Escola está ocupada há 16 dias contra determinação do reitor da Universidade de São Paulo, de fechar a instituição e transferir os alunos compulsoriamente
São Paulo – O promotor de Justiça João Paulo Faustinoni, do Ministério Público de São Paulo, deu terça-feira (31) parecer favorável a pedido de liminar impetrado pela Associação de Pais e Funcionários da Creche Oeste, exigindo a manutenção das atividades da instituição, uma das duas escolas de educação infantil localizadas dentro da Cidade Universitária, na zona oeste de São Paulo.
O fechamento da creche foi comunicado pela reitoria da Universidade de São Paulo (USP) em 16 de janeiro, sem debate com a comunidade. No dia seguinte, o prédio foi ocupado por pais, professores e funcionários para impedir a ação. Os manifestantes defendem que a reitoria está descumprindo uma resolução do Conselho Universitário, órgão máximo da USP, de novembro de 2016, que determinou o preenchimento das vagas ociosas das creches. Apesar disso, os pais foram apenas informados que o espaço seria fechado e as crianças seriam transferidas para a Creche Central.
Em seu parecer, Faustinoni pede que “seja determinada a manutenção do atendimento em educação infantil” na creche, garantindo, ao menos, a manutenção do atual número de vagas. Além disso, pede a suspensão da transferência de equipamentos, material e mobiliário da creche oeste”, assim como a “remoção provisória dos servidores”.
“O não deferimento da liminar, fatalmente fará perecer o direito fundamental à educação com padrão de qualidade das crianças que frequentavam referido estabelecimento de educação infantil”, diz o parecer. “(…) uma vez estabelecidos os vínculos sociais e afetivos fundamentais para a construção do conhecimento e para o pleno desenvolvimento do indivíduo –notadamente das crianças pequenas –, não se rompam tais relações, salvo em benefício dos próprios alunos, por ato devidamente motivado, o que, como visto, não ocorreu.”
A reitoria não recebeu os pais e tem se negado a falar com a imprensa sobre o caso. Na última sexta-feira (27), estudantes e funcionários da USP fizeram um ato contra o fechamento da creche e saíram em passeata, acompanhados das crianças e de um carro de som, pelas ruas do campus até a sede da reitoria, onde solicitaram, sem sucesso, uma audiência com a direção da universidade.
Segundo Isabelle Somma, mãe de um dos alunos da Creche Central, também na Cidade Universitária, a reitoria justificou a ação por falta de verba e depois defendeu que a manutenção de creche não é a atividade fim da instituição e que por isso ela poderia ser fechada.
“A atividade-fim da USP é ensino pesquisa e extensão e já comprovamos que lá ocorre essas três atividades. Estagiários de fonoaudiologia, pedagogia e medicina trabalham no local. Existem várias pesquisas sendo feitas lá. A creche recebe comissões de diversas cidades para conhecer a entidade”, defendeu. “A conclusão é que a reitoria quer afastar os pobres e as mulheres da universidade que são os que mais precisam das vagas. Soubemos do caso de uma menina que, em 2015 estava lutando por uma vaga e teve que abandonar o curso de pedagogia porque não tinha com quem deixar os filhos.”
A Creche Oeste tem matriculadas atualmente com 40 crianças, mas teria capacidade para 120, caso estivesse em suas condições normais de funcionamento, com o quadro completo de funcionários, segundo levantamento da Associação de Pais e Funcionários (Apef). Neste ano, sem ampliar o quadro de pessoal, a escola poderia atender de imediato mais 37 crianças, além das já matriculadas.
A Associação denuncia que a reitoria vem impedindo desde 2015 a seleção e matrícula de novas crianças para preencher as vagas ociosas nas cinco creches da universidade. A demanda atual de novas vagas é de pelo menos 300 crianças que preenchem os requisitos exigidos para pleitear atendimento, como ser filho aluno, docente ou funcionário.
Em 2017, as Associações de Pais e Funcionários das cinco creches da USP calculam que há pelo menos 157 vagas ociosas que podem ser imediatamente preenchidas. Ao todo, duas das instituições estão localizadas na Cidade Universitária, uma na Faculdade de Medicina, uma no campus de Ribeirão Preto e outra no campus de São Carlos, no interior.
A entidade defende que se as vagas ociosas não forem preenchidas podem causar um rombo nos cofres da USP de R$ 717 mil em 2017 com o pagamento de auxílio-creche a funcionários e docentes. “Se todas as vagas forem preenchidas, nenhum custo a mais incidiria sobre o Orçamento da universidade, que já dispõe de espaço físico, educadores e verba de custeio previstos para 2017”, defendem os pais em texto divulgado à imprensa.
Ocupação
Pais de alunos, funcionários da USP e estudantes da universidade estão organizando juntos a ocupação da creche, ocorrida no último dia 17. Desde então o espaço conta com diversas atividades culturais para as crianças. No último fim de semana, elas foram frequentadas também pelas crianças da Favela São Remo, vizinha à universidade, que foram convidadas a frequentar o local pelos ocupantes.
O movimento recebe o apoio do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), do Diretório Acadêmico dos Estudantes (DCE), da Associação de Pós-Graduandos e da Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo (Adusp). “Estamos contando com uma união muito grande, dentro e fora da USP. Estamos recebendo apoio do Brasil todo, de fóruns de educação e outras entidades ligadas ao tema. Uma mãe que esta na Europa nos mandou uma compra de mercado por serviço de entrega”, disse Isabelle.
Segundo levantamento dos ocupantes, as cinco creches custam 0,3% do orçamento da universidade. “A creche funciona desde 1990, todos os trabalhos estão documentados em fotos, que poderiam se perder. Estamos fazendo isso para proteger o direito das crianças e também o prédio, os móveis e a memória”, diz a mãe.