São Paulo – Pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) criticaram hoje (10) os excessos do tratamento da mídia tradicional a um caso suspeito de ebola no Brasil.
Na edição desta sexta-feira do boletim diário Informe ENSP, o pesquisador e coordenador do programa de pós-graduação em Bioética, Ética Aplica e Saúde Coletiva, Sergio Rego, repreendeu os jornais de grande circulação nacional e as redes de TV por revelarem nome e documentação de um refugiado africano, que não deveria ter seus dados divulgados. “Corremos o risco de, mais uma vez, culpar as vítimas em vez de as protegermos.”
O coordenador ainda chamou atenção para o fato de muitas pessoas deixarem de procurar assistência médica com medo de ter suas vidas expostas por jornais e TVs de maneira irresponsável. “A reflexão ética deve fundamentar as decisões tomadas em todas as instâncias de forma responsável para não gerar mais problemas e pânico”, defendeu.
O infectologista e pesquisador da ENSP Fernando Verani apontou o pânico como outra grave consequência para o alarmismo midiático. “Uma situação de pânico poderá prejudicar o trabalho de investigação de contatos, já que possíveis casos suspeitos poderão não se apresentar às estruturas de saúde por receio de isolamento.”
E ressaltou ainda que o modo de transmissão do vírus, por meio do contato direto com fluidos corporais, é dificultado e que todas as ações tomadas desde a detecção do possível caso demonstram que o Brasil está preparado para lidar com o ebola.
“A detecção do caso foi em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) no interior do Paraná que, seguindo o protocolo, classificou o caso como suspeito e desencadeou todas as ações necessárias.”
Verani ainda alertou para a necessidade de investigação de possíveis contatos que o suspeito tenha estabelecido. “Se rigorosamente seguirmos os protocolos de contenção, não teremos uma epidemia, pelo menos não na magnitude da África Ocidental.” E lembrou que a Nigéria e o Senegal, países com estruturas de saúde mais frágeis do que o Brasil, conseguiram conter a transmissão e não houve mais casos secundários.
O Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), no Rio de Janeiro, para onde o africano foi transferido, viveu hoje um dia atípico, com grande movimentação de jornalistas em todas as suas unidades. Durante boa parte do dia, o africano suspeito de estar contaminado foi assunto nos principais noticiários.
De acordo com a Fiocruz, foram cumpridas rigorosamente todas as determinações do protocolo firmado pelo Ministério da Saúde e referendado por orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS).
País está preparado para a doença
O vice-diretor de Serviços Clínicos do INI/Fiocruz, José Cerbino Neto, esclareceu que a população deve manter a calma, pois a transmissão somente se dá pelo contato com sangue, órgãos, fluidos corporais ou secreções (fezes, urina, saliva, sêmen, vômito, sangue). Além disso, o vírus apenas torna-se contagioso depois que ocorre o início dos sintomas por parte do doente.
Ele assegurou ainda que todas as estruturas de saúde no país receberam todos os protocolos, mas chamou atenção para a necessidade de monitoramento sobretudo nas periferias de grandes cidades onde haja grupos de populações de imigrantes/refugiados da África.
A doença
Os sintomas da doença são febre súbita, fraqueza intensa, dores musculares, dor de cabeça e dor de garganta, vômitos, diarreia, disfunção hepática, erupção cutânea, insuficiência renal e, em alguns casos, hemorragia tanto interna como externa.
Se nos 21 dias anteriores ao aparecimento dos sintomas a pessoa esteve em um país onde ocorre a transmissão, passa a ser suspeito e deve ser acompanhado pelos órgãos competentes, que vão adotar medidas para proteção dos profissionais de saúde envolvidos no atendimento ao caso. O período de incubação da doença é de dois a 21 dias.
A confirmação dos casos de ebola é feita por exames laboratoriais específicos e levam 24 horas para apresentar os resultados. No caso do suspeito isolado na Fiocruz, as amostras de sangue foram mandadas para o Instituto Evandro Chagas no Pará.
Para o epidemiologista da ENSP Eduardo Maranhão, nenhum país tem a situação completamente sob controle quanto à infecção pelo ebola, haja vista a confirmação dos casos nos Estados Unidos e Espanha.