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Por uma internet livre

Na Semana pela Democratização da Comunicação, movimentos realizam ato em defesa do Marco Civil da Internet em frente à Vivo-Telefônica, em São Paulo

Cerca de 100 manifestantes participaram na noite desta quarta-feira (16) do ato contra a censura na internet e pela liberdade de expressão e privacidade na rede, realizado em frente ao prédio da Vivo-Telefônica, na zona sul da capital paulista.

Militantes pela internet livre, dirigentes sindicais, representantes de movimentos sociais e especialistas da área exigem a aprovação do Marco Civil da Internet (PL 2126/11) em seu formato original. O Projeto estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da web no Brasil e tramita em caráter de urgência na Câmara dos Deputados, a pedido da presidenta Dilma Rousseff, e pode ser votado até o próximo dia 28.

Para Rosane Bertotti, secretária nacional de Comunicação da CUT e coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), é preciso despertar a atenção da sociedade para a importância e profundidade das mudanças que estão em jogo no Brasil nesse momento no campo das comunicações. “O Marco Civil da Internet foi democraticamente construído com ampla participação da sociedade civil organizada. A CUT e vários movimentos sociais que debatem e lutam por uma mídia democrática defendem o projeto original, por conter dispositivos capazes de impedir (ou, no mínimo, dificultar) a concentração, o monopólio, como acontece hoje com a Radiodifusão”, afirma.

“O projeto do Marco Civil da Internet é alvo de grande pressão das empresas de Telecom, interessadas em alterar pontos que possam interferir no aumento de seus lucros. Por isso, três pontos merecem destaque: a neutralidade da rede, a privacidade e a liberdade de expressão e criação”, alerta a secretária.

Internet livre e privacidade

Para o sociólogo Sergio Amadeu, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), o Marco Civil da Internet tem relevância mundial, pois o que for aprovado no Brasil servirá de modelo para outras nações. “A situação está se invertendo porque foi a Dilma Rousseff, e não um presidente norte americano, que foi ao plenário da ONU defender a internet livre e a privacidade. Quem tem interesse na liberdade e na democracia somos nós”, ressalta.

Segundo Amadeu, os brasileiros aprenderam a importância da liberdade para a criatividade, entretenimento, educação e cultura e, nesse contexto, estão os grupos de telecomunicação interessados em aumentar a lucratividade ou manter privilégios. “Nesse embate, o Brasil é protagonista de uma virada, de fato, no mundo, em prol da diversidade, liberdade e privacidade”, afirma.

Ainda não é assunto popular

Apesar do enorme impacto que terá na vida dos milhões de internautas brasileiros, o marco ainda é pouco conhecido pela população. Para Fernanda Estima, jornalista da Fundação Perseu Abramo, uma das causas é a não abordagem do assunto pela grande mídia. “Mais de 80% da população ainda se informa pelos grandes meios de comunicação, a televisão principalmente. E esse assunto, quando está na grande mídia, está distorcido.”Para Estima, o momento é de divulgar a pauta à população.“A CUT tem papel importante nisso. Como aglutina trabalhadores, pode levar o tema para sindicatos, para os trabalhadores, e esclarecer o que for necessário. É um assunto de todos. O tema da neutralidade está ligado à Democracia”, complementa.

Beá Tibiriçá, representante do Coletivo Digital, afirma: “As pessoas ainda não perceberam que o Marco Civil da Internet tem a ver com suas vidas. Eu, que trabalho com software livre, telecentro, cultura digital, estou muito atenta aos debates da área. Mas quem não está nesse universo, não”.

Cultura e criatividade

A ativista lembra também que “A internet até hoje é livre e democrática. Estamos fazendo vários atos e ações diretas para que a população perceba que o parágrafo 2º do artigo 15, esse parágrafo nefasto, é prejudicial”. O parágrafo a que Beá se refere é o da neutralidade da rede. Além da privacidade e a liberdade de expressão e criatividade, a neutralidade é um princípio fundamental. Significa que as empresas de telecomunicação têm que garantir igualdade, sem limitar, dificultar ou tratar de forma diferenciada o acesso à web.

Já Gustavo Anitelli, produtor executivo do Teatro Mágico, lembra da importância do Marco Civil da Internet para o cenário cultural brasileiro. “A gente jamais teria chegado aonde chegamos se não tivesse neutralidade na rede. Somos produtora independente, crescemos na rede. Quebrar a neutralidade pode barrar o desenvolvimento musical de uma série de grupos.”. Para o produtor, a aprovação do Marco civil é indispensável para a Democracia, a criatividade e a arte.

Liberdade x censura

Pela regra atual, os provedores são corresponsáveis pelos conteúdos publicados por terceiros e basta uma simples notificação para exigir a censura a uma informação, explica Veridiana Alimonti, representante da sociedade civil no Comitê Gestor da Internet (CGI). Pela proposta do marco, só uma ordem judicial poderá determinar essa retirada, o que garantirá direito de defesa ao acusado e avaliação de um juiz sobre a legalidade do caso.

A exceção será nas situações onde for alegado desrespeito à legislação autoral, medida que contraria os militantes pela web livre. “Quem notifica o provedor é que considera a infração ao direito autoral e isso dispensará a ordem judicial. Somos contra esse item porque isso vai piorar a censura de conteúdos com imagens dos movimentos sociais”, afirma Veridiana, pontuando como exemplo a retirada de vídeos gravados das manifestações de junho. 

“Temos um cenário de extrema concentração dos meios de comunicação no país. Se não lutarmos agora para garantir que a web continue livre e democrática, futuramente, o destino natural dessa mídia será os conglomerados econômicos que vão controlar toda a informação”, aponta Pedro Ekman, coordenador do coletivo Intervozes.

Para Ekman, o problema está no fato de as pessoas não entenderem, de forma palpável, os rumos que a rede terá sem regulamentação. “Pensam que a internet será para sempre como hoje está dada, mas a web está se transformando rapidamente e se tornará como uma grande TV a cabo, acessível somente a quem puder pagar”, avalia.

Na opinião de Amadeu, a mídia não divulga o tema porque a Rede Globo é contrária ao marco da forma como desejam os militantes, já que, por conta da legislação autoral, a emissora defende censura e remoção de conteúdos sem ordem judicial. Entretanto, na visão do sociólogo, a tendência é de mudança na percepção dos usuários sobre a importância do marco.

“Há forças poderosas tentando abafar o debate, mas acho que atos como esse vão começar a pipocar. Daqui alguns dias os internautas saberão que é preciso defender a web que eles gostam, que é a internet livre. Agora, não será mais possível ficar passivo diante da tentativa de destruir nossos direitos”, finaliza. 

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