São Paulo – Os avanços na área psiquiátrica brasileira estão colocando um fim nos sistemas manicomiais e a cada dia reintegram mais pessoas com transtornos mentais a sociedade. Porém, os pacientes continuam tomando muitos medicamentos, principalmente os das classes menos favorecidas. As informações são da pesquisa do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas (FMC) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em conjunto com com os Centros de Atenção Psicossocial (Caps) do Estado de São Paulo.
A professora Rosana Teresa Onocko-Campos coordenou a pesquisa realizada nas cidades de Campinas, interior de São Paulo, e identificou que a maioria dos pacientes toma muitos remédios, tanto na rede de atenção primária como nos Centros de Atenção Psicossocial. Segundo a autora, o tratamento em saúde mental está reduzido ao uso de psicotrópicos, medicamentos que agem no sistema nervoso provocando alterações de comportamento e humor.
A pesquisa aponta que o uso crescente destes medicamentos está associada a fatores econômicos. Os pacientes que mais tomam remédios são os mais pobres e com baixa escolaridade. De acordo com dados do estudo, em Campinas no primeiro semestre de 2010, mais de 65.778 pessoas receberam prescrições de psicofármacos – antidepressivos, tranquilizantes e estabilizadores de humor -, o número equivale a 6,5% dos habitantes da cidade.
Além do número crescente de prescrições de antidepressivos, a auto-medicação é outro fenômeno que vem atingindo a população. Segundo a pesquisadora Rosana Onocko-Campos, as pessoas utilizam medicamentos para tentar resolver problemas que fazem parte da vida e não para combater doenças.
Outro problema apresentado pela pesquisa é a centralização da prescrição de medicamentos. Como apenas os médicos têm conhecimento sobre os componentes presentes nas medicações e suas contraindicações, quando os pacientes precisam tirar suas dúvidas os demais trabalhadores da saúde não sabem informar, o que demostra uma contradição no sistema de saúde brasileiro.
A pesquisadora da Unicamp ressalta em seu estudo que os pacientes devem se responsabilizar mais por seu tratamento. De acordo com ela, apenas os usuários de medicamentos podem saber se estão melhorando ou não, uma vez que a melhora nesse caso se resume à experiência de estar menos depressivo ou psicótico.
A professora Rosana Onacko-Campos coordenou também uma pesquisa realizada em 25 dos 26 Caps III paulistas. As unidades estudadas são referência em saúde mental e visam a substituir os hospitais psiquiátricos com tratamentos diferenciados que evitam a internação psiquiátrica integral e reintegram o paciente à comunidade. Cada Caps possui em média 400 pacientes cadastrados, sendo que a frequência deles depende do tratamento planejado pela equipe multiprofissional.
Segundo Rosana, o objetivo dessa pesquisa foi mostrar que a reforma psiquiátrica no Brasil avançou o suficiente para acabar com receios sobre a importância dos Caps. Os estudos mostraram que a reintegração dos pacientes à comunidade com a ajuda de familiares trouxe avanços nos quadros de transtornos mentais e que os Caps são mais viáveis do que os antigos manicômios.
Após realizar as pesquisas, a professora Rosana Onocko-Campos e seus colegas decidiram elaborar um guia para ajudar os pacientes a auto-gerenciar as suas medicações. Esse guia é baseado em um outro já existente na Universidade de Montreal. Segundo a pesquisadora da Unicamp, o guia foi adaptado à realidade brasileira e deve ser estar disponível na internet até o final deste ano.