A morte de um filho é uma dor insuperável. De um filho jovem, ainda mais. Quando essa dor se soma ao horror da injustiça, o grito não consegue mais ficar preso no peito.
Assim, os pais do produtor de vídeo Leandro Caproni, morto aos 27 anos, em 22 de outubro do ano passado, decidiram sair às ruas e clamar por justiça. Dona Guiomar e senhor Valter imprimiram folhas para um abaixo-assinado e chegaram a conseguir adesões para preencher seis delas no Poupatempo de Itaquera, região onde moram, antes de serem expulsos.
Orientada por amigos, a irmã de Leandro, Karina Caproni, transformou a coleta de assinaturas físicas em virtual por meio de uma campanha pelo Avaaz. “Pedimos que o indivíduo que causou a morte de Leandro dirigindo uma BMW sem habilitação e com velocidade acima da permitida na Radial Leste fique preso”, afirma Karina no documento que já somava cerca de duas mil adesões em menos de um dia.
“Lutamos pela prisão do indivíduo. Não foi acidente, foi crime!”, ressalta o texto do abaixo-assinado.
A irmã de Leandro mantém a confiança na Justiça. “Tem que dar certo. Não merecemos sofrer tanto e o assassino ficar vivendo sua vida como se nada tivesse acontecido.”
Crime segue impune
Leandro voltava de uma reunião com seu arquiteto, após planejar as etapas finais do projeto de reforma da casa que havia comprado há apenas três meses, e onde funcionaria também sua produtora, a Sem Cortes Filmes.
O sonho, no entanto, nunca se realizou. A moto de Leandro foi atingida na contramão pela BMW de Gustavo Amaro Silva. O carro de motorização potente pesava mais de 1.700 quilos e estava com os pneus carecas. Com 18 anos recém-completados, o rapaz dirigia em alta velocidade e sem habilitação. Perdeu o controle do veículo e atravessou o canteiro central da principal via da zona leste de São Paulo. Além da moto de Leandro, outros dois veículos foram atingidos e os motoristas sofreram ferimentos leves.
Preso em flagrante, Gustavo foi solto 15 dias depois. A fiança de R$ 100 mil foi reduzida para R$ 30 mil e o motorista da BMW teve o alvará de soltura liberado em 6 de novembro. O processo está suspenso até 20 de janeiro. No dia 22, a morte de Leandro completará três meses e sem julgamento.
Logo após o atropelamento, o delegado responsável pelo caso, do 8º Distrito Policial (Brás/Belém), chegou a decretar a prisão em flagrante de Gustavo Silva, mas por homicídio culposo. Ou seja, quando não há intenção de matar, apesar de o rapaz estar dirigindo acima da velocidade permitida para aquela via e sem habilitação.
Foi somente na audiência de custódia, no dia 23 de outubro, que o juiz decidiu enquadrar o crime como dolo eventual, quando se assume o risco de causar o dano. E determinou a prisão preventiva de Gustavo Silva, solto sob fiança dias depois.
Por uma vida sem cortes
Leandro Caproni era proprietário da Sem Cortes Filmes desde 2013. Apaixonado pelo seu trabalho, tornou-se referência no audiovisual negro e periférico da cidade de São Paulo. Também era responsável pela produção audiovisual da Confederação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e de outras entidades representativas da luta dos trabalhadores. Seu trabalho ganhava espaço no Brasil e outros países.
Como homenagem, familiares e amigos criaram o movimento #PorUmaVidaSemCortes. “No dia 22, infelizmente, nosso querido Leandro Caproni entrou para as estatísticas e teve sua vida abreviada por conta de terceiros. Não se trata de um problema que se restringe aos seus conhecidos, mas que se refere à sociedade como um todo. Trata-se de um problema social que, a cada 21 minutos, atinge mais uma família”, denuncia a página no Facebook.
Os organizadores do movimento fazem questão de deixar claro que não querem vingança, mas justiça. “É necessário lutar para encerrar esse ciclo de violência. É necessário lutar por uma vida sem cortes para todos os Leandros pelo Brasil”, informam sobre a luta contra a impunidade.