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Pronta e com verba liberada, Casa da Mulher Brasileira de SP permanece fechada

“O movimento de mulheres reivindica, as vítimas reivindicam, as delegadas reivindicam, juízes e defensorias também. Por que não funciona?”, questiona a ex-ministra Eleonora Menicucci

São Paulo – Pronto desde novembro de 2016, o prédio onde funcionaria a Casa da Mulher Brasileira de São Paulo – um equipamento financiado pelo governo federal para concentrar todos os serviços de atendimento à mulher vítima de violência em um só espaço – segue fechado pela gestão de João Doria (PSDB). “O movimento de mulheres reivindica, as vítimas de violência reivindicam, as delegadas reivindicam, os juízes especializados e as defensorias também. Por que não está funcionando?”, questiona a ex-ministra da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres Eleonora Menicucci, mentora do projeto.

O equipamento, instalado no Cambuci, região central de São Paulo, foi construído com verba liberada em 2013 pelo governo da então presidenta Dilma Rousseff. O projeto previa ainda repasse de dinheiro para custear a manutenção, a compra de mobiliário, a vigilância e a administração da casa por dois anos. A partir daí, a prefeitura e o governo do estado assumiriam os gastos.

O contrato de empenho para custeio da casa pelo governo federal, no valor de R$ 13.569.430,11, foi assinado em 5 de janeiro, pela ex-secretária de Políticas para Mulheres de São Paulo Denise Motta Dau, a pedido da gestão Doria, devido a todo processo ter saído sem nome e não haver tempo hábil para a mudança.

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“Recebi uma ligação afirmando que se não assinássemos naquele dia a prefeitura perderia o direito à verba. Liguei para Fernando Haddad (ex-prefeito) e concordamos em assinar, porque o importante é garantir o serviço para as mulheres. Foram mais de R$ 13 milhões e a casa segue fechada”, diz Denise. “Há boatos de que o equipamento poderia ser desviado para outros serviços, mas todo projeto, espaço e conveniamento foi pensado para mulheres em situação de violência.”

A Secretaria Municipal de Direitos Humanos, à qual a pasta para as mulheres foi incorporada na gestão Doria, afirmou que a verba que deveria ser enviada pelo presidente Michel Temer ainda não chegou a São Paulo e por isso não pode precisar quando a casa começará a funcionar. A reportagem da RBA visitou o local e encontrou o prédio pronto e cercado por grades, trancadas com correntes e cadeados. Havia apenas um vigilante no terreno, que já apresentava o mato bastante alto. Os vizinhos temem que o local comece e ser utilizado por usuários de drogas.

“Posso garantir como ex-ministra que na minha gestão o dinheiro foi repassado”, diz Eleonora. “É uma questão gravíssima com o dinheiro público. São Paulo é enorme e as mulheres precisam desse serviço. O que será feito dessa casa? Haverá desvio de função? Ela terá outra finalidade? Eu não sei… É o caso do movimento de mulheres se organizar para fazer um ‘abraçaço’ na casa e cobrar seu funcionamento”, disse. A Secretaria de Direitos Humanos afirmou que o equipamento será destinado exclusivamente ao atendimento de mulheres vítimas de violência.

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A casa foi construída em um terreno onde funciona o clube de moradores de um conjunto habitacional do bairro, chamado Iapi (Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários) Cambuci, que foi construído na década de 1950. No local havia um campo de bocha, um campo de malha e um parque para crianças, além de espaço para organização de festas juninas e de Natal, tradicionais entre os moradores.

Para que a área pudesse ser utilizada, a prefeitura, na época sob a gestão de Haddad, agilizou o processo de emissão das escrituras dos apartamentos, que ainda não haviam sido regularizados. “Antes tínhamos apenas a carta de concessão”, conta o ex-morador Wagner Gravati, que é professor de Educação Física aposentado.

“Ficamos sem o clube e a casa não está funcionando. Meu marido era o dono do bar que funcionava dentro do clube. Ele ficou sem emprego e a área não está sendo usada”, critica a moradora e dona de casa, Neide Oliveira, cuja família vive no local desde 1952.

O projeto

A Casa da Mulher Brasileira faz parte de um programa desenvolvido pelo governo de Dilma Rousseff, chamado Mulher, Viver Sem Violência, que previa a construção, em cada estado, de um local que reunisse no mesmo espaço todos os serviços de atendimento às mulheres vítimas de violência.

Nas casas funcionam uma delegacia da mulher, um juizado de vara especializada em violência contra mulher, uma promotoria de Justiça, além de locais apropriados para atendimento psicossocial, um alojamento para as mulheres que chegam na casa e locais de capacitação para emprego e geração de renda, em parceria com o Sistema S, para que a mulher possa romper o ciclo de violência.

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“O Pacto de Enfrentamento da Violência Contra a Mulher não estava dando conta porque cada equipamento desses ficava em um lugar. A casa acaba com a via crucis da mulher em busca do atendimento”, diz Eleonora. “A presidenta Dilma destinou na época R$ 360 milhões para construir uma casa. Cabia às prefeituras das capitais e aos governadores aderirem e fazerem parceiras com o sistema de justiça, operadoras do direito e profissionais de atendimento psicossocial, com todos os serviços e com o movimento de mulheres.”

Foram inauguradas casas em Campo Grande, Curitiba e Brasília – esta última também está parada por um problema no terreno. Aguardam inauguração as de São Paulo, São Luís, Boa Vista e Fortaleza. Em Salvador e Vitória, as casas estão em processo de construção. O Banco do Brasil era o responsável pela licitação para as obras.

“Em 2013 percorri o Brasil todo fazendo essas adesões, inclusive aqui em São Paulo, com Haddad e Geraldo Alckmin (governador do estado)”, lembra Eleonora. “Esse projeto é a menina dos meus olhos e da presidenta Dilma. Tenho muito orgulho disso e te digo que é lamentável o que ocorre. O movimento de mulheres tem que se organizar para cobrar o funcionamento, mas tem que ser logo, porque é dinheiro público e as mulheres precisam desse serviço.”

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