20nov2024 Por Norian Segatto
Há pelo menos três décadas, as políticas afirmativas para a valorização da população negra e o combate ao racismo têm sido pauta constante dos governos. Apesar de um aparente maior “empoderamento preto”, quando se mira a realidade com o olhar nos números percebe-se que ainda há um grande fosse entre negros e brancos no mercado de trabalho, na discriminação do dia a dia e na violência policial.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 57% da população se declara negra ou parda; os trabalhadores negros também são a maioria, correspondendo a 55% das pessoas que estão em algum posto de trabalho. No entanto, essa maioria se inverte quando se olha para os números do mercado de trabalho em termos de ocupação e renda.
Estudo do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) publicado neste mês de novembro aponta o tamanho dessa desigualdade. Segundo o órgão, 86% dos acordos coletivos em 2024 tiveram aumentos acima da inflação, com ganho médio de 1,49% nos salários. O Índice da Condição do Trabalho (ICT-DIEESE), apresentou também melhora desde 2022 e subiu de 0,57 para 0,63 entre 2023 e 2024. Essas melhores condições do mercado de trabalho, porém, não foram suficientes para reduzir a desigualdade racial de renda no Brasil. Alguns números publicados pelo Dieese chamam a atenção:
– O rendimento médio dos negros é 40% inferior ao dos não negros.
– Os negros com ensino superior ganham 32% a menos que os demais trabalhadores com o mesmo nível de ensino, diferença que pouco se alterou com a Lei de Cotas.
– Os negros recebem, em média, R$ 899 mil a menos que os não negros ao longo da vida laboral. Entre os que possuem ensino superior, o valor chega a R$ 1,1 milhão.
– Um em cada 48 homens negros ocupados está em um cargo de liderança, enquanto entre os não negros, a proporção é de um para cada 18 trabalhadores.
– Nas 10 profissões mais bem pagas, os negros representam 27% dos ocupados, mas são 70% dos trabalhadores nas 10 ocupações com os menores rendimentos.
– Uma em cada seis mulheres negras trabalha como empregada doméstica. O rendimento médio das domésticas sem carteira é R$ 950/mês, valor bem menor do que o salário-mínimo.
Violência aumenta
Se no campo do trabalho a situação ainda é bastante desfavorável à população negra, essa realidade toma ares de genocídio quando se trata de direitos humanos e violência policial.
Estudo divulgado pela Rede de Observatórios da Segurança no início deste novembro, mostra que 4.025 pessoas foram mortas por policiais no Brasil em 2023. Em 3.169 casos foram disponibilizados os dados de raça e cor: dessas 3.169 mortes, 87,8% eram pessoas negras, ou seja 2.782 vítimas da ação policial.
Segundo matéria da Agência Brasil, dados do boletim Pele Alvo: Mortes Que Revelam Um Padrão obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação em nove estados mostra que a morte de pessoas negras pela polícia é uma realidade nacional: Amazonas (92,6%), Bahia (94,6%), Ceará (88,7%), Maranhão (80%), Pará (91,7%), Pernambuco (95,7%), Piauí (74,1%), Rio de Janeiro (86,9%) e São Paulo (66,3%).
Pesquisa do Instituto Sou da Paz revela que no estado de São Paulo, as mortes de pessoas negras pelas polícias Civil e Militar aumentaram 83% de janeiro a agosto deste ano, em comparação com o mesmo período do ano passado. Conforme dados obtidos da Secretaria de Segurança Pública do estado, nesse período 441 pessoas foram mortas pelas forças do Estado, (78% a mais do que o mesmo período de 2023). Deste total, 283 eram negras, 138 brancas e 20 não tiveram a cor/raça especificado.
Na data em que se comemora o Dia da Consciência Negra, em homenagem a Zumbi dos Palmares e Dandara, olhar para a seca realidade dos números e olhar ao redor da sua realidade cotidiana, é um alerta para o muito que ainda temos de avançar para que o Brasil promova a justiça racial e a reparação histórica sobre o massacre promovido contra a população negra do país.