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Encontro de Bauru: 30 anos da luta por uma sociedade sem manicômios

Nos dias 8 e 9 de dezembro, sindicatos e conselhos de Psicologia se reunirão a integrantes dos movimentos organizados, pesquisadoras(es), estudantes e trabalhadores(as) da saúde mental no Encontro de Bauru: 30 anos de luta por uma sociedade sem manicômios, na Universidade Sagrado Coração, em Bauru, interior de São Paulo.

O evento, que vai celebrar os 30 anos da assinatura da carta Bauru, marca três décadas de luta por uma sociedade sem manicômios e da Psicologia assumindo o protagonismo das políticas de saúde mental no Brasil.

Como a lógica manicomial continua viva e presente, ainda mais em tempos de desmonte de políticas pública e do próprio SUS pelo governo Temer, a luta de Bauru se atualiza de diversas formas.

Durante dois dias, serão promovidas rodas de conversa, atividades culturais, feira da economia solidária e um ato público na noite do dia 8, na Praça Rui Barbosa, no Centro de Bauru.

Acompanhe nesta terça-feira, 5 de dezembro, às 19h, entrevista ao vivo do presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Rogério Giannini, no programa Seu Jornal, da TVT. Basta clicar aqui para ver online.

A carta

Em dezembro de 1987, trabalhadores da saúde mental reunidos em Bauru redigiram o manifesto que marcou o início da luta antimanicomial no Brasil e representou um marco no combate ao estigma e à exclusão de pessoas em sofrimento psíquico grave. Com o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, o congresso discutiu as formas de cuidado com os que apresentam sofrimento mental grave e representou um marco histórico do Movimento da Luta Antimanicomial, inaugurando nova trajetória da Reforma Psiquiátrica brasileira.

Os 350 trabalhadores de saúde mental presentes no congresso ocuparam as ruas da cidade e fizeram a primeira manifestação pública organizada no Brasil pela extinção dos manicômios, o chamado Manifesto de Bauru. Aquela atitude marcou uma ruptura, pois eles se recusaram a exercer o papel de agentes da exclusão e da violência institucionalizadas, “que desrespeitam os mínimos direitos da pessoa humana”.

O manifesto denunciava que o Estado que gerencia os serviços de saúde mental é o mesmo que impõe e sustenta os mecanismos de exploração e de produção social da loucura e da violência. “O compromisso estabelecido pela luta antimanicomial impõe uma aliança com o movimento popular e a classe trabalhadora organizada.”

O manicômio expressa uma estrutura presente nos diversos mecanismos de opressão da sociedade, como a opressão nas fábricas, nas instituições de adolescentes, nos cárceres, a discriminação contra negros, homossexuais, índios e mulheres, esclarece outro trecho do manifesto. “Lutar pelos direitos de cidadania dos doentes mentais significa incorporar-se à luta de todos os trabalhadores por seus direitos mínimos a saúde, justiça e melhores condições de vida.”

Conjuntura

Até o final dos anos 1980, o manicômio era o ápice de uma concepção que excluía, segregava e negava a cidadania de homens e mulheres condenados a uma espécie de morte em vida – ou à morte de fato – em decorrência de maus tratos e da violência dos eletrochoques e solitárias.

O movimento da luta antimanicomial combate a ideia de que pessoas com sofrimento mental devem ser isoladas em nome de pretensos tratamentos. Lembra que, como todo cidadão, elas têm direitos fundamentais à liberdade, a viver em sociedade e ao cuidado e tratamento, sem que precisem abrir mão da cidadania.

A luta antimanicomial congrega usuários, familiares e trabalhadores da saúde mental que acreditam na mudança do modelo de atenção às pessoas em sofrimento mental e buscam a desinstitucionalização, o combate à institucionalização involuntária, a convivência em sociedade e, principalmente, o respeito aos direitos humanos.

Diante da conjuntura social e política do país e refletindo sobre os recentes desafios e impasses das políticas de saúde mental, em particular com a expansão das chamadas comunidades terapêuticas, que acabam por reintroduzir a lógica manicomial na rede de atenção, as (os) profissionais da Psicologia precisam novamente se posicionar a favor de uma atenção à saúde mental antimanicomial.

SERVIÇO
Encontro de Bauru: 30 anos de luta por uma sociedade sem manicômios
Data: 8 e 9 de dezembro de 2017
Locais:

Rodas de Conversas: USC (Universidade do Sagrado Coração):
R. Irmã Arminda, 10-50 – Jardim Brasil, Bauru – SP

Programação Cultural: Parque Vitória Régia:
Av. Nações Unidas, 25-25 – Jardim Brasil, Bauru – SP

Ato público: Praça Rui Barbosa: Centro, Bauru – SP

Programação:
8/12
Manhã
Abertura do Encontro de Bauru (USC)

Tarde
Rodas de conversa
Caravana de Direitos Humanos (Defensoria Pública)

Noite
Ato público na cidade (Praça Rui Barbosa)

9/12
Manhã
Rodas de conversa (USC)

Tarde
Plenária final

Noite
Programação cultural: Parque Vitória Régia

Rodas de conversa
Todas as rodas de conversa têm como proposta discutir balanço, desafios e estratégias de luta e resistência na perspectiva de construção de propostas para a Plenária Final do Encontro de Bauru.

Temas:
1. Cuidado em liberdade: a RAPS que queremos
2. Por uma reforma psiquiátrica antimanicomial: desafios e impasses para os movimentos sociais
3. Trabalho em saúde e enfrentamento da precarização
4. Contra a maré: velhos e novos problemas da institucionalização
5. Justiça e garantia de direitos
6. Loucos como sujeitos de direitos
7. Comunicação e cultura
8. Infância e juventude
9. Álcool e outras drogas
10. Políticas públicas em tempos de desmonte dos direitos sociais
11. O direito à diferença: a luta contra as opressões
12. O direito à cidade: Luta Antimanicomial e intersetorialidade
13. Geração de trabalho e renda e Economia Solidária
14. Medicalização da sociedade

Leia abaixo a Carta de Bauru
“Um desafio radicalmente novo se coloca agora para o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental. Ao ocuparmos as ruas de Bauru, na primeira manifestação pública organizada no Brasil pela extinção dos manicômios, os 350 trabalhadores de saúde mental presentes ao II Congresso Nacional dão um passo adiante na história do Movimento, marcando um novo momento na luta contra a exclusão e a discriminação.
Nossa atitude marca uma ruptura. Ao recusarmos o papel de agente da exclusão e da violência institucionalizadas, que desrespeitam os mínimos direitos da pessoa humana, inauguramos um novo compromisso. Temos claro que não basta racionalizar e modernizar os serviços nos quais trabalhamos.
O Estado que gerencia tais serviços é o mesmo que impõe e sustenta os mecanismos de exploração e de produção social da loucura e da violência. O compromisso estabelecido pela luta antimanicomial impõe uma aliança com o movimento popular e a classe trabalhadora organizada.
O manicômio é expressão de uma estrutura, presente nos diversos mecanismos de opressão desse tipo de sociedade. A opressão nas fábricas, nas instituições de adolescentes, nos cárceres, a discriminação contra negros, homossexuais, índios, mulheres. Lutar pelos direitos de cidadania dos doentes mentais significa incorporar-se à luta de todos os trabalhadores por seus direitos mínimos à saúde, justiça e melhores condições de vida.
Organizado em vários estados, o Movimento caminha agora para uma articulação nacional. Tal articulação buscará dar conta da Organização dos Trabalhadores em Saúde Mental, aliados efetiva e sistematicamente ao movimento popular e sindical.
Contra a mercantilização da doença!
Contra a mercantilização da doença; contra uma reforma sanitária privatizante e autoritária; por uma reforma sanitária democrática e popular; pela reforma agrária e urbana; pela organização livre e independente dos trabalhadores; pelo direito à sindicalização dos serviços públicos; pelo Dia Nacional de Luta Antimanicomial em 1988!
Por uma sociedade sem manicômios!
Bauru, dezembro de 1987 – II Congresso Nacional de Trabalhadores em Saúde Mental”

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