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Passada a eleição, Alckmin muda o tom e pede ajuda de Dilma contra crise hídrica

Passado o segundo turno das eleições presidenciais, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), mudou o tom de seus discursos dos últimos dez meses e, admitindo a gravidade da crise hídrica no estado, disse que pedirá ajuda financeira e desonerações fiscais para auxiliar no enfrentamento do problema. “A eleição já acabou. Não deve haver um terceiro turno. Isso prejudica a população. A nossa disposição é a do diálogo e da cooperação”, disse Alckmin, que repetidamente afirmou que não havia risco de desabastecimento até março de 2015 e que o governo paulista estava realizando todas as medidas necessárias.

O governador quer que a União retire a carga tributária de PIS e Cofins, que segundo ele chega a R$ 680 milhões. “O governo federal precisa tirar o imposto da água. É inacreditável [esse valor]”, afirmou, segundo informações do jornal Folha de S. Paulo.

Porém, tanto a presidenta Dilma Roussef (PT), quanto o presidente da Agência Nacional de Águas (ANA), Vicente Andreu, já comentaram que o governo federal não só ofereceu auxílio ao governo Alckmin, como avisou que a crise seria muito severa. O tema foi central nos debates finais do segundo turno entre a petista e Aécio Neves, correligionário de Alckmin. Este, frente às acusações da adversária de que o caso paulista evidencia incompetência na administração pública, acusou o governo federal de promover o aparelhamento da ANA.

“Em fevereiro procurei o governador Alckmin e falei que as nossas avaliações a respeito da situação da seca no Brasil indicavam uma forte seca no Sudeste”, contou Dilma no dia 20 de outubro. E prosseguiu. “Em março o governador vem numa audiência no Palácio do Planalto: ‘Governador, pela minha experiência, acho que o senhor deveria fazer obras emergenciais, porque tudo indica que essa seca se prolongará e vocês não têm capacidade de abastecimento de água suficiente’”.

Antes disso, em 24 de setembro, Andreu lembrou que a utilização do volume morto das represas foi sugerida, no início de fevereiro, em uma reunião entre a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e o governador.

O presidente da agência também lamentou que o governo paulista não estivesse informando a população de forma adequada em relação à gravidade da crise. “Nós dizemos que a situação é grave. Aí o governador aparece na televisão e diz que está tudo sob controle, que tem água até maio de 2015. A quem o cidadão dará ouvidos? Certamente não será à ANA”, reclamou.

Andreu destacou, em meio às críticas que fez quando da saída da ANA do Grupo Técnico de Assessoramento e Gestão (GTAG) do Sistema Cantareira, em meados de setembro, que o governo paulista apenas “ganhou tempo” sem realizar as medidas necessárias para enfrentar a crise. “Demos sugestões e fizemos propostas para enfrentar o problema. Nós temos mais de 300 resoluções conjuntas. Mas o governo paulista não quer sugestão, quer adesão”, afirmou.

Na manhã do dia 29 de outubro, o coordenador de Articulação e Comunicação da ANA, Antônio Félix Domingues, adotou o mesmo tom conciliador de Alckmin. “Esse é um momento de diálogo e união. A situação é muito grave”, afirmou, durante congresso sobre gestão da água, realizado por uma entidade do setor empresarial, na zona sul de São Paulo.

Alckmin disse também que está estudando o rompimento da concessão da represa do Jaguari, que é de São Paulo, como geradora de energia. “Ela gera pouca energia elétrica. Vamos pedir para encerrar a concessão e manter a represa só para abastecimento humano”, afirmou.

Hoje, o Sistema Cantareira chegou a 12,7% da capacidade, já com a segunda cota do volume morto adicionada. E o Alto Tietê, também em situação difícil, atingiu 7%.

A rigidez do discurso do governador vem erodindo ao longo do tempo, sempre em relação com o andamento do ano e da falta de chuvas.

Em 11 de março, Alckmin afirmou que o desconto para quem economizasse 20% na média de água consumida seria mantido somente na área atendida pelo sistema Cantareira, porque a medida era suficiente. “Não há necessidade de estender isso para outras regiões. O problema é localizado no sistema Cantareira, mas o uso racional da água é sempre positivo”, disse à época. Porém, 20 dias depois, o governador anunciava a ampliação da medida para 31 municípios da região metropolitana de São Paulo.

A primeira cota do volume morto do Sistema Cantareira (186 bilhões de litros de água) estava prevista, pelo governador, para durar até novembro. No entanto, já no final de setembro se cogitava a retirada da segunda cota (126 bilhões de litros). A autorização foi pedida pela Sabesp à ANA, mas acabou barrada pela Justiça Federal, no dia 10 de outubro, pelo risco da retirada deste volume de água afetar os rios que abastecem as regiões de Campinas e Piracicaba.

Mesmo assim, dias depois se descobriu que a Sabesp já estava retirando a água da segunda cota do volume morto, sem autorização.

A mesma situação se dá com a prática de racionamento. Alckmin nega a utilização da medida desde o início da crise. Quando se constatou que diversos bairros da periferia estavam sofrendo cortes no fornecimento, ele seguiu negando. Após o primeiro turno da eleição, em 5 de outubro, quando o governador se reelegeu, os cortes passaram a afetar outras regiões. Alckmin, no entanto, continuou negando.

Mas seus colaboradores, não. O secretário de Recursos Hídricos, Mauro Arce, admitiu que há redução da pressão e que por isso a água pode não chegar a regiões mais altas. Segundo ele, a medida é necessária para reduzir perdas de água em virtude dos vazamentos existentes nas redes de distribuição, que chegam a desperdiçar 27% da água tratada, na região metropolitana de São Paulo, segundo o Instituto Trata Brasil.

A presidenta da Sabesp, Dilma Pena, foi na mesma linha. “Não existe racionamento. Existe, sim, falta de água pontual em áreas muito altas, muito longe dos reservatórios setoriais que distribuem água e em residências que moram muitas pessoas que têm reservação muito pequena. Nessas situações, sim, tem falta de água”, afirmou.

Durante a eleição, Alckmin chegou a dizer, até mesmo, que as denúncias de falta de água eram inventadas, citando um condomínio em que teria havido um relato depois não comprovado.

Ontem, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) divulgou mapas repassados pela Sabesp que indicam locais mais propensos À falta de água, em virtude de serem locais altos e haver redutores de pressão próximos. O instituto lançou a campanha Tô Sem Água, que registrou cerca de 600 relatos desde 26 de junho. Destes, 82% afirmam que falta água a noite, 11% de manhã, outros 15% durante o dia e a noite todos, e 6% somente a tarde. Além disso, 58% dos participantes percebem comprometimento na qualidade de água.

Em outra ação, o Idec e a rede Minha Sampa criaram uma “ferramenta de pressão” no site Minha Cidade, direcionada para a presidente da Sabesp e para o diretor da rede metropolitana da Sabesp, Paulo Massato. Já foram encaminhadas 1400 mensagens de consumidores que querem saber onde faltará água.

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