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A Anvisa adverte: o STF pode fazer mal à saúde

A decisão da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber, que tornou a permitir a venda de cigarros com aditivos, causou descontentamento em entidades que trabalham com a proteção da saúde. Na prática, a liminar concedida no último dia 13 dá à indústria do tabaco mais uma chance de postergar o cumprimento de uma medida debatida em nível mundial há uma década e, de quebra, coloca em suspenso o papel da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) na regulação do setor.

A coordenadora jurídica da organização Aliança de Controle ao Tabagismo (ACT), Adriana Carvalho, afirma que “historicamente, a indústria do tabaco sempre utiliza argumentos dramáticos para impedir que as medidas de controle do tabagismo sejam implementadas”.

A ACT aguarda um posicionamento do governo federal favorável à resolução e espera que a Advocacia Geral da União entre com recurso cabível para derrubar a liminar – até o momento, o Executivo não comenta oficialmente o assunto.

A ação direta de inconstitucionalidade movida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) alega que a aplicação da medida significará desemprego e fechamento de unidades de fabricação de cigarros.

A entidade alega que a proibição da Anvisa, feita pensando na atratividade de tabaco aromatizado para jovens, vai atingir na prática 98% da produção nacional. Além disso, argumenta a CNI, os produtos com ou sem aditivos têm o mesmo feito sobre a saúde, o que evidencia uma atitude “política” da Anvisa.

Em março de 2012, a agência nacional aprovou uma resolução que proibia o uso de aditivos de aromas e sabores nos produtos de tabaco. Os aditivos, além de darem sabor ao produto, são incluídos na constituição do cigarro para torná-lo mais palatável. A medida visava a tornar o cigarro menos atrativo para a população jovem, e foi fechada após anos de adiamento, com um prazo de 18 meses para que a indústria tabagista se adaptasse ao cumprimento da medida – ou seja, setembro de 2013.

A CNI argumenta que, em não havendo diferença para a saúde entre os tipos com e sem aditivos, não se faz necessária a proibição simplesmente como forma de desestimular o consumo. “A intenção não é neutralizar riscos excepcionais, mas os riscos inerentes ao produto, que, vale lembrar, são conhecidos do legislador”, diz a confederação, para quem a Anvisa tenta ferir a livre iniciativa de produção.

O Brasil, porém, é signatário da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, ratificada em 2006 pelo Congresso Nacional. O tratado foi discutido entre 1999 e 2003, com coordenação brasileira, no âmbito da Organização Mundial de Saúde (OMS). Em linhas gerais, os países que aderem ao acordo se comprometem a adotar medidas “para prevenir, e reduzir o consumo de tabaco, a dependência da nicotina e a exposição à fumaça do tabaco”.

No cotidiano das pessoas, isso resultou em leis que proíbem consumo de tabaco em locais fechados, restrições à publicidade e aumento de impostos a estes produtos. Durante as discussões sobre a Convenção-Quadro a CNI apresentou argumentos contrários ao controle, alegando que as medidas poderiam prejudicar os agricultores brasileiros e aumentariam a taxa de desemprego.

“Mesmo com a Convenção sendo aprovada, o Brasil continuou a ser o maior exportador mundial de tabaco e o terceiro maior produtor. Os lucros das empresas tabagistas não foram reduzidos. Então, os pontos que eles apresentaram e defenderam se mostraram inverídicos”, reforça a coordenadora jurídica da ACT.

Adriana Carvalho argumenta que a indústria do tabaco é capaz produzir cigarros sem aditivos e que, nesse sentido, a Anvisa já registrou diversas marcas que atendem à resolução. “As fábricas têm como sobreviver desse modo. Elas já provaram possuir conhecimento e tecnologia para fornecer produtos de acordo com a RDC 14/2012”.

A Anvisa é responsável pela regulação de diversos produtos para impedir possíveis danos à saúde da população. A petição da CNI requer que a agência perca sua competência normativa, como no caso de regular a composição dos cigarros, e passe a agir somente na execução de medidas, como uma espécie de “polícia” da área de saúde.

“A decisão da Anvisa tem respaldo no consenso científico e em fundamentos como a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco. Ela está cumprindo suas determinações previstas por lei. Não houve decisão arbitrária”, rebate Adriana.

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