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Corte de verbas de Serra para o Tietê aumenta risco de enchentes em SP

A principal causa das enchentes que deixaram vários bairros da zona leste de São Paulo alagados por várias semanas consecutivas em 2010 pode ter sido negligência por parte do governo de José Serra (PSDB). Esta é a conclusão de um estudo da liderança do PT na Assembleia Legislativa paulista (Alesp), que mostra que o então governador do estado promoveu um drástico corte de verbas para o desassoreamento do Rio Tietê, apesar de o orçamento do estado prever recursos para as obras.

Segundo o estudo, entre 2007 e 2010 o Orçamento previa um investimento de R$ 320 milhões em serviços e obras no Alto Tietê, mas apenas R$ 280 milhões foram liquidados. Apesar do ritmo rápido de execução na reta final do governo, no ano passado, as obras de infraestrutura de saneamento e combate às enchentes receberam R$ 47 milhões a menos que o previsto ao longo dos quatro anos. Em 2009 foram reservados R$ 188 milhões para a limpeza da chamada calha do rio Tietê – o que retira a grande quantidade de terra, areia, pedras e lixo do leito do rio, garantindo a manutenção da profundidade do curso d’água. No entanto, apenas R$ 44 milhões foram efetivamente aplicados nos trabalhos.

A liderança petista na Alesp afirma que, a cada ano, é preciso retirar cerca de 1 milhão de metros cúbicos de terra do fundo do rio para que seja mantida uma profundidade que comporte o grande volume de água em períodos de chuvas intensas. Mas, ainda segundo o estudo, em outubro de 2008, o governo de São Paulo firmou contratos para a retirada de apenas 400 mil metros cúbicos em 2009. A bancada acusa que foram efetivamente cumpridos cerca de 310 mil metros cúbicos de escavações. Com isso, o rio teria perdido 50% de sua profundidade. A consequência foi a sucessão de enchentes dramáticas no verão 2009-2010.

Em pontos de maior vulnerabilidade, como o Jardim Pantanal e o Jardim Romano, as águas invadiram as casas – uma situação agravada pela proximidade da região às comportas da Penha e pela sua localização em área de mananciais. No restante da cidade, o alagamento de ruas próximas aos vários córregos que desembocam no Tietê provocaram caos no trânsito, desordem, saques, degradação urbana e até mortes.

Álvaro Rodrigues dos Santos, ex-diretor de Planejamento e Gestão do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), pondera que, apesar dos esforços de algumas instâncias governamentais, não houve até o momento uma política de ruptura com as causas das enchentes. O pesquisador afirma que, pelo contrário, continuam se agravando os principais fatores, em especial a ocupação indevida do solo, que aumenta a erosão e, por consequência, a terra que acaba despejada no rio, diminuindo a capacidade de drenagem do mesmo. “Não haverá milagre tecnológico, nem mesmo os deletérios piscinões, que conseguirá algum bom resultado sem que se estanque a fonte original de nosso enorme problema: a total ausência de uma regulação técnica adequada da expansão urbana da metrópole.”

O grande erro
Segundo o estudo da bancada do PT, já em seu primeiro ano de mandato, em 2006, José Serra reduziu a aplicação de recursos em serviços e obras na bacia do Alto Tietê, passando de R$ 464,7 milhões em 2005 para R$ 73 milhões (em valores corrigidos pelo IGP-DI). O corte no orçamento prosseguiu em 2007, quando foi de R$ 35 milhões. Passou a R$ 44,3 milhões em 2008, valor próximo ao investido em 2009.

“O mais grave é que, entre os anos de 2000 e 2005, o estado gastou R$ 1,7 bilhão (para desassorear o leito do Tietê) e o Serra prejudicou todo o trabalho já feito, ou seja, ele jogou ‘pelo ralo’ todo esse volume de dinheiro público”, afirma o deputado Adriano Diogo, que é geólogo e sanitarista e foi secretário municipal do Meio Ambiente da capital paulista, na gestão Marta Suplicy.

Ele prevê a repetição das enchentes ocorridas nos bairros da zona leste no ano passado. “Obras de desassoreamento só podem ser feitas a partir de maio e até setembro, que é uma época de menos chuvas em São Paulo. Não dá pra fazer nada agora, como solução de emergência, para que evitar que o nível do rio suba muito rapidamente e transborde as margens. Se chover forte naquela região, a ocorrência de novos problemas é inevitável.”

Os problemas registrados na cidade de São Paulo – e na região metropolitana como um todo – não podem ser analisados de maneira isolada. A bacia do Alto Tietê tem seis mil quilômetros quadrados e abrange mais de 30 municípios, ou seja, a articulação promovida pelo governo estadual é fundamental para estabelecer uma verdadeira política de prevenção.

Criado em 1998, o Plano Diretor de Macrodrenagem da Bacia do Alto Tietê deve ser o responsável por essa articulação. O programa prevê tratar das várias sub-bacias do estado, como Tamanduateí, Aricanduva e Ribeirão Vermelho, não apenas trabalhando em torno do desassoreamento e do alargamento da calha do Tietê, mas prevenindo que ocorram novas ocupações irregulares.

Aluísio Canholi, ex-coordenador do Plano de Macrodrenagem e diretor da Hidrostudio Engenharia, entende que os trabalhos vêm sendo bem conduzidos. Ele considera que não há solução que não passe por vultosos investimentos, especialmente atacando os principais pontos de enchentes de cada uma das bacias que desembocam no Tietê. Por outro lado, Canholi pontua que continuar alargando a calha do rio é muito complicado por demandar um investimento muito alto e, com o aumento da vazão gerado por essa obra, haver a possibilidade de inundação nas demais cidades atravessadas pelo curso d’água.

Represas
O pesquisador pensa que o problema das áreas mais afetadas pelas enchentes deste começo de ano não é de investimento, mas de ocupação. Devido a verões mais secos que os dos últimos dois anos, muitas pessoas teriam se mudado para áreas próximas a barragens, especialmente em Franco da Rocha e Atibaia, agora alagadas. “Vê-se que as áreas a jusante estão apresentando grandes vertimentos, ou seja, as calhas desses rios não estão conseguindo veicular a vazão do vertedouro sem causar enchente nesses bairros novos.” Neste caso, haveria duas saídas: a desocupação total das áreas ou a construção de reservatórios que deem conta do volume de água.

Reportagem de Conceição Lemes publicada no site VioMundo vê outra explicação para os problemas registrados em Franco da Rocha. A Sabesp teria cometido um equívoco na abertura de comportas. Primeiro, precipitando-se na liberação de água da barragem Paiva Castro. A prefeitura argumenta que a abertura deveria ocorrer apenas no dia 12, mas foi realizada na noite anterior sem qualquer emissão de novo aviso. O engenheiro Júlio Cerqueira César Neto, ex- professor de Hidráulica e Saneamento da Escola Politécnica da USP, entende que não há nada que justifique a vazão média registrada em Paiva Castro e acrescenta que o volume de chuva não tem nada de excepcional à média.

A principal represa do Alto Tietê, informa o VioMundo, chegou em um nível muito alto à estação chuvosa. O correto é fazer pequenas e graduais liberações na época de estiagem para que a barragem não encha rapidamente durante o verão, forçando liberação das comportas. Já no primeiro dia deste ano a represa Jaguari-Jacareí estava com 83,97% de sua capacidade, o que pode ter forçado a Sabesp a liberar a água de outros pontos para evitar problemas ainda mais graves.

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