Estudo feitos na capital paulista mostra ainda que, para controlar o peso, muitos adotam práticas nada saudáveis, como pular refeições, substituir alimentos, tomar remédios e até fumar
São Paulo – A compulsão alimentar é o comportamento de risco mais comum entre estudantes de escolas técnicas estaduais localizadas na capital paulista diagnosticados com algum tipo de transtorno alimentar. Uma pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da USP, que entrevistou 1.167 desses alunos, constatou que 10,3% deles sofrem de compulsão. ou seja, em curto espaço de tempo comem descontroladamente e em quantidade maior do que outra pessoa comeria na mesma situação.
“O dado é preocupante porque a compulsão alimentar pode levar à obesidade ou desencadear comportamentos compensatórios para o controle do peso, como o uso de laxantes, diuréticos ou vômito auto-induzido”, explicou a nutricionista Greisse Viero da Silva Leal, que fez a pesquisa para seu doutoramento em Saúde Pública. O objetivo foi identificar o predomínio de comportamentos de risco para transtornos alimentares (TA), práticas não saudáveis para controle do peso (PNSCP) e fatores associados entre os adolescentes, que podem evoluir para distúrbios alimentares como anorexia nervosa, bulimia e transtorno da compulsão alimentar periódica, além do excesso de peso.
Como os adolescentes devem se alimentar?
Segundo a nutricionista Greisse Viero da Silva Leal, os adolescentes devem ter uma alimentação equilibrada, com alimentos de todos os grupos (carboidratos, verduras, legumes e frutas, carnes, ovos e grãos, laticínios e gorduras), de forma variada e com prazer, sem restrições alimentares e em horários regulares.
“Devem fazer seis refeições por dia, comendo de três em três horas, com frutas nos lanches entre as refeições principais e verduras e legumes no almoço e jantar”, disse. Esses são justamente os alimentos menos consumidos.
De modo geral, Greisse verificou que 12,2% dos entrevistados tinham algum tipo de comportamento de risco para TA, como restrição alimentar, compulsão alimentar e purgação (uso de laxantes). Além disso, constatou que 31,9% deles utilizam as chamadas PNSCP. Entre elas estão comer pouca comida para emagrecer, usar substitutos de alimentos como shakes e suplementos, tomar remédios para tirar o apetite e mesmo fumar cigarros. “Embora essas práticas sejam menos graves, causam preocupação porque podem evoluir para os sintomas clássicos de TA”, ressaltou.
Segundo a nutricionista, o problema dos substitutos de uma refeição é que, em casos extremos, por medo de engordar, a pessoa passa a não querer comer e a apresentar aversão a diversos tipos de alimentos tidos como “engordativos”, utilizando essas opções que nem sempre são completas como forma de se alimentar. “Além disso, alimentar-se não é apenas ingerir nutrientes. Envolve outros aspectos biopsicossociais como a aparência, sabor, textura dos alimentos, os tipos de alimentos consumidos em diferentes ocasiões e com diferentes companhias, que quando substituídos não podem ser compartilhados, e, portanto, não é saudável.”
Greisse lembrou que a adolescência é uma fase em que ocorrem diversas mudanças corporais em função da puberdade. Assim, tomar remédios para emagrecer não é uma atitude saudável, demonstra preocupação extrema com a forma corporal e que pode desencadear transtornos alimentares. “No entanto, é necessário destacar que TA são distúrbios de origem multifatorial e, portanto, diversos aspectos estão envolvidos no seu desenvolvimento e não apenas um isoladamente.”
Obesidade
A pesquisa avaliou também o estado nutricional dos adolescentes de acordo com o IMC (índice de massa corporal) para a idade. Do grupo estudado, 72,3% tinha peso normal, 16,9% sobrepeso, 9,7% com obesidade e 1% com baixo peso. Para Greisse, um único dado foi associado a comportamentos de risco para TA: a percepção do próprio peso, ou seja, aqueles adolescentes que, mesmo apresentando peso normal, se achavam gordos, tinham mais chance de apresentar comportamentos de risco para TA.
Conforme a nutricionista, as adolescentes apresentam maior prevalência desses comportamentos por estarem mais preocupadas com o peso e a forma corporais e por buscarem se adequar ao padrão de beleza associado à magreza imposto pela sociedade. Já entre adolescentes do sexo masculino, a influência da mídia e o estímulo materno para a prática de dietas foram fatores que influenciaram a escolha de práticas não saudáveis para o controle do peso.
A autora sugeriu que os pais e os profissionais da saúde modifiquem a forma de tratar o controle do peso. “O foco deve ser a satisfação corporal dos adolescentes por meio da valorização da diversidade de todos os tipos e formas corporais.”
Na pesquisa, Greisse utilizou um questionário com perguntas específicas sobre a presença de sintomas clássicos de transtornos alimentares: restrição alimentar, compulsão e purgação (laxantes, diuréticos e vômito auto-induzido com o objetivo de emagrecer) e perguntas sobre as práticas não saudáveis para controle do peso, como ingerir porções reduzidas de comida, omitir refeições, usar substitutos de alimentos ou refeições, usar remédios ou fumar mais cigarros, todos com o objetivo de emagrecer.
Poucos estudos avaliaram comportamentos de risco para TA em adolescentes no Brasil. E os estudos existentes avaliaram os comportamentos de risco por meio de questionários padronizados que avaliam diversos comportamentos relacionados à alimentação, peso e imagem corporal.