O Conselho Comunitário de Segurança (Conseg), do Centro de Sorocaba (SP), apresentou, semana passada, proposta a favor da internação compulsória de usuários de drogas, alegando que o feito garante o tratamento destes e a redução de problemas de segurança pública. O SinPsi Sorocaba publicou nota de repúdio. Leia abaixo.
O Sindicato dos Psicólogos do Estado de São Paulo, subsede Sorocaba, como organização que articula à luta sindical os interesses mais amplos da sociedade, como a busca pela democracia universal e participativa; a conquista de direitos que garantam a justiça social, amparados por amplas políticas públicas de Estado; e a luta contra todas as formas de preconceito, discriminação e violência que ofendam a dignidade humana, vem, por meio desta nota, expressar indignação e repúdio em relação à proposta do Conselho de Segurança (Conseg Centro), no município de Sorocaba.
O Conseg Centro solicita ao Ministério Público a internação compulsória de usuários de crack e outras drogas, que se encontram nas ruas centrais da cidade, conforme reportagem exibida em 1º de agosto pela TV TEM, afiliada da TV Globo. As imagens mostram ação da Polícia Civil em parceria com o Conseg Centro, que insistiu em cadastrar tais usuários para a criação de um Projeto de Lei que viabilize tal modelo de internação.
O SinPsi Sorocaba se manifesta contrário a tal proposta, que está em fase de análise pelo Ministério Público, por se tratar de medida retrógrada e ineficaz, uma vez que na internação compulsória apenas 2% das pessoas conseguem se livrar da dependência (conforme dados do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes – PROAD). Além disso, a internação, ainda mais a compulsória, deve ser adotada apenas em casos muito específicos, quando esgotadas todas as possibilidades preconizadas pela Lei da Reforma Psiquiátrica, conquistada em 2001 após intensa mobilização popular, que preza pelo tratamento com liberdade, que respeite a potencialidade e a autonomia individual e trabalhe por fortalecer os laços sociais.
A proposta do Conseg Centro, de massificar a internação compulsória, vai de contramão à Lei da Reforma Psiquiátrica e se configura como uma prática higienista que visa, sobretudo, afastar e isolar aquilo que não é agradável aos olhos da sociedade, em especial aquilo que não é compatível com a imagem de uma cidade que carrega o lema de “Educadora e Saudável”, mas que também apresenta seus processos de exclusão e violência, em um contexto que estigmatiza e produz doença.
É pertinente resgatar o Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos em locais de internação para usuários de drogas, realizado pelo Conselho Federal de Psicologia, que encontrou, na maioria dessas instituições, em especial nas comunidades terapêuticas, condições precárias e desrespeito à cidadania dos usuários. Também é pertinente resgatar a pesquisa realizada pelo Professor e Doutor em Psicologia Social, Marcos Garcia, juntamente com o Fórum da Luta Antimanicomial de Sorocaba (Flamas), que evidencia o flagrante desrespeito aos direitos humanos, em forma de mortes, maus tratos e privação de liberdade, ocorrido nos hospitais psiquiátricos de Sorocaba e Região.
A constatação desse cenário de precarização dos serviços de Saúde Mental no município de Sorocaba mostra que é imprescindível que o município trabalhe pelo fortalecimento e implantação dos recursos extra-hospitalares que ofereçam suporte ao indivíduo no contexto em que ele está inserido, o que implica adequar a quantidade e territorialidade dos Centros de Atenção Psicossocial à população do município, ampliar o trabalho de Redução de Danos e Consultórios de Rua, Centros de Acolhimento, CRAS, CREAS e os demais equipamentos da Rede SUS e SUAS, criando condições para assegurar direitos, promover cidadania e reduzir ao máximo o número de internações que, em último caso, podem ocorrer em períodos breves e em locais como Hospitais Gerais e CAPS III.
Cabe também à imprensa local, cumprindo o papel que lhe cabe na democracia, e perante os princípios éticos, conscientizar a população sobre o contexto mencionado nesta nota. É de causar indignação que os veículos de imprensa no município têm, na maioria das vezes, expressado concordância com essa prática higienista. As drogas e os usuários não são um mal a ser combatido. O que deve ser combatido são os processos de exclusão, de marginalização e violência sob as quais se encontram parte da população, das quais resultam as condições de vulnerabilidade, dentre elas o uso abusivo de drogas e a situação de rua.
Estamos somando esforços nessa luta, para uma política de drogas inclusiva. Por isso, digamos não à internação compulsória!
Não à lógica manicomial que ainda impera no município!