Notícias

Psicologia e Ditadura – Não esquecer para não repetir

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) lançou, na noite de quinta-feira (12/12), em Brasília, o livro “A Verdade é Revolucionária: testemunhos e memórias de psicólogas e psicólogos sobre a ditadura civil-militar brasileira (1964-1985)”. A publicação, que disponível também em formato online, contém 700 páginas com testemunhos de 55 profissionais de todas as regiões do Brasil que, de diversas maneiras, tiveram suas vidas atravessadas pelo período da repressão no País.

O livro também inclui relatos de filhas e filhos de militantes que observam como a ditadura impactou a vida de seus pais e as suas próprias escolhas. Há falas de pessoas que optaram por não se engajar, mas se mantiveram atentas aos rumos políticos do Brasil. Há, ainda, depoimentos de psicólogas (os) que atenderam a homens e mulheres presos e torturados.

O presidente do CFP, Aluízio Lopes de Brito, considera a publicação como um testemunho da participação dos psicólogos e psicólogas na história brasileira. “Eles passaram por humilhações, se enxergando como subversivos e postos à margem da profissão. Mostramos, com esse livro, que eles tinham razão quando entregaram suas vidas a essas causas”, disse.

Brito enfatizou a coragem dos psicólogos durante a ditadura militar. “Essas pessoas, em nome da nação, movidas por toda formação da Psicologia, ousaram fazer o enfrentamento contra os abusos cometidos no período da repressão”, frisou. O presidente do CFP estima que o livro ressalte a presença da Psicologia como referência nos direitos humanos.

O coordenador da Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH/CFP), Pedro Paulo Bicalho, que participou da organização do livro, lembrou as atividades do grupo. “Foram três anos de muito trabalho, articulado com os Conselhos Regionais de Psicologia”, emocionou-se. Entre outros temas, a CNDH abordou questões polêmicas como orientação sexual, hospitais psiquiátricos, usuários de drogas, processo transexualizador, laicidade, questões indígenas e racismo.

De acordo com Bicalho, lançar o livro é fazer um retrospecto sobre as atividades realizadas. “Nós psicólogos (as) não sabemos dos efeitos que a ditadura foi para a categoria. Escrever essa história foi fundamental para as próximas gerações entenderem como nossa profissão foi afetada naquele período”, explicou.

A Psicologia foi a primeira profissão a escrever um livro específico sobre a atuação de uma categoria durante o período de repressão no Brasil. Para Pedro Paulo, a expectativa é que, a partir dele,  seja possível repensar a historia política do país, influenciando outras carreiras a fazerem o mesmo. “Que esta publicação seja a primeira de muitas que virão”, estimou.

Sobre a necessidade de se continuar com a pesquisa em defesa da memória e da verdade por meio dos quase 100 comitês espalhados pelo Brasil, o deputado Nilmário Miranda (PT-MG), fundador da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, em 1995, considera importante por se tratar de um direito da população. “Esse trabalho só vai se completar quando houver o julgamento de todos os crimes cometidos nesse período”, afirmou.

Em relação ao impacto na vida da população, o gerente de relações institucionais da Comissão Nacional da Verdade, Marcio Kameoka, acredita que a publicação reverberou o processo generalizado que a ditadura impôs no Brasil. “Teve gente que passou por percalços tão pesados no Norte e Nordeste quanto nos grandes centros do País, mas quando se fala em ditadura pensam no Sul e no Sudeste”, ressalta. “Se tem alguém que está ajudando a recuperar a memória pela verdade são as organizações da sociedade civil, como o CFP”, elogiou.

Prêmio DH

A cerimônia de lançamento do livro “A verdade é revolucionária” contou com a premiação dos psicólogos Fernando Lacerda Junior e Domenico Uhng Hur, que receberam o primeiro lugar na categoria profissional no Prêmio Psicologia e Direitos Humanos: Ditadura Civil-Militar e Repercussão sobre a Psicologia como Ciência e Profissão. A inciativa foi promovida pela Comissão de Direitos Humanos do CFP.

Fernando Lacerda falou sobre o trabalho, que abordou a influência da atividade insurgente na Psicologia. O artigo inclui entrevistas com ex-guerrilheiros, sob o viés do tipo de Psicologia que surge a partir dessa aliança. “Queríamos mostrar como os sujeitos que estavam envolvidos na política lidavam com isso. A luta armada no Brasil e América Latina não veio por pulso terrorista, mas da ausência de possibilidades de participação política diante do poder Estatal”.

Domênico Uhng Hur, coautor do artigo vencedor, frisou que o trabalho mostrou como a Psicologia se transformou da ditadura até hoje. “No período repressivo, via-se uma Psicologia estruturada pelo status quo; hoje é profissão social diferenciada – voltada para melhores condições de vida para a população em geral”, argumentou.

Estiveram presentes na cerimônia conselheiros federais, representantes de conselhos regionais e participantes do Fórum Mundial de Direitos Humanos. A transmissão está disponível na íntegra na página do CFP no Youtube, clique aqui para assistir.

Deixe um comentário