Ato da Frente Estadual Antimanicomial durou nove horas com apresentação de vídeos e debates que denunciaram a proposta do governo federal que favorece a volta dos manicômios e práticas de tortura.
Por Norian Segatto
Pouco antes do meio dia da quarta-feira, 16.dez, os canais de Youtube e as páginas de Facebook da Feasp – Frente Estadual de Luta Antimanicomial – e do SinPsi começaram a transmitir o grande ato contra o “revogaço”, proposta do governo para cancelar leis e artigos que garantem a assistência digna de portadores de doenças mentais e usuários de drogas. O que o governo genocida pretende com tal medida é retirar a responsabilidade do Estado pelo atendimento a essa população, abrir espaço para a iniciativa privada recriar os manicômios – travestidos de hospitais psiquiátricos – e encarcerar parte dos “inconvenientes” da sociedade.
Durante toda a tarde foram exibidos vídeos enviados por entidades e militantes da luta antimanicomial. Foram recebidos mais de 160 vídeos, dos quatro cantos do país. “Entendo que o evento foi um sucesso pois, a militância se engajou de tal forma que, mesmo depois do evento, continuamos recebendo vídeos para divulgação. São vídeos preparados com carinho, com sonhos e o unânime desejo de liberdade”, avalia e informa a diretora do Sindicato Estela Franzin, representante da entidade na Feasp e uma das organizadoras do ato.
Visibilidade e voz
Ao denunciar o desmanche proposto pelo governo na atenção à saúde mental, o evento deu visibilidade a usuários, familiares e trabalhadores do sistema. “Essa foi justamente uma das maiores contribuições do ato, a de tornar essas pessoas visíveis, dar voz a quem utiliza as RAPS, seja o usuário ou seus familiares, e àqueles que diariamente se dedicam ao cuidado dessas pessoas. Somos muitos e isso ficou expresso na quantidade e qualidade dos vídeos, foram 15 gigas de arquivos, que somam mais de oito horas de filmes”, afirma Moacyr Bertolino, membro da Feasp. Ele informa que todos os vídeos estarão, em breve, disponíveis nas plataformas do Youtube e Facebook da Frente.
Roda de conversas
Das 18h às 20h, em duas mesas de debate se revezaram estudiosos, parlamentares e personalidades da área de saúde, que, unanimemente, apontaram os erros da atual política do governo federal, tanto no combate à pandemia, quanto no desmonte das políticas de atenção à saúde, em geral, e à saúde mental, em particular.
Na primeira roda de conversa, sob o tema Cuidado em Liberdade no SUS, participaram os ex-ministros da saúde Arthur Chioro e José Gomes Temporão, o médico Alfredo Schechtman, o ex-coordenador nacional de saúde mental do Ministério da Saúde, Pedro Gabriel Delgado, a psicóloga Lumena Furtado, a dra. Ana Pitta, da Abrasme (Associação Brasileira de Saúde Mental), Rosangela Maria Silva, usuária do sistema e o neurologista Domingos Sávio Alves, que participou enviando um vídeo.
A segunda mesa, Garantia de Direitos, contou com a participação do ex-deputado Paulo Delgado, autor do projeto que deu origem à lei 10216, que humanizou e democratizou o tratamento da saúde mental, o psicólogo Lúcio Costa, do Mecanismo Nacional de Combate à Tortura, a jurista Déborah Duprat, vice-procuradora-geral da República de 2009 a 2013, a deputada federal Erika Kokay (PT-DF) e a usuária do sistema Simone Aparecida do Carmo.
Recuo da tarântula
No decorrer do ato, o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) entrou em contato com a Frente para informar que o governo recuara e não iria apresentar o projeto na reunião da CIT (Comissão Intergestores Tripartite, integrada por gestores do SUS), que foi realizada no dia seguinte, 17.
Em outubro, Bolsonaro e sua gangue haviam sofrido outro revés, quando teve de cancelar o Decreto 10530, que autorizava estudos para a privatização do SUS.
Na opinião de Moacyr Bertolino, o atual recuo tem de ser comemorado, mas não se pode cair na ilusão de que essa batalha acabou. “Conhecemos esse governo, ele age na surdina contra a sociedade e a democracia, por isso temos de nos manter atentos. Ele recuou agora, mas vai atacar novamente”.
Para não baixar a guarda, a deputada estadual Marcia Lia, já convocou uma audiência pública na Assembleia Legislativa de São Paulo, para o dia 17 de fevereiro, para debater o tema.
A íntegra da transmissão pode ser acessada pelo Facebook da Feasp.