O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária publicou, no último dia 30 de julho, resolução que dispõe sobre as Diretrizes Nacionais de atenção aos Pacientes Judiciários e Execução da Medida de Segurança. O documento recomenda a adoção da política antimanicomial no que diz respeito à atenção aos pacientes judiciários e à execução da medida de segurança. Preconiza-se a manutenção da proteção dos direitos das pessoas portadores de transtornos mentais. Além disso, o modelo assistencial de tratamento e cuidado em saúde mental deve ser antimanicomial, em serviços substitutivos em meio aberto. Eis texto completo da Resolução:
CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA
RESOLUÇÃO No- 4, DE 30 DE JULHO DE 2010
Dispõe sobre as Diretrizes Nacionais de Atenção aos Pacientes Judiciários e Execução da Medida de Segurança.
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA, no uso de suas atribuições legais, previstas no Art. 64, I, Lei nº 7.210/84, CONSIDERANDO a Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental; CONSIDERANDO os princípios e diretrizes aprovados na III Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada de 11 a 15 de dezembro de 2001; CONSIDERANDO os princípios e diretrizes aprovados na IV Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada de 27 de junho a 1 de julho de 2010; CONSIDERANDO a Resolução N° 5, de 4 de maio de 2004, deste Conselho, que dispõe a respeito das diretrizes para o cumprimento das medidas de segurança, adequando-as à previsão contida na Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001; CONSIDERANDO a Resolução N° 113, de 20 de abril de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que, entre outras providências, dispõe sobre o procedimento relativo à execução de pena privativa de liberdade e medida de segurança; CONSIDERANDO, finalmente, o aprendizado a partir do amadurecimento de programas pioneiros no Brasil de atenção a pacientes judiciários adotando a política antimanicomial; resolve:
Art. 1º – O CNPCP, como órgão responsável pelo aprimoramento da política criminal, recomenda a adoção da política antimanicomial no que tange à atenção aos pacientes judiciários e à execução da medida de segurança.
§ 1° – Devem ser observados na execução da medida de segurança os princípios estabelecidos pela Lei 10.216/2001, que dispõe sobre a proteção dos direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial de tratamento e cuidado em saúde mental que deve acontecer de modo antimanicomial, em serviços substitutivos em meio aberto;
§ 2° – Devem ser também respeitadas as seguintes orientações:
I – Intersetorialidade como forma de abordagem, buscando o diálogo e a parceria entre as diversas políticas públicas e a sociedade civil e criando espaços e processos integradores de saberes e poderes;
II – Acompanhamento psicossocial contínuo, realizado pela equipe interdisciplinar que secretaria o transcurso do processo e oferece os recursos necessários para a promoção do tratamento em saúde mental e invenção do laço social possível compartilhando os espaços da cidade, bem como realiza a coleta de subsídios que auxiliem na adequação da medida judicial às condições singulares de tratamento e inserção social;
III – Individualização da medida, respeitando as singularidades psíquicas, sociais e biológicas do sujeito, bem como as circunstâncias do delito;
IV – Inserção social, que promove a acessibilidade do sujeito aos seus direitos fundamentais gerais e sociais, bem como a sua circulação na sociedade, colocando-o de modo responsável para com o mundo público;
V – Fortalecimento das habilidades e capacidades do sujeito em responder pelo que faz ou deixa de fazer por meio do laço social, através da oferta de recursos simbólicos que viabilizem a resignificação de sua história, produção de sentido e novas respostas na sua relação com o outro;
Art. 2° – A abordagem à pessoa com doença mental na condição de autor do fato, réu ou sentenciado em processo criminal, deve ser objeto de atendimento por programa específico de atenção destinado a acompanhar o paciente judiciário nas diversas fases processuais, mediando as relações entre o Poder Judiciário e o Poder Executivo, visando à promoção da individualização da aplicação das penas e medidas de segurança e no encaminhamento das questões de execução penal dos pacientes judiciários;
I – A União e os Estados devem garantir que o programa específico de atenção ao paciente judiciário tenha extensão em todo o território nacional, podendo contar nos Estados com uma estrutura central e núcleos regionais ou municipais.
Art. 3º – São responsabilidades do programa específico de atenção ao paciente judiciário:
I – promover o estudo e o acompanhamento dos processos criminais e infracionais em que figurem pacientes judiciários, visando à elaboração de projeto individualizado de atenção integral;
II – realizar o acompanhamento psicológico, jurídico e social do paciente judiciário usando a rede substitutiva de serviços de saúde mental;
III – manter contato e articulação intersetoriais, em caráter permanente, com:
a) a rede pública de saúde, visando a efetivar a individualização do projeto de atenção integral;
b) a rede social, visando à promoção social do paciente judiciário e à efetivação das políticas públicas pertinentes ao caso;
IV – realizar discussões com peritos criminais nos casos em que houver exame de sanidade mental e cessação de periculosidade, apresentando, em caso de determinação judicial, dados relativos ao acompanhamento do paciente;
V – emitir relatórios e pareceres ao juiz competente sobre o acompanhamento do paciente judiciário nas diversas fases processuais;
VI – sugerir à autoridade judicial medidas processuais pertinentes, com base em subsídios advindos do acompanhamento clínico- social;
VII – prestar ao juiz competente as informações clínicosociais necessárias à garantia dos direitos do paciente judiciário.
Parágrafo único – Para o cumprimento das responsabilidades de que trata este artigo, serão realizadas diligências externas, sempre que necessário.
Art. 4º – Em caso de internação, mediante o laudo médico circunstanciado, deve ela ocorrer na rede de saúde municipal com acompanhamento do programa especializado de atenção ao paciente judiciário.
Parágrafo único – Recomenda-se às autoridades responsáveis que evitem tanto quanto possível a internação em manicômio judiciário.
Art. 5º – O paciente judiciário há longo tempo internado em cumprimento de medida de segurança, ou para o qual se caracterize situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será encaminhado para política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, conforme previsão no art. 5º da Lei 10.216, de 2001.
Art. 6º – O Poder Executivo, em parceria com o Poder Judiciário, irá implantar e concluir, no prazo de 10 anos, a substituição do modelo manicomial de cumprimento de medida de segurança para o modelo antimanicomial, valendo-se do programa específico de atenção ao paciente judiciário.
§ 1° – Será realizado levantamento trimestral de dados estatísticos sobre as medidas de seguranças impostas e executadas, de incumbência dos órgãos responsáveis pelos internamentos e tratamentos impostos.
§ 2° – O levantamento a que se refere o parágrafo anterior será realizado por equipe constituída pelo Ministério da Justiça, Ministério da Saúde, Ministério do Desenvolvimento Social e Conselho Nacional de Justiça.
Art. 7º – Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
GEDER LUIZ ROCHA GOMES