“Um dia,
Vivi a ilusão de que ser homem bastaria
Que o mundo masculino tudo me daria
Do que eu quisesse ter
Que nada, minha porção mulher que até então se resguardara
É a porção melhor que trago em mim agora
É o que me faz viver”
“Ser um homem feminino
não fere o meu lado masculino”.
Com os versos de Gilberto Gil e Pepeu Gomes , a psicóloga Janaína Leslão Garcia, que coordena o Centro de Referência para Mulheres em Situação de Violência da Prefeitura de Diadema (SP), trouxe ao debate online “Violência contra a Mulher – Psicologia e Políticas Públicas: Desafios para a Democracia” um tema polêmico: a questão de gênero e seus estereótipos. O debate – que também será tema para publicação disponível até o início do próximo ano – foi realizado na manhã de quarta-feira (27), com transmissão pelo site do Conselho Federal de Psicologia (CFP), e teve 600 pontos de acesso.
“Nos casos de violência doméstica, o psicólogo deve atuar com responsabilidade social analisando, crítica e politicamente, a realidade econômica e social dessas mulheres, que chegam a uma situação muitas vezes de submissão e de violência por não conseguirem sair de casa”, explicou Janaína , ressaltando que segundo dados recentes dos CREAS, 80% das pessoas que agridem mulheres são seus companheiros ou ex-companheiros. E, ainda, que grande parte das vitimas não tem coragem de relatar quem foi o autor da violência. “Normalmente as pessoas partem do pressuposto de que as mulheres que procuram ajuda são heterossexuais, mas nem sempre é assim. As pessoas muitas vezes desconhecem que o serviço atende violência de gênero e que não é contra os homens”, constatou.
A conselheira do CFP e mediadora do debate, Roseli Goffman, destacou que as psicólogas também estão sujeitas à violência. A primeira etapa da pesquisa organizada pelo CFP “Profissão e Gênero no Exercício da Psicologia no Brasil”, iniciada em maio deste ano, revelou que uma em cada cinco mulheres já sofreu algum tipo de violência. “ Devemos, enquanto psicólogas, nos apropriarmos de todos os recursos de enfrentamento à violência que temos à disposição”, indicou.
Atendimento multidisciplinar
A importância de uma rede de atendimento fortalecida e de uma equipe multiprofissional no atendimento a mulher também foram destacados pelas palestrantes durante o debate. A psicóloga da Coordenação de Humanização da Secretaria Executiva de Saúde Pública do Estado do Pará (SESPA), Adriana Reis, defendeu não só uma atuação conjunta com profissionais de diversas áreas, mas a necessidade de repensar áreas de intervenção que vão além do atendimento individualizado, além da importância de ter uma formação em temáticas transversais, de gênero e direitos humanos. “Nenhum psicólogo (a) que atua com áreas de violência trabalha sozinho. É preciso ter uma clínica ampliada com equipes multidisciplinares que atuem de maneira integrada”, afirmou.
Para a palestrante Soraia da Rosa Mendes, coordenadora do Grupo de Pesquisa Política Criminal e Direitos Fundamentais da UNB, a Lei Maria da Penha ficou conhecida como a lei que prende os homens, que traz uma punição. “Na realidade, ela não traz tipos penais novos e cria alguns obstáculos a ritos processuais que traziam problemas sérios para mulheres. A rede de violência não envolve só a parte física, mas a sexual e patrimonial. Precisamos de uma rede de políticas públicas ultrapassando o limite do penal, que demonstre as violações que ocorrem no âmbito do espaço doméstico”, sinalizou Soraia.
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