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Manifesto de Repúdio à Nota Técnica nº 11/19 MS e em Defesa da Luta Antimanicomial, do SUS e da Democracia!

O manicômio é a expressão de uma estrutura presente nos diversos mecanismos de opressão na sociedade

Os Princípios que fundam a Luta Antimanicomial, comprometem a Frente Estadual Antimanicomial de São Paulo (FEASP) e todos os Movimentos da Luta Antimanicomial com as lutas sociais por garantia de direitos e pelo protagonismo do Cidadão, à construção de uma sociedade que respeite as Diferenças e a Diversidade, e que seja mais democrática e igualitária.

A história de nosso país é fortemente marcada pela configuração de um Estado a serviço de interesses privados: sofreu até a década de 1980 com uma ditadura Militar, quando foram utilizados os Hospitais Psiquiátricos para justificar a Exclusão e a Segregação dos “indesejados da sociedade” (ou seja, população pobre, negra e periférica), foi também utilizado como instrumento para o isolamento e tortura de inúmeros dissidentes políticos e militantes de esquerda.

O manicômio é a expressão de uma estrutura presente nos diversos mecanismos de opressão na sociedade. A opressão nas fábricas, nas instituições de privação de liberdade de adolescentes, nos cárceres, a discriminação contra negros, homossexuais, índios, mulheres. Lutar pelos direitos de cidadania dos usuários de serviços de saúde mental e de álcool e outras drogas significa incorporar-se à luta de todos (as) os (as) trabalhadores (as) / Cidadãos (ãs) por seus direitos à saúde, justiça e melhores condições de vida!

Compreendemos que a promoção, a produção da saúde e a emancipação dos determinantes sociais, são indissociáveis da garantia de direitos sociais e da democracia.

A Organização Panamericana de Saúde, desde a Declaração de Caracas, em 1990, propõe que a reestruturação da atenção em saúde mental implique na revisão crítica do papel hegemônico e centralizador do hospital psiquiátrico na prestação de serviços. A Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza a progressiva substituição dos manicômios por uma gama de serviços territorializados e articulados em rede.

No Brasil, temos um longo histórico de lutas e conquistas, pela Reforma psiquiátrica Antimanicomial, que culminaram com as asseguradas pela lei 10.216/2001, pelas portarias subsequentes do Ministério da Saúde e com as deliberações (2012-2015) das Conferências de Saúde e Saúde Mental Intersetorial (2010), que vêm determinando a progressiva desinstitucionalização e desospitalização das pessoas em sofrimento psíquico, substituindo os manicômios por uma rede de serviços comunitários de saúde mental, tais como: Centros de Atenção Psicossocial, Serviços Residenciais Terapêuticos, Pensões Protegidas, Cooperativas de Trabalho, Oficinas de Geração de Renda, Centros de Convivência e Cooperativa e ações de saúde mental na Atenção Básica entre outros, além da criação de leitos de Saúde Mental em Hospitais Gerais. Todos estes dispositivos seguem a lógica da descentralização e da territorialização do atendimento em saúde, previstos na Lei Federal que institui o SUS (lei 8080/1990).

É com indignação que vemos a necessidade de, em pleno ano de 2019, termos novamente que nos posicionar contra a volta de uma política Fascista e Higienista de lidar com o Sofrimento Psíquico dos cidadãos.

Cabe aqui lembrar que os Hospitais Psiquiátricos foram e são palco de parte das grandes Barbáries cometidas no Brasil ao longo dos séculos, como ocorreu na Ditadura Militar onde presos políticos eram levados aos Hospitais Psiquiátricos, em Barbacena (documentado no “Holocausto Brasileiro”) e mais recentemente em Sorocaba-SP que foi alvo de Termo de Ajuste de Conduta das três esferas de governo com os MP-SP e MPF (ainda em vigor e aguardando conclusão). Além do fato do aumento de denuncias de violações nesses espaços manicomiais já noticiadas este ano pela mídia.

A volta do investimento em leitos de Hospitais Psiquiátricos e a inclusão das novas versões dos manicômios beneficia apenas seus proprietários, aqueles que lucram com a o Sofrimento Humano, o Higienismo e o Fascismo. A volta da centralidade da internação, segregação e exclusão na rede de saúde mental, álcool e outras drogas, denuncia o Governo Ditatorial segregacionista, preconceituoso que usurpou nossa Democracia.

O investimento nesses “serviços” manicomiais possibilita o retorno de práticas que ocorriam dentro dos Hospitais Psiquiátricos (algumas já são citadas na nota técnica nº 11/19 MS) onde esses Cidadãos ditos “Loucos” e/ou “Degenerados” “Drogados” sofreram com Eletrochoques (atualmente chamada de Eletroconvulsoterapia, que ainda é praticada por algumas instituições com a “justificativa” de “pesquisas”), Lobotomias (agora realizadas com micro-ondas), Trabalho Escravo (Laborterapia), castigos e punições físicas e psíquicas, obrigatoriedade de práticas religiosas, violação de correspondências e de outras comunicações, restrição ou impedimento de contato com o mundo exterior, isolamento (solitária), contenção física ou química, desassistência, medicalização da vida, dentre outras inúmeras violações aos Direitos Humanos. O argumento da pressuposta periculosidade, que o modelo manicomial se utiliza é intolerável, uma vez que o esperado por este sistema de justiça é que a sujeição às violências sociais seja legitimada, favorecendo que a população seja excluída da sociedade a fim de impedir a luta pelos seus direitos.

Essas violações ainda ocorrem hoje dentro dos Hospitais Psiquiátricos, Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, Clínicas Psiquiátricas e de tratamento para usuários de álcool e drogas e Comunidades Terapêuticas, em benefício da “indústria da Loucura” que lucra com o Sofrimento Humano; trazendo lucros imensos para os “Carrascos da Diversidade e Diferença”, incluindo os proprietários das instituições, políticos, pesquisadores, indústria farmacêutica dentre outros.

Apontamos também que a Nota Técnica nº 11/19 MS propõe a violação da (o):

Constituição Federal

Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

III – ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

Estatuto da Criança e Adolescente (inteiro):

Art. 19.  É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral.

A lei 10.216/01:

Art. 2º Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo.

Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:

– ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades;

II – ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;

III – ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;

IV – ter garantia de sigilo nas informações prestadas;

V – ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária;

VI – ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;

VII – receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento;

VIII – ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;

IX – ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.

Art. 4o A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, DECRETO Nº 6.949, DE 25 DE AGOSTO DE 2009,

Artigo 14:

“1. Os Estados Partes assegurarão que as pessoas com deficiência, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas:

a) Gozem do direito à liberdade e à segurança da pessoa; e

b) Não sejam privadas ilegal ou arbitrariamente de sua liberdade e que toda privação de liberdade esteja em conformidade com a lei, e que a existência de deficiência não justifique a privação de liberdade.

Denunciamos também que o SUS sofre com ataques e desmontes brutais dos mesmos setores da sociedade, incluindo a mídia que apoiam hoje esse governo fascista e o Desmonte do Sistema de Seguridade Social. Um conjunto de políticas públicas que são conquistas e patrimônios do povo brasileiro, que se encontram ameaçadas com a agenda de “reformas” apresentadas pelo atual governo, com graves consequências à universalidade, integralidade e equidade. Só existe Cuidado e Justiça Social na Democracia e só existe Reforma Psiquiátrica Antimanicomial e Atenção Psicossocial se todos os princípios do SUS, SUAS, CLT, ECA, Previdência Social e Direitos Humanos e a própria Democracia estiverem garantidos.

Para a superação da lógica manicomial que persistem em nossa sociedade, reivindicamos:

1. O fechamento de todos os Leitos de Hospitais Psiquiátricos, Clinicas Psiquiátricas, Comunidades Terapêuticas e similares, com a realocação dos recursos públicos para o financiamento da Rede de Atenção Psicossocial –RAPS;

2. Reforma Política com participação popular;

3. Democratização da Mídia e dos meios de comunicação;

4. O cumprimento integral do ECA;

5. A instituição de 10% da arrecadação Bruta para o financiamento do SUS;

6. Taxação das Grandes Fortunas e Heranças;

7.  A descriminalização do aborto;

8. A implantação de uma Política Pública de drogas Inclusivas e não Segregativas com o fortalecimento da Política de Redução de Danos e a Legalização das Drogas;

9. Legitimação por parte do Estado do Controle Social e da Participação Popular como espaços decisórios;

10. A implantação do Conselho Gestor em Todos os Serviços de Saúde;

11. Desmilitarização das Policias Militares;

12. Despatologização das orientações sexuais e identidades de gênero;

13. Por um modelo de atenção centrado na pessoa e na garantia dos Direitos Humanos;

14. Investimento público em Educação Popular em Saúde e em Direitos Humanos

15. A Gestão pública direta de recursos naturais

16. Fortalecimento e ampliação de práticas de cuidado que visem à integralidade da atenção, ampliação de redes de saúde e qualificação da formação profissional;

17. O Fortalecimento dos Princípios do SUS, SUAS e da Reforma Psiquiátrica, princípios da luta antimanicomial e atenção psicossocial na formação universitária acadêmica.

A Luta Antimanicomial integra-se à Luta por uma sociedade, Democrática, Inclusiva, Igualitária e que Respeite a diversidade e as Diferenças! Consideramos que não é possível existir Democracia sem Liberdade e sem Equidade!

Manicômio Nunca Mais! Por uma Democracia Antimanicomial!!!!

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