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Liberdade, autonomia e inclusão social

Precedido por um desfile de moda da grife Dasdoida, com peças confeccionadas por pacientes, que também desfilaram vestindo suas criações, foi lançada oficialmente na Assembleia Legislativa, nesta quinta-feira, dia 18, a Frente Parlamentar de Apoio à Luta Antimanicomial. Composta por 23 parlamentares e coordenada pelo deputado Fausto Figueira (PT), a frente objetiva contribuir com a mudança do atendimento público em saúde mental, garantindo o acesso da população aos serviços e o respeito a seus direitos, já assegurados pela Lei Federal 10.216/2001. A tônica do debate foi a adoção urgente de políticas públicas voltadas para a área de saúde mental, a inclusão social dos pacientes, o apoio psicológico aos pacientes e seus familiares e o tratamento medicamentoso adequado, para que a internação de pacientes ocorra em último caso.

De acordo com os palestrantes, entre eles os parlamentares, a reforma do sistema de saúde mental representa uma grande mudança no modelo de tratamento adotado por muitos anos pelo sistema de saúde: o isolamento social e familiar. Fausto Figueira ressaltou que o Poder Público deve proporcionar o atendimento médico adequado e sustentar que internar os pacientes, privando-os de liberdade, não é uma alternativa saudável.

O presidente do SinPsi, Rogério Giannini, presente ao ato de lançamento, ressaltou a importância desta iniciativa no sentido de oferecimento de direitos de cidadania e de convivência social aos portadores de transtornos mentais. “O transtorno mental sempre foi carregado de preconceito, já que o chamado louco é o desconhecido, é o perigoso. A Lei 10.216/2001, uma conquista social da nossa luta, foi um divisor de águas na questão. A política de enxergar os direitos dos portadores de transtornos psíquicos é da maior radicalidade, pois não dá para pensar a fundo o problema sem mudar tudo, inclusive a forma como está organizada a sociedade. Temos de disputar verbas públicas com outras áreas primordiais, mas nossa luta tem um aspecto especial, pois se trata de reconhecer o sujeito na sua essência”, declarou o presidente do SinPsi. Giannini encerrou sua participação falando da importância de se ver a saude sobre o prisma econômico e político já que são fundos públicos que são disputados e nem sempre por quem tem legitimidade. “Os fundos públicos acabam sendo capturados pela enorme rede privada que presta serviços, mas também pelos laboratórios farmacêuticos, pela indústria ligada aos exames de imagem e todo o complexo industrial que envolve a saúde. O PIB da saúde já passa de 200 bilhões ano no Brasil. Defender a saúde é ir bem além da defesa da assistência, é uma questão econômica estratégica”
*Frente parlamentar propõe a criação de mais Centros de Atenção Psicossocial*
A representante do secretário de Saúde, Regina Bichaff, coordenadora estadual de saúde mental, informou que levantamento da Secretaria de Saúde constatou que em todos os hospitais psiquiátricos do Estado existem 6.349 internos. “O caso mais antigo é de uma paciente internada há 67 anos. E isso é uma responsabilidade muito grande para o Estado e para os municípios.” A médica esclareceu que a reforma do sistema psiquiátrico existe há 30 anos e comenta que, apesar de ser recente, a Lei 10.216/2001 não é perfeita. “Mas foi o que a sociedade pôde aceitar. O que temos de fazer é aprimorá-la e defendê-la.”

Rosângela Elias, da Secretaria Municipal de Saúde da capital, relatou os avanços conquistados pela luta antimanicomial. Segundo ela, dois hospitais psiquiátricos foram fechados recentemente e, no sentido de se ter uma estrutura para a chamada “desospitalização”, foram criadas residências terapêuticas para responder às necessidades de moradia dos portadores de transtornos graves, egressos de hospitais psiquiátricos, hospitais de custódia ou em situação de vulnerabilidade.

“A inclusão está acontecendo, mas ainda temos muitos desafios pela frente. Já existem vários Centros de Atenção Psicossocial (Caps), mas necessitamos de muitos mais, além de mais Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf) e de mais leitos em hospitais gerais. A 4ª Conferência Municipal de Saúde Mental de São Paulo está próxima, nos dias 9, 10 e 11 de abril, e o Movimento da Luta Antimanicomial deve estar presente para apontar diretrizes a serem seguidas daqui em diante”, disse Rosângela.

*Liberdade e autonomia*
Para Maria de Lima Salum, do Conselho Regional de Psicologia, a exclusão tem sido o caminho usado desde a Idade Média para lidar com os loucos, e citou o psiquiatra Michel Foucault ao dizer que “nós os banimos da nossa consciência”. Ela informou que o movimento sofre ataque de grandes corporações, da mídia e de outros setores da sociedade, que os culpam pelo aumento dos moradores de rua. “Temos leis, mas elas não são cumpridas; nossas ações sociais ainda são inibidas por uma visão social que acorrenta o louco”, afirmou. Para ela, é necessário que se invista nas Unidades Básicas de Saúde, dotando-as de profissionais de saúde. Além disso, relatou a ajuda que o Ministério Público tem dado para o cumprimento da lei, fechando estabelecimentos psiquiátricos.

Pedro Gabriel, coordenador nacional de Saúde Mental, destacou que uma das metas da luta antimanicomial é a autonomia dos pacientes pela via do trabalho, como acontece, por exemplo, com a Oficina Experimental de Moda Dasdoida. “Nossa luta é pela liberdade, autonomia e direito à diferença. Já houve mudanças significativas desde a implantação da Lei 10.216/2001, mas ainda há muito o que fazer. Interessa construir um caminho em direção aos direitos humanos”, disse. Ele informou que haverá a 4ª Conferência Nacional de Saúde Mental entre os dias 27 e 30 de junho, em Brasília. “Na conferência discutiremos as redes não hospitalares, o financiamento para a saúde mental, e como estão funcionando os Centros de Atenção Psicossocial, entre outros assuntos de interesse da frente e do Movimento Antimanicomial. Será um momento grandioso para nossa luta”, acrescentou Gabriel.

*Participantes*
A mesa de debate foi composta pelos deputados Fausto Figueira, Simão Pedro, Marcos Martins, Vanderlei Siraque e Vicente Cândido, todos do PT; Regina Bichaff, coordenadora Estadual de Saúde Mental, que representa o secretário Estadual de Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata; Rosângela Elias, coordenadora municipal de Saúde Mental, representando o secretário municipal de Saúde da capital, Januario Montone; Rogério Giannini, presidente do Sindicato dos Psicólogos no Estado; Maria Morais, vice-presidente do Conselho Regional de Psicologia; e Julia Catunda, psiquiatra e coordenadora da Oficina Experimental de Moda Dasdoida.

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