Notícias

Em entrevista exclusiva, dirigente do SinPsi relata a experiência em uma escola ocupada

Os estudantes não se calaram perante a proposta do governo do estado de São Paulo, de fechar escolas, sob a alcunha de reorganização escolar. Mas parece que temos vitória à vista. Após semanas de mobilização de estudantes secundaristas, mães, pais, professores e milhares de apoiadores, após mais de 200 escolas ocupadas, após trancamento de rua, o governo do estado, pressionado, cedeu. Anunciou na tarde desta sexta-feira, 4 de dezembro, a suspensão da reorganização escolar.

A juventude se mostrou revolucionária e potizada. O SinPsi, reconhecendo a legitimidade de toda a mobilização, tem acompanhado a cobertura das ocupações, bem como a infeliz reação da polícia militar. Sensibilizado com o cenário, o dirigente do sindicato, Vinícius Saldanha visitou duas vezes a Escola Antônio Vieira de Campos, que ficou conhecida como Ocupação AVC, em Sorocaba, onde desenvolveu junto aos estudantes uma oficina de Fanzine*.

Vinícius fala ao SinPsi, com exclusividade, da experiência de fazer parte desse momento histórico de luta.

SinPsi – Por que visitar uma escola ocupada contra a reorganização?

Vinícius – Principalmente para expressar solidariedade e também conhecer a ocupação em si, entender melhor o que se passava ali, aprender com eles. Os estudantes levaram demandas às rodas de conversa, oficinas e aulas abertas. Queriam garantir que a ocupação tivesse um caráter educativo e social, para que se ampliasse o aprendizado e para que fossem potencializadas diferentes forças sociais nesse momento tão importante. Então pensei na Oficina de Fanzine, por já ter familiaridade com o produto no trabalho que desenvolvo em Assistência Social, mas principalmente por considerar um instrumento muito importante para o cotidiano escolar, ainda mais nesse momento de ocupação.

SinPsi – Quais eram os anseios dos estudantes?

Vinícius – Eles relatavam preocupação com o fato de que a direção da escola estava dizendo aos pais inverdades, como se os estudantes estivessem depredando a escola, fazendo baderna etc. Também manifestavam preocupação com o modo como a grande mídia estava abordando o tema, omitindo a postura estritamente opressora e antidemocrática do governo estadual. A mídia realmente focou na falsa ideia de vandalismo nas ocupações, né? 

SinPsi – E você presenciou alguma articulação para mostrar como funcionava a ocupação?

Vinícius – Sim, de cara. Eles criaram uma página no Facebook, para manter uma comunicação com a sociedade em geral, divulgando as diversas atividades que ali aconteciam, como roda de capoeira, sarau, rodas de conversa, oficinas, cine-debate. Eles tinham muita sede de mostrar a qualidade e a seriedade da ocupação. Estavam atuando coletivamente, com autonomia.

SinPsi – Se já havia comunicação via redes sociais, qual a importância da Oficina de Fanzine?

Vinícius – O Fanzine é mais um recurso de comunicação, com o diferencial de trazer um grande impacto comunitário, pois envolve as trocas de saberes e fazeres entre as pessoas envolvidas em sua produção, por ser um meio de comunicação que necessita de poucos recursos para ser feito também. É uma linguagem diferente, de uma dinâmica distinta da das redes sociais. A própria produção de conteúdo já é educativa em si. Uma Oficina de Fanzine é relevante para essa demanda de comunicação e também para o compromisso de formação cidadã desses estudantes.

SinPsi – E como foi desenvolver a Oficina?

Vinícius – A oferta da Oficina foi bem recebida pelos estudantes da Ocupação AVC. Conversamos sobre a história dos Fanzines e seu potencial de uso em diferentes contextos. Em um segundo momento, utilizamos diversos recursos, como recortes, colagens, desenhos, textos escritos à mão. A produção teve temática livre.

SinPsi – O que mais chamou atenção quanto ao conteúdo escolhido?

Vinícius – Foi perceber que a escola passou a ser vista como um lugar legítimo de ser ocupado, sendo relacionada à noção de direitos, palco de relações sociais que carecem de mais reflexão. O conteúdo foi permeado por uma visão crítica da escola e da Educação, que contrasta muito com a visão da escola burguesa, voltada para a formação de mão de obra. Outros temas presentes foram a participação social da juventude, a defesa da democracia, a democratização da mídia e a luta das mulheres. 

SinPsi – Que aprendizado você pôde ter com essa experiência?

Vinícius – Ao contrário do que dizem os conservadores – que a escola não deve discutir questões sociais, como questões de gênero, de violência, de política, e que os alunos são desinteressados – o que as experiências nas ocupações têm nos mostrado é a de que há muito espaço, pertinência e vontade dos estudantes para que esses temas possam sim ser abordados. Os estudantes estão politizados, nunca alienados aos assuntos da conjuntura política e social atual.

SinPsi – Os fanzines já estão disponíveis? Como podemos conferir?

Vinícius – Eles serão disponibilizados pelos próprios estudantes na página da Ocupação AVS no Facebook e também estão sendo providenciadas cópias físicas para distribuição na comunidade. Novos Fanzines começaram a ser produzidos à medida que outros estudantes da ocupação foram tomando contato com o material pronto. Inclusive há a possibilidade de haver certa periodicidade, para pautar temas do cotidiano da escola.

Clique aqui para ver mais fotos da Oficina de Fanzine no Facebook do SinPsi.

*Fanzine é um tipo de publicação alternativa, versátil, independente, que pode ser feita por qualquer pessoa, sem a necessidade de grandes aparatos de produção e de impressão, tendo formato, tiragem e periodicidade variáveis, de acordo com a disponibilidade de quem produz. Em síntese, o Fanzine é um meio democrático de comunicação, pois qualquer pessoa pode fazer, e também porque permite que as pessoas que não se sintam representadas pelos grandes meios de comunicação (televisão, rádio, grandes jornais e revistas etc.), possam expressar suas ideias, opiniões e dar informações que muitas vezes não aparecem na grande mídia.

Deixe um comentário