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Trabalhadores ‘reestatizam’ unidades de saúde em São Paulo

Ambulatórios das zonas sul e leste voltam a ser administrados pela prefeitura após quase dois anos entregues a OSs; sindicato que reverter processo privatizante entre outros locais

Entre julho e agosto, os trabalhadores de dois ambulatórios públicos de São Paulo administrados por Organizações Sociais de Saúde (OSs) se mobilizaram e conseguiram que a gestão das unidades voltasse a ser feita diretamente pela prefeitura, o que deve ocorrer nos próximos meses.

São os ambulatórios do Jardim Peri-Peri (zona sul), administrado pela OS da Fundação Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, e de Sapopemba (zona leste), administrado pela Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM).

Nas duas unidades, as OSs foram implementadas há aproximadamente dois anos, porém a maioria dos trabalhadores continuou contratada pela administração municipal.

Entre as reclamações dos servidores estão denúncias de assédio moral e o não repasse de verbas, que deveria ser feito pela OSs, para manutenção e compras de equipamentos. No Jardim Peri-Peri, os servidores públicos também são contra os critérios que os trabalhadores das Faculdade de Medicina adotaram para atendimento de consultas.

Segundo o Sindicato dos Trabalhadores na Administração Pública e Autarquias no Município de São Paulo (Sindsep), a prioridade das OSs não está na qualidade do atendimento, mas na quantidade de consultas realizadas.

“Eles querem gerar números, porque é isso o que garante o repasse de verbas”, afirma o coordenador do sindicato, João Gabriel Buonavita.

De 15 consultas diárias que cada especialista deveria fazer, 11 eram primeiro atendimento e somente quatro para retornos, que não garantem repasse de verbas.

“Essas verbas deveriam ser destinadas para melhorias de toda a unidade, com reformas, manutenção, compra de equipamentos, mas não é o que acontece. Há dentistas que ficaram 4 meses sem broca para trabalhar, por exemplo”.

No Jardim Peri-Peri, apenas 14 dos 94 funcionários são contratados pela OS, sendo um médico, uma enfermeira, um auxiliar de enfermagem e 11 servidores em funções administrativos – os demais são funcionários municipais.

No Sapopemba, 89 trabalhadores são da prefeitura e 25 da OS, sendo dois médicos, uma enfermeira e demais com cargos administrativos. Segundo Buonavita, isso favorecia o assédio moral.

Os trabalhadores pretendem estender as mobilizações para reverter a administração em outras unidades de saúde, como no Hospital Benedito Montenegro, localizado no Jardim Ivo, zona leste, e o Hospital José Storopoli, na zona norte, ambos administrados pela SPDM.

“Estamos tendo sucesso em algumas unidades de saúde, mas a nossa luta é para revogar a lei que criou as OS, porque isso é terceirização do serviço público”, afirma o coordenador do Sindsep João Batista Gomes.

A RBA solicitou autorização da Secretaria de Saúde para visitar as unidades e conversar com os funcionários, mas teve o pedido negado. Informações solicitadas ao órgão sobre os contratos com as OSs também não foram respondidas. Segundo o sindicato, os funcionários foram orientados a não atender a imprensa.

“Há muita demora para o atendimento. Eu consegui marcar um exame para o próximo dia 5, mas o retorno só Deus sabe. Perguntei para a atendente se seria ainda nesse ano e ela disse que não sabia”, contou a esteticista Terezinha Maria de Lima, que se consulta com um endocrinologista no Ambulatório do Jardim Peri-Peri.

No outro lado da cidade, no Sapopemba, os relatos são parecidos. “Moro na rua de trás do ambulatório, mas busco atendimento no Hospital João XXIII, na Mooca, porque aqui demora muito e sempre faltam médicos. Ontem mesmo vim aqui atrás de um clínico e não tinha. As pessoas estavam passando com a enfermeira, mas ela não pode receitar remédios”, disse a dona de casa Ivania Batista.

Mobilização

Em julho os trabalhadores iniciaram protestos para a saída das OSs e pediram uma reunião com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Seguindo a legislação, eles têm o prazo de 180 dias para optar pela saída ou permanência da administração privada no ambulatório. Nas unidades de Sapopemba e Peri-Peri o governo anterior, de Gilberto Kassab (PSD), nunca tinha oferecido a possibilidade.

“Procuramos o Ministério Público, e conseguimos esse termo de opção em julho, para ser assinado até o dia 2 de agosto”, afirma.

O ambulatório do Peri-Peri oferece uma série de especialidades, com médicos atuando na região há mais de 10 anos.

“Não queríamos sair coletivamente, porque ninguém sabia o que aconteceria com essas equipes e como ficaria o atendimento aos pacientes. Decidimos lutar para que todos permanecessem. E a partir daí iniciamos um movimento de diálogo com toda comunidade”, conta Buonavita.

Em processo de negociação, o coordenador de saúde da região, Alexandre Filho, propôs uma gestão compartilhada, na qual um servidor público dividiria a coordenação da unidade com um funcionário da OS, mas a própria organização social não aceitou.

“Com essa recusa nós começamos o nosso movimento de paralisação, porque não aceitávamos que a administração do ambulatório continuasse daquela maneira.”

Os servidores suspenderam o atendimento ao público nos dias 4 e 11 julho e colheram 3 mil assinaturas para um abaixo-assinado exigindo que a administração voltasse para a prefeitura.

“Ainda não tínhamos conseguido reverter a situação até as vésperas de vencer o prazo para assinar o termo de opção e decidimos decretar greve por tempo indeterminado, a partir do dia 29 de julho”. Na mesma data os servidores e representantes do sindicato foram recebidos pelo secretário-adjunto da Secretaria de Saúde, Paulo Puccini, que decidiu pela retomada da unidade no prazo de 90 dias.

No ambulatório de Sapopemba, o processo de transição da administração teve início em 9 de agosto e deve ser concluído 90 dias depois. Os funcionários afirmaram que não têm informações oficiais sobre como as mudanças ocorrerão.

“A política do governo anterior dizia que as OSs viriam para melhorar os serviços nos ambulatórios e nada aconteceu, não houve melhoria nenhuma”, afirma a coordenadora da região Leste 3 do Sindicato dos Trabalhadores na Administração Pública e Autarquias no Município de São Paulo (Sindsep), Djalma Maria Prado.

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