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Brasil promove pela primeira vez Conferências Conjuntas de Direitos Humanos

Pela primeira vez no país, centenas de representantes de idosos, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência, população LGBT, indígenas, pessoas de religiões de matriz africana e quilombolas, estiveram reunidos e unidos para discutir a transversalidade, a interdependência e a indivisibilidade dos direitos humanos. Essas foram as propostas das etapas das Conferências Conjuntas de Direitos Humanos, promovidas entre 24 a 29 de abril, em Brasília.

As atividades começaram com a 10ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CNDCA) e seguiram com a 4ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, a 4ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, a 3ª Conferência de Políticas Públicas de Direitos Humanos de LGBT, e, por fim, a 12ª Conferência Nacional dos Direitos Humanos.

Na pauta do debate, questões centrais como o fortalecimento do Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente, reafirmação dos compromissos contidos no Programa Nacional dos Direitos Humanos, mais recursos para os fundos destinados à pessoa idosa, fim do preconceito em relação às religiões africanas, entre outros.

Entre as demandas políticas dos povos indígenas no país, por exemplo, a líder indígena Sonia Guajajara destacou a garantia de direitos para “não permitir o retrocesso dos direitos adquiridos na Constituição Federal. A principal luta continua sendo a garantia do território, porque a partir daí a gente consegue garantir as outras políticas sociais, culturais e políticas para as mulheres. A gente não tem saúde diferenciada para as mulheres indígenas. Há especificidades que precisam ser atendidas”, afirmou.

Já o presidente do Conselho Nacional LGBT, Paulo Maldos, lembrou que a implementação das políticas públicas de promoção e defesa dos direitos humanos da população LGBT passa pelo compromisso das diferentes instâncias da sociedade e do Estado. “Essa implementação deve se dar de forma articulada entre os órgãos governamentais e a sociedade civil. A educação, a comunicação e a cultura também têm papel fundamental na formação da população brasileira. Além de promover uma educação de qualidade”, disse.

Em relação aos idosos, o presidente do Conselho Nacional de Direitos do Idoso, Luiz Legn?ani, ressaltou que todas as propostas estaduais, municipais e distrital deliberadas estão alinhadas com o Estatuto do Idoso e com o Plano Nacional do Idoso. “Nossa tarefa é acompanhar essas propostas para que sejam realmente executadas e efetivados cada um dos assuntos. Não podemos permitir o retrocesso. Temos que avançar cada vez mais”, afirmou Legn?ani.

Voz e vez

A participação ativa de crianças e adolescentes, por exemplo, foi o ponto forte da 10ª CNDCA. Quase 500 delegados crianças e adolescentes demonstraram que o protagonismo do segmento é possível e contribuiu para a elaboração de políticas.

Essa conferência contou com onze Plenárias Temáticas – seis para delegados adultos, quatro para adolescentes e um grupo de trabalho de crianças e três Plenárias de Eixos -, que discutiram Reforma Política dos Conselhos de DCA, construção e implementação do Plano Decenal e Política Nacional dos DCA.

Uma das mesas de debate, inclusive, sobre o tema “Participação enquanto direito humano de crianças e adolescentes”, foi composta, pela primeira vez numa Conferência, exclusivamente por crianças e adolescentes. Durante todo o encontro, eles fizeram também uma cobertura educomunicativa das principais discussões, podendo mostrar os seus pontos de vistas sobre o tema.

Na opinião do adolescente do Ceará, Kauan Furtado, de 16 anos, a educomunicação é revolucionária. “Se somos protagonistas da luta por direitos, temos que ser protagonistas da comunicação também, a gente vive em um mundo adultocentrico, temos que ser verdadeiros protagonistas”, explicou.

As crianças delegadas quebraram também o ritmo tradicional de votação e levaram para o palco da plenária final um grande mosaico representando suas propostas, “que significam o que a gente quer para o futuro, para o plano decenal e para os nossos direitos”, explicou Flávio, de 11 anos. “Tem muita criança lá fora que poderia estar aqui, mas elas não sabem nem que os direitos delas existem”, argumentou o menino sobre a proposta de maior divulgação do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).

Ao final, foram aprovadas 60 propostas, entre elas: assegurar e efetivar a participação de crianças e adolescentes nos Conselhos de Direito, com voz, voto e garantia de acessibilidade; incentivar a formação política e o estudo do ECA e da Constituição Federal; promover a articulação entre os Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional de DCA, para formular e deliberar uma política pública integrada; e articular com o Ministério Público a criação e regulamentação do Fundo da Infância e Adolescência (FIA) nos municípios onde não existe.

Rodrigo Torres, secretário Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, destacou o caráter histórico da conferência, com representação recorde de crianças e adolescentes, um terço dos 1400 delegados. “A gente provou aqui que vale a pena investir no protagonismo e na participação de crianças e adolescentes. Este é o principal legado e a principal conquista dessa conferência”, disse, na mesa de encerramento.

Novidades

Durantes as conferências, foram apresentadas ainda ações de promoção dos direitos humanos. Entre elas está o lançamento da campanha “Cuidar bem da saúde de cada um faz bem para todos. Faz bem para o Brasil” voltada para homens gays e bissexuais. A ação tem o objetivo de garantir saúde integral, atendimento humanizado e respeito para homens gays e bissexuais e trata-se de uma iniciativa do Ministério da Saúde e do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, das Juventude e dos Direitos Humanos.

Outra ação é a nova funcionalidade do aplicativo de celular Proteja Brasil, que passa a receber também denúncias de violações de diretos humanos do Disque 100. O aplicativo, que existe desde maio de 2014, além de mostrar a localização e os telefones das instituições especializadas mais próximas, como delegacias ou conselhos tutelares, se integra agora ao Disque Direitos Humanos.

Para acessar, basta clicar no ícone ‘denuncie’ e em seguida serão apresentadas quatro opções: ligar para o disque 100; denunciar local sem acessibilidade; violação na internet; e violação fora da internet. A denúncia é encaminhada ao sistema da Ouvidoria que tem a competência de receber, examinar e encaminhar as denúncias, além de atuar na resolução de conflitos sociais que envolvam violações de direitos humanos.

Pesquisas

Lançamento de pesquisas e estudos sobre o tema também fizeram parte dos eventos ao longo da semana passada. Na abertura da 12ª Conferência Nacional de Direitos Humanos foi apresentado, por exemplo, o Relatório anual do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, referente ao primeiro ano de atuação dos peritos.

Segundo o relatório, as unidades de privação de liberdade visitadas apresentam um perfil violador dos direitos humanos. A tortura e os maus tratos foram observados como práticas sistemáticas nos estabelecimentos visitados. No caso do sistema de justiça criminal e no sistema socioeducativo, a prática da tortura e maus tratos perpassavam todas as fases do processo de detenção, desde a custódia policial, até o cárcere. Nas unidades de saúde mental impera a lógica do submetimento contínuo, com excessiva contenção química e mecânica.

Nos três contextos eram comuns agressões, discriminação, superlotação e insalubridade. Constatou-se ainda a falta de transparência institucional e acesso a informação, havendo pouco ou nenhum registro de informações de rotina e ocorrências. Foram identificados ainda graves problemas de acesso à justiça, com diversas queixas de pessoas que alegavam desconhecer sua situação jurídica.

Além de identificar as condições de instalação e de tratamento às pessoas nos estabelecimentos visitados, o relatório também apresenta algumas medidas preventivas como: a criação de protocolos de uso de força; a criação de órgãos periciais com autonomia administrativa, política e financeira; e a realização da gestão direta por parte do Estado em suas unidades de privação de liberdade, revogando o modelo de cogestão com empresas da iniciativa privada.

*Com informações da Secretaria Nacional de Direitos Humanos.

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