Notícias

Movimentos sociais entregam carta à Presidência em defesa do Programa Nacional de Direitos Humanos

“A impunidade de ontem, é a impunidade de hoje”. Foi essa a forma que a coordenadora do Observatório das Violências Policiais, Ângela Almeida, utilizou para apontar a urgência de abrir os arquivos da ditadura militar (1964-1985) e julgar os agentes do Estado que torturaram e assassinaram milhares de brasileiros durante os anos de repressão política.

A declaração ocorreu em um ato na manhã dessa quinta-feira (14) diante do escritório de representação da Presidência da República, na Avenida Paulista, quando entidades dos movimentos sociais protocolaram uma carta endereçada ao presidente Luis Inácio Lula da Silva em apoio ao terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Entre outros pontos, o programa prevê a instalação da Comissão da Verdade para apurar e esclarecer publicamente as violações de direitos praticadas durante os ‘anos de chumbo’.

“Não mudaremos a situação do dia para a noite, mas seria um grande passo porque a tortura, as execuções, as abordagens truculentas, a invasão das comunidades pobres e a repressão violenta de protestos por parte da polícia militar estão banalizadas. Uma comissão da verdade teria o papel fundamental de começar a descrever e até ensinar que isso é um crime de lesa-pátria”, acrescentou Ângela.

*Incômoda democracia*
Outros objetivos estratégicos que tem provocado chilique dos setores conservadores da sociedade são a incorporação dos sindicatos e centrais sindicais nos processos de licenciamento ambiental das empresas, a descriminalização do aborto, o reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo e a realização de audiência coletiva como ato inicial da mediação entre envolvidos em conflitos agrários e urbanos.

O caráter democrático do PNDH-3, construído a partir das resoluções da 11ª Conferência Nacional de Direitos humanos e em combinação com as definições de outras conferências nacionais, foi destacado por parlamentares presentes na manifestação, como o deputado federal Paulo Teixeira (PT/SP). “Esse plano é uma obra da sociedade brasileira que atende demandas históricas de vários segmentos como os deficientes físicos, as mulheres, os negros, o público LGBT. E pela primeira vez na história do Brasil um documento trata da instalação de uma comissão que apure e puna as atrocidades cometidas pela ditadura militar”, afirmou.

Um dia após o presidente Lula editar um decreto excluindo o termo “repressão política” do item que trata da criação da Comissão da Verdade, em referência aos agentes do Estado, deixando espaço para uma possível interpretação de que as frentes de resistência à ditadura também poderiam ser investigadas, Teixeira lembrou que o programa é apenas o primeiro passo. “Se entendermos que a criação desse plano fecha a página sobre a tortura durante o regime militar, teremos uma grande frustração. Da mesma forma que ocorreu na Argentina, no Chile, no Uruguai e em outros países da América Latina e da Europa é algo processual”.

O deputado aproveitou para criticar personalidades políticas que utilizam o espaço aberto pelo debate apenas para tentar arrancar alguma publicidade em ano eleitoral. “Queremos uma democracia plena neste País e para isso precisamos de mobilização, não de alguns que usam o tema só para marcar presença. Vamos criar um grande pólo pela defesa do documento na Câmara a partir da Comissão de Direitos Humanos”, comentou.

*E a mídia?*
De todos os pontos, aquele que obviamente tem gerado maiores ataques da mídia é a regulamentação de mecanismos que permitem suspender patrocínio, publicidade oficial e até mesmo cassar a concessão de canais de rádio e TV que desrespeitem os direitos humanos. “Não podemos admitir que as concessões públicas continuem violando esses direitos e isso não seja considerado nas renovações da outorgas desses veículos, que são concessões públicas”, ressaltou João Brant, do coletivo Intervozes.

*Expandir a mobilização*
À noite, lideranças de entidades em defesa da Justiça e da democracia voltaram a se reunir, dessa vez no auditório Vladimir Herzog, na sede do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo. O local não poderia ser mais apropriado: em outubro de 1975, o jornalista Herzog, então diretor da TV Cultura, foi ‘suicidado’ nas dependências do Doi-Codi (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna), órgão de inteligência e repressão do governo brasileiro. Seu assassinato unificou e fortaleceu a luta pelo fim da repressão.

Perante o público que ocupava todas as dependências do local, Rose Nogueira, do grupo Tortura Nunca Mais, desmentiu o caráter autoritário que os meios de comunicação tentaram colar no terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos. “Quem participou da Conferência Nacional de Direitos Humanos, em 2008, sabe que o documento é fiel a essa encontro e, portanto, aos anseios da sociedade civil. Inclusive, tivemos a presença de dois delegados do Ministério da Defesa”, disse.

Membro da Comissão de Familiares de Presos Políticos, Criméia de Almeida comentou sua insatisfação em relação a uma alteração que ocorreu por parte do governo antes da publicação do PNDH-3. “Deve ter haviado um acordo interno antes da divulgação, porque a comissão era de verdade e justiça, não apenas de verdade, já que podemos saber a verdade e aceitar as atrocidades sem lutar pela justiça”, explicou.

Por fim, ela destacou a função social do julgamento dos torturadores. “Direitos humanos para nós são as punições dos crimes, como forma de garantir que não se repetirão no futuro.”

Deixe um comentário