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Movimento negro debate política educacional e mercado de trabalho

Representantes de movimentos negros se reuniram na semana passada e questionaram as pautas que reivindicam políticas afirmativas na educação superior. O acesso à educação foi apontado como algo a ser repensado no que se refere ao tipo de ensino ao qual os negros teriam acesso: o ensino técnico, voltados unicamente para o mercado de trabalho, ou ao ensino científico, aquele aprendido nas universidades.

O debate foi organizado pela Secretaria de Combate ao Racismo da CUT/SP, com o objetivo de começar a traçar pautas que serão levadas à 3ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Conapir), que ocorrerá em meados de novembro, e à 2ª Conferência Nacional de Educação (Conae), no início de 2014. O evento ocorreu no Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, na região central da cidade, na quinta-feira (26).

“Precisamos pensar no seguinte: educação para quê e para quem. Os negros estão crescendo em números na educação técnica, apenas”, disse o professor e presidente do Instituto Luiz Gama, Sílvio Almeida. O modelo de inclusão desenhado no final do ano passado pelo governo do estado de São Paulo, o Programa de Inclusão Social com Mérito (Pimesp), foi criticado por favorecer, exatamente, apenas o ensino técnico e a preparação para o mercado de trabalho.

A principal crítica dos movimentos em relação ao Pimesp se refere ao sistema de “college”, apresentado pela proposta do governo de Geraldo Alckmin (PSDB). Segundo este sistema os estudantes que quiserem ingressar nas estaduais paulistas teriam de fiar dois anos em um curso de nivelamento a distância, , que já serviria técnico profissionalizante, para aí poderem ingressar na USP, Unicamp e Unesp.

Segundo Almeida, o Pimesp funciona seguindo a lógica de que o aprendizado científico, das universidades, deve ser reservado para os não negros. De acordo com ele, os espaços de grandes decisões sobre questões sociais são tomadas por aqueles com conhecimento científico. “E aí vem o crivo pela meritocracia. Quando alguém é doutor em algo, ganha legitimidade para pleitear espaços de decisão política. Os negros precisam reivindicar educação científica para poderem ocupar estes espaços.”

Outros pontos

Entre outros pontos discutidos, foi ressaltada a atuação conjunta do movimento negro com o sindical. “O movimento sindical hoje é o que dialoga com a classe trabalhadora de base, com o trabalhador que está ali na fábrica, que está enfrentando as mazelas do mercado de trabalho, que esta sofrendo com racismos institucionais”, disse o representante do Fórum Nacional de Juventude Negra, Morfy Bomani.

Ele ressaltou que espera que a próxima conferência defina calendários de execuções de projetos e políticas afirmativas já debatidas há anos. “Precisamos pensar no que está sendo feito. Onde avançamos, onde não avançamos. Já passamos do momento de formular e debater.”

A secretária de Combate ao Racismo da CUT/SP, Rosana Aparecida da Silva, destacou que muitas escolas ainda não implementaram as leis que tornam obrigatório o ensino de história da África e cultura africana, afro-brasileira e indíena nos colégios públicos e particulares.

“A criança precisa ser educada para a diversidade, porque futuramente ela será parte do recursos humanos de uma empresa, será o patrão, será um empregado. E aí vai levar o preconceito para frente. Os serviços dos negros e negras são, em sua maioria, terceirizados, são os piores. O negro é discriminado todos os dias.”

Pesquisa do Dieese sobre a inserção no mercado de trabalho, divulgada em novembro do ano passado, mostrou que os negros ganharam mais espaço, entre os anos de 2002 e 2011, embora continuem em posição de desigualdade.

No período, as taxas de desemprego diminuíram entre negros e não negros, mas a diminuição relativa ao primeiro segmento foi maior. Entre os negros, a taxa é de 12,2%; entre os não negros, de 9,6%. Essa diferença era de 7,2 pontos porcentuais em 2002.

Em relação à ocupação no mercado, os negros ainda são minoria nos setores melhor remunerados e que exigem melhor qualificação, como serviços, indústria e comércio. Porém, nestes dez anos, houve um crescimento mais significativo nas áreas de serviços e construção civil. Em 2002, 43% dos negros estavam ocupados em serviços. Em 2001, o número subiu para 48,8%. Houve um aumento de mais de cinco pontos porcentuais. Já entre os não negros, 52,8% estava ocupado neste setor em 2002, e em 2011 a taxa era de 54,6%. O crescimento foi de apenas 1,8 ponto porcentual.

Morfy diz que, apesar da maior participação, os negros ainda ocupam postos de trabalhos pior remunerados, como mostra a pesquisa. “A classe negra, no geral, ascendeu no mercado de trabalho no sentido de ocupar os postos, mas não no sentido de qualificar os postos. Cresceu o acesso, mas a condição ainda é de subemprego, não é condição à altura dos que estão ocupando os postos.”

A regulação da comunicação também foi lembrada como algo a ser incluído nas reivindicações do movimento. “Se reivindicamos uma maior visibilidade nas novelas, nos meios de comunicação, que nos mostram sempre como ladrões, ou pessoas que gostam de bagunça, a regulação dos meios é algo fundamental para pensarmos sobre.”

Conferências

A Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial é realizada de quatro em quatro anos, e tem como finalidade a indicação de propostas, por parte da sociedade, que subsidiem a formulação e a implementação de políticas públicas. As estaduais podem ocorrer até dia 18 de agosto.

Entidades integrantes do Fórum Nacional de Educação (FNE), bem como os fóruns estaduais de educação, passaram a se reunir na segunda quinzena deste mês, para começar a se organizar na promoção de eventos de mobilização nos estados e municípios brasileiros, afim de divulgar a Conferência Nacional de Educação (Conae) de 2014. No último dia 12, o FNE organizou uma videoconferência para preparar as conferências municipais e intermunicipais em todo o Brasil, etapas que antecedem a Conae.

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