estado mais rico do país padecendo de recursos, enquanto multiplicam-se as terceirizações.
DESGOVERNO
Segundo Carlos Ramiro de Castro (Carlão), presidente do Conselho do Funcionalismo do Estado de São Paulo, “com o bota-fora, estamos afirmando o nosso direito à dignidade contra esse desgoverno tucano e sua ideologia neoliberal”. A ideia, acrescentou, é que este dia sirva de reflexão e ação dos servidores para, “ao lado da sociedade, derrotar a política do Estado mínimo, de privatização, terceirização e desmonte dos serviços públicos”.
Representando a Federação das entidades dos servidores do Judiciário, Maricleir Real denunciou que os trabalhadores do setor “encontram-se há dois anos sem reajuste e Serra ainda cortou o Orçamento de 2010 pela metade, o que significa a não reposição de 15 mil funcionários que se aposentaram ou faleceram, a não contratação de novos”. Assim, explicou, “uma criança que for violentada pode demorar até 90 dias para ser atendida nos fóruns, enquanto a disputa de guarda de filhos está sendo agendada só para o mês de outubro”. Até o Juizado de Pequenas Causas, criado para dar agilidade ao atendimento, “passou de 10 dias para 10 meses”, denunciou Maricleir, que é também assistente social do Judiciário.
40 MIL PROFESSORES
Logo depois, no mesmo vão livre do Masp, os servidores se somaram à manifestação convocada pela Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) pela reposição das perdas salariais e melhores condições de trabalho no Estado de São Paulo. Com os braços cruzados desde o dia 8 de março, a categoria decidiu em assembleia realizada na Praça da República, em frente à Secretaria Estadual de Educação, pela continuidade da greve.
Desta vez, denunciou a Apeoesp, o governo do Pior Salário Do Brasil não se utilizou da tropa de choque nem infiltrou policiais à paisana para participar de tumultos, como fez na semana anterior, na tentativa de incriminar os manifestantes. Mais sutil, simplesmente mandou guinchar o caminhão de som que comandaria o ato, chegando ao cúmulo de fechar os banheiros públicos existentes nas imediações.
Conforme o tucanês, o caminhão da Apeoesp não foi apreendido, mas “escoltado até a garagem da instituição”. O tamanho do caminhão também virou um problema de uma semana para outra, passando a infringir, de acordo com o governo, a lei de restrição ao tráfego. Oficialmente, 300 policiais, 90 carros e 10 motos, além de um helicóptero, foram utilizados na “operação”.
Acompanhando a passeata, o presidente nacional da CUT, Artur Henrique, frisou que “a greve é um direito garantido pela Constituição de 1988 e o regime totalitário de Serra, por não admitir oposição, opta pela criminalização dos movimentos sociais”. Desde a aprovação da data-base dos servidores, em 2006, ressaltou, “jamais o governador aceitou estabelecer uma mesa de negociação com os servidores públicos paulistas”.
NÃO AO AUTORITARISMO
De acordo com a presidenta da Apeoesp, Maria Izabel Azevedo Noronha (Bebel), o governo estadual utiliza uma “tática autoritária, que desconhece o direito constitucional de greve”. Aliás, lembrou, “passou o tempo todo negando a existência da paralisação, que envolve milhares de escolas, dizendo que era de 1%”. “O fato é que tanto o governador como o secretário não tem nos respeitado como categoria profissional, mantendo a intransigência”, ressaltou.
Bebel explicou que “os professores querem abrir um canal de negociação, pois é inaceitável a manutenção da avaliação excludente e de uma política que arrebenta com o Plano de Carreira do Magistério, da mesma forma que é inadiável um concurso público de caráter classificatório”. Atualmente, o número de professores temporários chega a 113.242, praticamente a metade da categoria.
Em relação aos salários, a presidenta da Apeoesp lembrou que o movimento não está lutando por aumento, mas pela simples reposição das perdas, que alcançam 34,3% desde março de 1998. “Além disso, defendemos o respeito à data-base e que essa política de bônus e gratificações, que já demonstrou sua ineficácia para a melhoria da qualidade do ensino nos últimos nove anos, seja substituída por uma real valorização do magistério”, sublinhou.
Ao longo da Paulista e de toda a descida pela avenida Consolação, papéis picados eram jogados do alto dos prédios, com a população manifestando, com aplausos e buzinando, o seu apoio e solidariedade.
GEOGRAFIA DO IMPOSTOR
Junto às bandeiras da Apeoesp e aos balões da Central Única dos Trabalhadores, um imenso painel da União Municipal dos Estudantes Secundaristas (UMES) de São Paulo alertava “contra o impostor Serra”, reproduzindo em tamanho gigante a cartilha de Geografia confeccionada e distribuída pelo governo estadual: um mapa da América do Sul sem o Equador e com dois Paraguais.
Vindos de Itaquaquecetuba, os professores Wellington Cavalheiro, de matemática, e Júlio César, de história, denunciavam em suas camisas o comportamento da Rede Globo contra o movimento. Sob o logo da emissora, a frase: “Sorria, você está sendo manipulado”. Rindo, o professor de matemática disse que “o problema do número de manifestantes divulgado sempre a menos pelas emissoras de rádio e televisão, bem como nos grandes jornais, é porque eles não sabem contar”. Para o professor de história, “é uma questão de blindagem de quem apoia o neoliberalismo e sua lógica da exclusão”.
O presidente da Afuse (Sindicato dos Funcionários e Servidores da Educação), Antonio Marcos D`Assunção, enfatizou que os trabalhadores continuarão denunciando as mazelas de um governo que virou as costas ao funcionalismo e à população.
O presidente do Centro do Professorado Paulista (CPP), José Maria Conselheiro, ressaltou que “quem nos encaminhou para a greve foi o próprio governo, que se nega a repor até mesmo as perdas inflacionárias que a categoria acumula”. E quando os professores marcharam até o Palácio dos Bandeirantes para negociar, enfatizou, “nos receberam com brucutus, barreiras de cimento e todo tipo de armamento para segurar os educadores, na ânsia de que iriam nos confiscar o ânimo e a vontade de luta pela escola pública. Se enganaram, porque aumentou a nossa unidade e determinação”.
Nova assembleia foi marcada para a próxima quinta-feira, 8 de abril, quando a paralisação completará um mês. A concentração será novamente no vão livre do Masp, seguida de passeata até a República.