“Ética é um potente dispositivo de enfrentamento da violência”. Com esta afirmação, o coordenador da Comissão Nacional dos Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia, Pedro Paulo Bicalho, defendeu a necessidade de se apontar os limites éticos do exercício profissional durante audiência pública da Comissão de Educação, Cultura e Esporte, nesta quarta-feira (29/8) no Senado Federal.
A audiência, requerida pela senadora Marta Suplicy (PT-SP), teve como tema Ética profissional: diversidade sexual e direitos humanos. Também integraram a mesa a deputada federal Erika Kokay (PT-DF), a assessora da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Ivanilda Figueiredo, a secretária do Conselho Federal de Serviço Social, Raimunda Pereira e a representante da comissão de Direito Homo afetivo da OAB, Patrícia Sanches.
No que diz respeito à diversidade sexual, Pedro Paulo Bicalho destacou a necessidade de os conselhos profissionais, autonomamente, construírem as suas resoluções, a exemplo da resolução 001/99 do CFP, que determina e reafirma os princípios éticos no tratamento do assunto. “Existe no imaginário social uma afirmação de que somos nós os profissionais responsáveis para se estabelecer uma proposta de cura ao que, contraditoriamente, a psicologia desde esta resolução não afirma como sendo uma patologia, perversão ou desvio”, explicou.
Bicalho ressaltou, ainda, que a resolução do CFP é um instrumento importante, usado, inclusive, pelo Poder Judiciário, e cumpre sua função de pautar pela ética. “É uma grande função dos conselhos profissionais brasileiros o de pautar determinados discursos, já que não se trata de profissões que produzem discursos quaisquer. São científica e socialmente legitimados como discursos de poder”.
Durante os debates, os representantes foram unânimes em destacar a necessidade de políticas públicas e da atuação do Legislativo para o respeito à diversidade, o combate ao preconceito, a homofobia e a violência.
Repúdio
Pedro Paulo Bicalho também apresentou à Comissão uma nota de desagravo do Conselho em apoio à psicóloga Tatiana Lionço que teve uma declaração alterada e editada, à revelia por um deputado federal.
Em maio, Tatiana Lionço participou do Seminário “Diversidade se Aprende na Infância”, organizado pelas Comissões de Direitos Humanos e Minorias e de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados. As declarações dadas sobre a questão da sexualidade infantil e a distribuição ou não dos kits antihomofobia nas escolas, foram editadas e usadas em vídeo intitulado “Deus Salve as Crianças”, que dá outro sentido à fala da psicóloga, a relacionando, inclusive, ao incentivo a pedofilia.
Tatiana Lionço, que desde a publicação do vídeo vem tendo sua imagem reproduzida em sites e blogs, acionou a Câmara dos Deputados por meio da Ouvidoria, Comissão de Ética e Decoro Parlamentar, Corregedoria e protocolizou uma solicitação formal de averiguação à presidência da Casa. O próximo passo é na esfera criminal. “Com as outras pessoas envolvidas no vídeo vamos apresentar uma representação criminal na Procuradoria Geral da República. Como o deputado não pode ser processado diretamente por nós, esperamos que esse caso seja levado ao Supremo Tribunal Federal”, explica.
A nota de agravo foi incluída na ata da audiência. “Esta casa manifesta seu apoio à psicóloga que foi extremamente violada em seus direitos. A senhora tem o respeito e o total apoio não apenas nosso, mas de toda a sociedade brasileira”, finalizou a senadora.
A deputada federal Erika Kokay, reafirmou o apoio a Tatiana. “Esta é uma luta em defesa ao exercício da sua condição profissional e vamos fazer o que for necessário para lhe devolver a liberdade e o seu direito”, disse.
Veja abaixo a Nota de Desagravo na íntegra.
NOTA DE DESAGRAVO
O Conselho Federal de Psicologia (CFP) vem publicamente manifestar o seu apoio à psicóloga Tatiana Lionço, CRP 01/7615-1, que foi desrespeitada em suas prerrogativas profissionais ao ter suas manifestações no Seminário “Diversidade se aprende na infância”, organizado pelas Comissões de Direitos Humanos e Minorias e Educação e Cultura da Câmara dos Deputados, posteriormente editadas à sua revelia em vídeo intitulado “Deus salve as crianças”. O vídeo, cuja abertura é feita por parlamentar daquela Casa Legislativa, está publicado na internet e é composto por frases recortadas e arranjadas, dando outros sentidos à fala da psicóloga.
Conforme pode ser observado no vídeo completo, a psicóloga Tatiana Lionço, em seu pronunciamento no mencionado Seminário ocorrido em 15 de maio último, destacou de modo geral a necessidade de atribuir o status de sujeito de direitos a crianças e adolescentes, conferindo-lhes o direito à dignidade e ao livre desenvolvimento da personalidade. Desta forma, suas contribuições foram na direção da superação de preconceitos e discriminações, bem como do enfrentamento a violações de direitos humanos, conforme preconizam a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código de Ética Profissional do Psicólogo e também a Resolução CFP 001/1999, que estabelece normas de atuação em relação à questão da orientação sexual.
Assim, por considerar nefasto o ato de agravo de utilizar o discurso da psicóloga na tentativa de disseminação de preconceito e discriminação, o CFP vem por meio desta nota repudiar veemente tal situação ao tempo que manifesta sua solidariedade a psicóloga que, por meio de sua fala, reafirma o compromisso da Psicologia na garantia e defesa dos Direitos Humanos.