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Revide: espetáculo teatral aborda a questão da violência homofóbica

“Por trás de toda violência praticada, há um discurso. Na peça, este discurso é invocado para fazer justiça a um crime de ódio, mas continua servindo ao redemoinho infinito da barbárie”, diz diretor

Dois irmãos caminham de mãos dadas pela Avenida Paulista e são espancados por um grupo de jovens adolescentes. O caso ganha repercussão popular, pois um dos agredidos sofre de deficiência mental. Por causa do forte apelo midiático, um desconhecido decide vingar as vítimas por conta própria. Em Revide, espetáculo que abre a temporada teatral do Espaço Beta do Sesc Consolação em 2015, o dramaturgo F. A. Uchôa redimensiona episódios recentes da violência urbana acontecidos na cidade de São Paulo, tematizando os ataques homofóbicos na Avenida Paulista sob um ângulo que não discute a homofobia, mas sim a problemática da violência como um sintoma social mais amplo e inscrito na lógica das subjetividades.

A peça estreia dia 19 de janeiro e segue em temporada até 10 de fevereiro. Os espetáculos são às segundas e terças, às 20h. Criado durante os anos em que Uchôa estudou na SP Escola de Teatro, Revide foi selecionado por uma curadoria encabeçada por Marici Salomão e publicado na Revista A[l]berto, no primeiro número dedicado à dramaturgia contemporânea em julho de 2013.

O texto parte de duas perguntas: a) E se os agressores tivessem errado o alvo e acertado dois irmãos, um deles com problemas mentais? e b) E se o plano de vingança não partisse das vítimas, mas sim de um desconhecido que se sensibilizou pelo caso, dada sua abrangente cobertura midiática?

“Escrevi e dirigi Revide para esgarçar as fibras de extermínio que existem em todos nós. Quando o atentado homofóbico da Avenida Paulista veio à tona pela mídia, o que mais me chamou a atenção foram as contradições da massa: a comoção popular era pura apologia à violência, tanto da parte de quem surpreendentemente defendia os crimes, quanto da parte de quem os condenava”, explica o dramaturgo.

É a constatação de que São Paulo não é um bloco monolítico, mas sim uma arena de vozes, mesmo no âmbito da individualidade, que serve como ponto de partida para Revide. Trata-se de um trabalho de reinvenção da cidade e de suas figuras, por meio da ficção e da reelaboração de um fato marcante. Esta reinvenção não é a transposição direta da narrativa jornalística com seus personagens reconhecíveis, mas sim a evocação das forças intangíveis que movem os discursos e os crimes de ódio, daí sua potência dramatúrgica e, por extensão, artística.

Longe de portarem discursos sensatos, os indivíduos que comentam em redes sociais, blogs, portais de vídeos e notícias, dão um verdadeiro testemunho das forças multidirecionais que agem sobre a subjetividade de gente comum e normal, que se expressa livremente protegida pelo anonimato.

A encenação incorpora este argumento como forma, propondo um espetáculo de pulsão violenta permanente, com o objetivo de privilegiar os desvãos que existem em cada um de nós e que só se manifestam em situações-limite, muitas vezes, de forma truculenta.

Há ainda outro dado estrutural de extrema importância: Revide é um texto narrativo que cria tempo e espaço por meio da fala e realiza sua arquitetura dramatúrgica com ajuda da linguagem. A peça se passa em poucos planos concretos e em múltiplos espaços mentais. As cadeiras são signos pontuais do mundo real e a luz é responsável por desenhar linhas de escape na subjetividade das figuras que fazem a peça.

A opção pelo mínimo cenário serviu para privilegiar a criação de variados espaços e tempos, a partir da capacidade de presença dos atores. A narrativa transita o tempo inteiro entre realidade e delírio e, em certo momento, um passa alimentar o outro, de tal modo que as ações passam a ser determinadas por instâncias não-realistas, como por exemplo, o embate entre uma âncora de telejornal e o Gigio, o personagem homofóbico do texto. Mas a opção estética foi colocar todos os atores juntos em cena e fazer de uma peça que inicialmente poderia ser resolvida de modo fragmentado, um contínuo em que todos interagem, mesmo aqueles que não estão no mesmo espaço físico. São figuras que, antes de tudo, estão unidas por uma neurose coletiva de violência.

“Por trás de toda violência praticada, há um discurso. Na peça, este discurso é invocado para fazer justiça a um crime de ódio, mas continua servindo ao redemoinho infinito da barbárie. E a reação da vítima pode ser ainda mais truculenta que o ato inicial do opressor. Para que um ciclo termine, é preciso criar linhas de fuga. E Revide fala sobre isso”, completa.

O espetáculo integra a programação SP fora do postal, comemorativa dos 459 anos de fundação da cidade de São Paulo.

Ficha Técnica

Direção e dramaturgia:
F. A. Uchôa

Elenco:
Fernando Gimenes como Desconhecido
Lara Hassum como Âncora
Pérsio Plensack como Pai
Lucas Romano como Irmão
Bruno Bianchi como Gigio
Luis Fernando Delalibera como Vítima

Sinopse

Dois irmãos caminham de mãos dadas pela Av. Paulista e são espancados por um grupo de jovens adolescentes. O caso ganha repercussão popular, pois um dos agredidos sofre de deficiência mental. Por causa do forte apelo midiático, um desconhecido decide vingar as vítimas por conta própria.

Serviço
Estreia: Dia 19 de janeiro de 2015
Segunda, às 20h
Duração: 50 minutos
Temporada: Até 10 de fevereiro
Segundas e terças, às 20h
Recomendação etária: 14 anos
Preços: R$ 20, R$ 10 e R$ 6
Espaço Beta – 3º andar – Lotação: 50 lugares
Local: Sesc Consolação – Rua Dr. Vila Nova, 245
Tel: 3234-3000

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