O plenário do Conselho Nacional de Saúde (CNS) aprovou na sexta-feira (06/12) uma recomendação pela revogação imediata da Portaria nº 2.979, que institui o Programa Previne Brasil e estabelece novo modelo de financiamento de custeio da Atenção Primária à Saúde.
A maioria dos conselheiros de saúde entendem que a medida publicada pelo Ministério da Saúde no dia 13 de novembro, sem o aval do controle social, “representa um ataque à universalidade da saúde no Brasil, estabelecida na Constituição Federal, uma vez que impõe restrições importantes ao acesso da gestão municipal aos repasses federais voltados para a atenção básica”.
O documento também é direcionado aos presidentes da Câmara dos Deputados e da Senado Federal para que coloquem em regime de urgência a votação do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 701/2019 do deputado Alexandre Padilha e do PDL nº 704/2019 do senador Humberto Costa, que propõem sustar a portaria.
Os conselheiros nacionais de saúde reivindicam ainda uma ampla discussão com o controle social sobre o financiamento da Atenção Primária. “É fundamental aprofundar as discussões com todos os segmentos da sociedade, porque não é somente a gestão que faz o SUS. Vamos continuar o debate e também nos envolver na realização dos seminários estaduais, que serão promovidos pela Comissão de Seguridade Social e Família, da Câmara dos Deputados”, destaca o presidente do CNS Fernando Pigatto.
A realização destes seminários para debater a Portaria nº 2.979 foi aprovada durante audiência pública na Comissão de Seguridade Social e Família, dia 19 de novembro, conforme requerimento do deputado Alexandre Padilha. “É nítida a necessidade de ampliar o debate. Eu nunca vi uma pactuação que, de imediato, tenha tido uma reação contrária de conselhos estaduais tão forte como esta”, declarou o parlamentar, referindo-se às críticas dos conselhos estaduais de saúde de São Paulo e do Rio de Janeiro sobre a portaria.
Na quinta-feira (05/12) o plenário do CNS iniciou o debate com o secretário da Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde, Erno Harzheim, durante mesa temática da 324ª Reunião Ordinária. Também participaram da reunião o técnico de planejamento e pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia Aplicada (Ipea) Carlos Ocké e o parlamentar Alexandre Padilha.
Repasse financeiro vinculado à cadastro da população
Entre os pontos polêmicos da Portaria nº 2.979 está a necessidade de cadastro da população para que seja feito o repasse do incentivo financeiro aos municípios, que deverá considerar as pessoas cadastradas nas equipes de Saúde da Família e de Atenção Primária.
“O benefício do cadastro é ter o elemento básico para fazer todas as ações que a gente precisa e o primeiro deles é o planejamento”, avalia o secretário Erno Harzheim. “A gente só consegue trabalhar melhor, quando a gente conhece melhor a população que vive nas áreas onde a gente atua. Isso vai ser um ganho secundário muito importante”, completa.
“Penso que não há nenhum questionamento sobre a importância do cadastro para qualificar e servir de base o planejamento do sistema, mas é muito problemático definir isso como critério para esse repasse”, afirma Carlos Ocké. “Isso me parece extremamente problemático, do ponto de vista da sustentabilidade dos municípios se, inclusive é reconhecido que os municípios arcam com 70% dos gastos com atenção primária”, completa.
Pacto sem participação social
A Portaria nº 2.979 foi pactuada na Comissão Intergestores Tripartite (CIT), composta por gestores da saúde da União, estados e municípios. Para os conselheiros, ela descumpre o preceito constitucional do controle social no Brasil, conforme a Lei nº 8142/1990, que garante a participação da comunidade na gestão do SUS.
A medida também fere a Lei Complementar n° 141/2012, que estabelece a necessidade de submeter à aprovação do CNS o que for pactuado na CIT, no que diz respeito aos critérios de rateio das transferências financeiras do Fundo Nacional de Saúde para os fundos estaduais e municipais de saúde.
Para a conselheira nacional de saúde Sueli Barrios, que representa a Associação Brasileira Rede Unida no CNS, a nova proposta quebra o conceito constitucional do sistema universal. “Estamos diante da intencionalidade deste governo de acabar com o SUS para todos, com o princípio da universalidade, da participação social e da saúde como direito humano. A base conceitual que orienta o pensamento e ações deste governo não é sanitária, mas econômica”, afirma.