Artigos publicados em CartaCapital nos últimos dias refletem o tom da guerra travada na Justiça entre a Fundação Casa e a Promotoria da Infância e Juventude da Capital. A polêmica é a eficácia das medidas socioeducativas aplicadas em São Paulo pelo órgão do governo do Estado. Para um grupo de trabalho do Ministério Público, formado por dez promotores, a Fundação Casa vive um quadro de “falência” por conta de serviços “incompetentes”. Enquanto isso, a instituição defende ter condições “adequadas” para a aplicação de medidas.
Segundo os promotores de Justiça que estão à frente de apurações sobre o serviço da Fundação Casa, em artigo publicado na sexta-feira 6, a instituição “não apresenta resultados minimamente satisfatórios”. Pelo contrário. Em visitas regulares, os promotores dizem ter encontrado “elevados índices de reincidência, superlotação de unidades, frequentes rebeliões, notícias regulares de torturas, e insalubridade das condições de moradia”, dentre outras “deficiências”.
O problema é que essas “diversas irregularidades” são fruto de um investimento de 10 mil reais, por mês, por cada adolescente internado. A verba investida, segundo os promotores, não é compatível com a qualidade dos serviço, o que coloca em cheque as contas da instituição. “As graves falhas identificadas induzem a duas conclusões: a entidade não cumpre sua função adequadamente e, consequentemente, o produto do significativo valor despendido pelos cofres públicos é um serviço socioeducativo incompetente”, afirma o texto.
Diante dessa situação, o Ministério Público afirma que é necessário reavaliar as políticas públicas relacionadas aos jovens e adolescentes em conflito com a lei, e a consequente gestão da Fundação Casa, sob controle do governo Geraldo Alckmin (PSDB). “Dentre as medidas a serem adotadas será preciso solucionar, vez por todas, o problema da superlotação, e garantir um processo socioeducativo satisfatório pelo tempo necessário à reeducação dos adolescentes, que apresente à sociedade resultados eficientes e proporcionais ao expressivo investimento feito pelos cofres públicos”.
Em resposta também publicada em CartaCapital, na segunda-feira 9, a presidente da Fundação Casa, Berenice Gianella, diz que as informações divulgadas pelo MP são “irreais”. Segundo a gestora, 91,3% das unidades da instituição foram consideradas “adequadas no quesito salubridade” pelo Conselho Nacional de Justiça, em 2013. Além disso, sobre as denúncias de superlotação, o órgão se apoia em uma liminar da Justiça que garante à instituição o direito de exceder em até 15% a capacidade populacional de cada unidade. Reportagem de CartaCapital já revelou, entretanto, que mesmo assim uma em cada três “Casas” têm número de adolescentes superior ao recomendado.
“Lamentavelmente, as afirmações equivocadas mostram, no mínimo, um certo desconhecimento dos autores sobre a evolução pelo qual o Estado de São Paulo passou em seu sistema socioeducativo desde 2005. Hoje, pode-se se afirmar que o cenário é bem diferente do outrora vivenciado pela antiga Febem”, defende Berenice.
A Fundação Casa também afirma que o índice de reincidência, citado pelos promotores, é referente ao “índice nacional de reincidência dos adolescentes internos” e não especificamente em relação ao sistema paulista. “É fato que a Fundação tem problemas, mas são infinitamente menores do que eram anos atrás e infinitamente menores do que o alarde feito com o discurso que ora se combate”, conclui a presidente.
As denúncias citadas no artigo feito pelos promotores já resultaram em pelo menos duas ações civis públicas na Justiça. Uma por conta da superlotação e outra que visa investigar as contas da instituição. No primeiro caso, a Justiça deu ganho de causa à Fundação Casa, que não teve de se adequar aos pedidos do Ministério Público. No segundo caso, no entanto, a decisão foi favorável ao Ministério Público. Por isso, nos próximos meses, o grupo de trabalho da Promotoria da Infância e Juventude da Capital deve iniciar uma análise da situação financeira da instituição.