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FSM: Psicologia aponta necessidade de desnaturalização dos desastres e de assistência integral à população

“Desastres não são naturais. Eles são o resultado da ação de uma sociedade que não se mobilizou para preveni-los. Um desastre é diagnóstico de uma falha institucional, de uma falha da sociedade naquele espaço e tempo. Deveria ser sempre objeto de avaliações e de aprendizagem”, concluiu (ou avaliou?) a socióloga Norma Valêncio, uma das poucas pesquisadoras especialistas em defesa civil no Brasil, em sua fala no debate “Por uma política pública de Defesa Civil: construindo a Conferência Nacional“, realizada na tarde desta quarta-feira, 27 de janeiro, durante seminário dos Conselhos de Psicologia no Fórum Social Mundial, em Porto Alegre (RS).

Valêncio apresentou dados que dão a dimensão do problema no Brasil: a cada ano, há cerca de 1,4 mil decretos de emergência por desastres reconhecidos pelo governo federal no país, ou sejam, entre um quarto e um quinto do total de municípios. Dados da Secretaria de Defesa Civil apontam que as mesmas cidades muitas vezes passam por situações de emergência relacionadas à seca e à chuva em um único ano. “Isso mostra que este município não sabe lidar com a gestão de água. Não é apenas um processo de degradação ambiental ou acelerado empobrecimento das famílias. Significa que o processo de desenvolvimento do Brasil está em risco. Há uma questão de fragilidade institucional, de autoridades que não percebem os riscos”, avalia a pesquisadora, que aponta os custos econômicos da falta de preparação e prevenção para as situações em que os fenômenos naturais tornam-se desastres, isto é, causam sofrimento humano. “Há dinheiro público jogado fora”, questiona, ao apontar que, sempre que a sociedade não resolve os problemas que causam o desastre, e atua apenas após a ocorrência de danos, ela “não eleva patamar de bem estar social porque está refazendo sempre a mesma coisa.”

Outro tema preocupante é a falta de institucionalização de procedimentos para situações recorrentes, segundo apontou o psicólogo Marcos Ferreira, mediador da mesa. “Todas as semanas há pelo menos um abrigo sendo montado no Brasil – por excesso de água, falta de água, vento, terremoto. Cada vez que se instala um abrigo é um susto, ninguém sabe bem como fazer”, apontou.

No debate, a psicóloga Cristina Silva avaliou como “insuficiente” a formulação que há no Brasil sobre a política voltada para as pessoas afetadas por emergências e desastres. “Há um confronto entre dois projetos: o que vigora hoje é ligado ao resgate de vítimas. A outra perspectiva tenta dar assistência integral à população por meio de assistência humanitária”. De acordo com ela, o primeiro projeto tem ênfase no saber militar, no resgate, nos equipamentos, que são necessários, mas não são tudo. “Este projeto não prevê a assistência humanitária, não sabe o que fazer com as populações após o socorro. Há uma aceitação de que todo desastre tem um passivo, que fica por conta de quem vive o desastre e que acaba por ser responsabilizado pela reconstrução material, psicológica, histórica do local destruído“, afirmou, defendendo o que chama de assistência integral e multidisciplinar.

Norma Valêncio e Cristina Silva concordaram que a realização da Conferência Nacional de Defesa Civil e Assistência Humanitária, prevista para março, poderia ser um momento importante para trazer a defesa civil para a sociedade. Para Marcos Ferreira, que falou em nome do Conselho Federal de Psicologia, esta oportunidade pode ser perdida.

“Temos a preocupação de garantir a efetividade da Conferência. É preciso que haja uma comissão organizadora estruturada. A área da Defesa Civil é fortemente controlada por poucos setores que historicamente atuam na área, e temos o risco de ter uma conferência que não seja de fato efetiva, perdendo a chance de realizar um debate que permita a sociedade se assenhorar do tema”, questionou.

O Secretário Nacional de Articulação Social da Presidência da República, Gerson Almeida, inseriu a Conferência Nacional de Defesa Civil no contexto das 65 conferências realizadas pelo governo Lula desde 2003, e apontou que estes eventos, assim como conselhos temáticos, acabaram se constituindo na forma mais dinâmica, intensa e permanente do diálogo com a sociedade para a construção de políticas públicas, defendido pelo presidente Lula.

*Psicologia crítica do trabalho na sociedade contemporânea*
A quarta mesa do Seminário promovido pelos Conselhos Federal e Regionais de Psicologia debateu o trabalho no contexto econômico e político atual, tema que foi, recentemente, objeto de seminário realizado pelo Conselho Federal. (http://trabalho.pol.org.br/)

Para a psicóloga Graça Jacques, desde o início de sua constituição como ciência a Psicologia não incorporou o trabalho como categoria constitutiva, o que, em sua opinião, deve acontecer. “Precisamos sim entender que a categoria trabalho é constitutiva da saúde mental e precisamos incorporar isso em nossa prática profissional. Isso não é fazer uma ou outra Psicologia, mas trazer a categoria trabalho para compreender a saúde do trabalhador. É uma Psicologia do trabalho que vá além de uma Psicologia aplicada ao trabalho.” Para Jacques, a permanência da categoria do trabalho é essencial para o entendimento da sociedade.

O palestrante Ricardo Amorim, economista, professor e pesquisador da Universidade Mackenzie, traçou um quadro geral da situação do trabalho atualmente. Odair Furtado abordou relações entre as percepções ligadas à posição das pessoas no mundo do trabalho e as dimensões subjetivas.

As mesas fizeram parte do seminário Sociedade, Trabalho, Justiça e Democracia: reflexões a partir da Psicologia, realizado no 10o. Fórum Social Mundial.

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