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Facebook enfraquece o debate político no Brasil, afirma professor da PUC

Silvio Mieli, pesquisador dos novos fluxos informacionais, fala sobre o peso do Facebook na política brasileira

Batizado de “This is Your Digital Life”, o que parecia um teste psicológico inocente dentro do Facebook foi o meio encontrado pelo desenvolvedor para coletar as informações de cerca de 87 milhões de dados de usuários da rede social.

O escândalo batizado de “Cambridge Analytica”, leva o nome da empresa britânica que utilizou de forma ilegal os dados para executar planos de “comunicação estratégica” inclusive na campanha de Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, eleito pelo partido Republicano. Esse tema foi o pontapé inicial da conversa que o Brasil de Fato realizou com o professor de comunicação Silvio Mieli.

Mieli falou sobre o papel da rede social na política e destacou que o Facebook definitivamente não pode ser visto como “bastião da democracia”, pelo contrário, ele seria, antes de tudo “um instrumento de controle e vigilância”. Além disso, ele destacou que hoje ser visto, a visibilidade dos dados é um valor quantitativo que está sendo explorado pelo mercado.

Leia na íntegra da entrevista.

Brasil de Fato: Como enxerga a influência do Facebook na vida das pessoas hoje?

Silvio Mieli: O facebook é um instrumento de controle por definição. Um instrumento de controle que abarcou uma série de valores que no mundo contemporâneo são muito aceitos, como por exemplo o valor da  exposição. O facebook se solidificou muito em cima disso, parece que a gente se esqueceu que é uma forma de controle e de vigilância. São dados baseados em hábitos, comportamentos humanos. Como você reage diante do que compra, que filmes vê. Esse universo do comportamento que passa a ser usado como matéria-prima básica para o cruzamento de dados, que vai definir lá na frente se um público alvo vai votar nesse candidato ou num outro.

Você acredita que o Facebook é mais um player na política? Teria esse peso de influência?

Veja que a política institucional, enquanto forma de mediação e representação também entrou numa crise profunda porque outras formas passaram a ganhar a atenção. Dentre essas formas tem essa da superexposição. A política, por um lado, abrigou o espetáculo e, por outro lado,  o espetáculo ganhou autonomia política. A velha política representativa e institucional foi tragada, domesticada e instrumentalizada por esses recursos. Vamos considerar que o Facebook cresce exatamente num momento de decadência do trabalho, da economia, de enfraquecimento sóciopolítico. A gente vê, às vezes, o facebook como uma forma de potencializar o jogo político, mas não vejo assim, ele enfraquece o jogo político. A não ser quando se usa o Facebook como uma forma de troca de informação para divulgar alguma coisa, fora isso, ele se presta para um enfraquecimento e empobrecimento político.

Isso tem relação com a questão quantitativa?

Todos os cálculos econômicos e políticos que essa plataforma faz, parte de um processo de quantificação da realidade social e política. O ser humano passou a ser um número ligado ao seu comportamento. A leitura política via facebook é muito limitada, você está lendo um dado, um número, você não está vendo um ser humano ou conteúdo, e sim um comportamento. O problema é que essa lógica quantitativa influencia nossa forma de vida, nosso comportamento e a política. A política se alimenta dessa quantificação, a gente se comporta nas redes também de forma mecânica. Ou é sim ou não, ou estou deste lado ou do outro, isso é típico do adestramento. Parece que a gente perdeu um certo jogo de cintura e uma forma não quantitativa de se comportar, de construir consenso, de fazer política.

Parece que o debate sobre privacidade ganha novas dimensões.

Se debateu muito isso sobre a privacidade, depois de um tempo não se falou mais porque ela passou a ser um valor. Eu insisto muito nisso, o fato de dados privados da nossa vida serem expostos e isso passar a ser um valor na sociedade acabou ajudando a referendar essas tecnologias.

Então, considera que temos que olhar essa quantificação de forma crítica?

A prioridade número um: a politização da tecnologia. Se a gente quer usar essas plataformas para subverter o fluxo de informação é claro que a gente precisa conhecê-la melhor. E acho que a gente dormiu no ponto. Já tivemos momentos em que a esquerda estava mais interessada em politizar a tecnologia, isso precisa voltar a ser prioridade está na hora de encarar essa prioridade como plataforma política.

O Brasil foi o oitavo país com mais usuários impactados pela exploração inadequada de seus dados pessoas. Foram mais de 443 mil brasileiros impactados. O fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, reconheceu  recentemente que a empresa cometeu erros na proteção de seus usuários.

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