Nos últimos dois anos, um em cada três beneficiários de planos de saúde de São Paulo tiveram de recorrer ao Sistema Único de Saúde (SUS) ou a profissionais particulares devido a demora, a problemas ou à negativa de atendimento da rede credenciada. Este percentual aumentou 10 pontos entre 2012 e 2013, segundo uma pesquisa do Datafolha encomendada pela Associação Médica Paulista e divulgada hoje (17) na capital paulista.
“São pessoas que pagaram e deixaram de usar serviço e foram ao SUS. Os planos lucraram indevidamente e o ressarcimento deles à saúde pública é muito demorado. Com certeza o poder público não está reavendo tudo o que gastou para atender usuários do sistema privado”, afirmou o presidente da Associação Paulista de Medicina, Florisval Meilão.
Ao todo, 79% dos usuários de planos de saúde de São Paulo relataram ter tido problemas nos últimos dois anos, relacionados principalmente a demora no atendimento e a falta de opções na rede credenciada. No universo dos 10,4 milhões de usuários da saúde privada de São Paulo, o percentual representa 8,2 milhões de pessoas. A maioria dos problemas foram nos atendimentos de urgência em prontos-socorros (80%), seguido de realizações de consultas (66%) e de exames e diagnósticos (47%).
Em relação ao pronto atendimento, o principal problema apontado pelos usuários (74%) foi relacionado a lotação do local de espera, seguido pela demora para ser atendido (55%), negativa de realizar os procedimentos necessários (16%), locais inadequados para receber medicação (13%) e negativa de atendimento (9%). Além disso, 24% dos entrevistados relataram problemas para realização de cirurgias e 19% para internações.
“O mais preocupante é na área de atendimento de emergência e internações hospitalares, que configuram um quadro clínico mais grave e preocupante e que, por isso, requerem um atendimento mais rápido”, diz Meilão. “Há uma deficiência de leitos hospitalares. Temos 2,3 leitos para cada mil habitantes quando o ideal seria entre entre 3 e 4 para cada mil. A perspectiva é que até 2016 sejam construídos apenas mais 4 mil leitos. Assim, essa situação deve permanecer ou se agravar.”
Meilão ressalta que as dificuldades burocráticas criadas pelos convênios atrasam o atendimento, inclusive nos casos mais graves. “O médico agenda uma cirurgia para daqui a 15 dias e faz solicitação. As empresas retardam a liberação ao máximo, até a véspera. Além disso, para buscar economia, elas restringem materiais essenciais para o ato cirúrgico. Hoje existem muitas pessoas necessitando de cirurgias, com dificuldade de conseguir esse serviço na rede privada.”
Nas consultas médicas, a demora para marcação foi o problema mais recorrente, citado por 52% dos usuários, seguido pelo descredenciamento do médico (28%) e demora para autorização de consultas (25%). Sobre os exames, 28% dos entrevistados reclamaram da demora na marcação, 27% de poucas opções de laboratórios e clínicas e 18% da demora para liberação da autorização para realização dos procedimentos.
“Bloquear o acesso é uma questão de economia”, criticou o presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, João Ladislau Rosa. “Com a demora para uma consulta ou um exame o plano de saúde economiza, assim como com a compra de material mais barato para cirurgia. Estamos demonstrando que os convênios estão economizando com os custos da saúde das pessoas. Saúde não é um produto de consumo.”
O presidente da Academia de Medicina do Estado de São Paulo, Affonso Meira, concordou. “A todo momento somos convidados a mudar de plano, porque eles estão preocupados só em ampliar o número de usuários e não em atender corretamente, senão não haveria toda essa demora.” Os especialistas reforçaram a necessidade de ampliar a rede credenciada e remunerar melhor os médicos e os laboratórios conveniados.
Para Rogério Giannini, Presidente do Sindicato dos Psicólogos de SP, um dos mais graves problemas da presença dos planos privados é que contribuem para desorganizar a atenção básica. Segundo Giannini, os usuários de planos privados tendem a procurar diretamente um especialista e os planos não estão organizados com visão mais ampla de saúde.
“Muitos diagnósticos não são feitos pela falta de uma visão global do paciente, como seria feito em uma Unidade Básica de Saúde”, conclui Giannini.
A pesquisa, ouviu 861 entrevistados, sendo 422 na região metropolitana de São Paulo e 439 no interior do estado, entre 4 e 12 de setembro.