Em matéria veiculada no jornal O Globo em 13/07/2009, o Ministério da Saúde, divulgava que mesmo sob forte resistência dos sindicalistas e da bancada governista, incluindo parlamentares do PT, a criação de fundações estatais de direito privado poderia servir para modernizar o modelo de gestão de 2 mil dos 5 mil hospitais públicos vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS).
A estimativa é do Ministério da Saúde que, mesmo diante das críticas de sindicalistas ao projeto, continua acreditando que estados e municípios vão aderir ao novo modelo.
O Ministério informa que cinco estados já têm legislação que permite o funcionamento de hospitais como fundações de direito privado: Rio de Janeiro, Acre, Bahia, Pernambuco e Sergipe. O Ministro Jose Carlos Temporão avisou que mantém a luta pelo projeto, embora reconheça a dificuldade de aprová-lo. “ Não temos alternativa, a não ser perseverar na busca de um modelo novo. O modelo atual é ineficiente, anacrônico e do século passado”.
Entrevistamos a presidente da CNTSS, Maria Aparecida Faria, que, desde o ano passado, vem lutando arduamente para impedir que o PL92/2007 venha a ser votado na Câmara dos Deputados.
Como a CNTSS analisa a fala do Ministro Temporão, quando ele afirma que o atual modelo de gestão do SUS é ineficiente e anacrônico?
Maria Aparecida Faria – A posição do Ministro José Temporão me deixou perplexa, ele fala como se desconhecesse o que significa participação social e controle social. Cada vez mais ele desconhece a Lei 8.142 e que o movimento sindical faz parte do controle social deste país. O projeto de lei de fundação estatal foi rejeitado, não só pelo movimento sindical, mas também pela sociedade brasileira, pelas entidades e pelos setores que fazem parte do controle social deste país. Agora dizer que estas fundações, ainda que não sejam aprovadas no nível federal, mas sendo implantadas nos estados e municípios estará trazendo resultados, isso não passa de oportunismo de seus governantes.
Nesta mesma matéria, do jornal O Globo, o professor Pedro Barbosa, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Crus ( Fiocruz), alerta que a criação de fundações não tem a ver com privatização do sistema de saúde. É essa confusão que tem gerado a resistência por parte dos sindicalistas. Segundo ele, grandes hospitais públicos driblam a burocracia da administração federal e através de parcerias com fundações de apoio conseguem agilizar contratação de profissionais temporários e comprar equipamentos.
O problema não é contratar funcionários pela CLT , muito pelo contrário, no estado de São Paulo, mais de 40% da força de trabalho da Secretaria Estadual da Saúde, são todos concursados públicos e todos contratados pelo regime da CLT. O problema está em tratar a saúde pública, tratar o SUS, enquanto políticas públicas, gestão pública, com controle social, com transparência, com a participação da sociedade em resolver os problemas do SUS. A própria legislação brasileira aponta para a solução desses problemas. Eu não entendo como é que o Ministro da Saúde e esse companheiro da Fio Cruz não conseguem enxergar isso.
O SUS quanto foi implantado, quando foi construído, já veio com uma formatação determinada e que precisava ser ajustada ao longo do tempo. Sabemos que ele tem problemas, mas não será pela implantação de fundação estatal de direito privado que vai solucionar. A impressão que dá é que falta boa vontade por parte do governo, é uma queda de braço que o Ministro Temporão está fazendo com os movimentos sociais e com o movimento sindical. Isso tudo é muito ruim, o controle social não pode ser deixado de lado, ele é uma conquista da sociedade brasileira, expressa em legislação. E a Cntss tem o papel de continuar nesta luta. Nós que estamos no serviço público há tantos anos e que conhecemos este país, não queremos um serviço público que fique refém das políticas partidárias e interesses que não sejam da maioria da sociedade brasileira, que usa o SUS e sabe de suas próprias necessidades.
Agora se temos problemas de gestão, estamos disponíveis para discutir. Precisamos de uma carreira na saúde para valorização dos profissionais, possibilitando seu reconhecimento, ascensão na carreira e acabando com os “QI” quem indica.
Concordamos que são necessários os cargos de confiança, mas não da forma abusiva com tem sido até hoje. Outra questão é que a condução dos serviços prestados seja transparente, com salários decentes, com plano de carreira, reconhecimento e valorização profissional, gerenciamento sério e responsável e o acompanhamento do governo, fazendo a sua parte. Aí sim poderemos separar o joio do trigo. Nesta formatação é possível fazer uma avaliação de desempenho funcional, tanto de servidores como também dos gestores, e quem não estiver alinhado profissionalmente, não vemos nenhum problema em abrir um processo administrativo.
O gestor tem toda liberdade, só precisa saber usá-la de forma correta, de forma ética. Nós temos excelentes profissionais nos serviços público que estamos perdendo. Qual o motivo? Porque o gestor não tem liberdade? Porque a burocracia emperra? Vamos discutir a lei de responsabilidade fiscal, a lei de licitação, a abertura de concursos públicos, não para empregos públicos, mas sim, para servidores públicos. Porque o Ministro José Carlos Temporão, até agora não chamou as centrais sindicais para fazer o debates sobre as fundações estatais, um debate sobre os problemas do SUS? Segundo o nosso presidente Lula, o Ministro deveria chamar as centrais sindicais, até agora…. É isso que vamos continuar defendendo, não queremos driblar os problemas com soluções paliativas, queremos que a população saiba e sinta segurança em nossos atendimentos.
Nós somos contra a contratação de trabalhadores temporários, defendemos a grade funcional de acordo com a necessidade de cada unidade, de cada estado, de cada município. O contrato temporário tem que ser em uma situação de emergência, temos que ter concurso para substituir os servidores que estão se aposentando, que faleceram ou mesmo que saíram do serviço público
Tem muitas outras questões além da funcional, como por exemplo, temos que discutir a compra de novos equipamentos e a sua utilização, não adianta comprar equipamentos que não tenham profissionais adequados para operar.
Temos muito claro que a burocracia não pode emperrar as necessidades da população. Hoje vivemos em um mundo informatizado e globalizado que permite maior agilidade sem perder a transparência. Nós dos movimentos sindicais, sociais, conselheiros de saúde queremos compreender porque tanto empenho em eleger a fundação estatal do direito privado como a “salvadora do SUS”. Essa ferramenta resolverá essa infinidade de problemas que assolam a saúde pública deste país?