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Professor Dowbor, da PUC-SP: ‘Atacar nossos resultados no combate às desigualdades é um absurdo’

Economista apresenta números internacionais sombrios e diz que o Brasil é exemplo positivo

O economista Ladislau Dowbor tem por hábito fazer um diagnóstico agudo sobre a situação de desigualdade e injustiça sociais existente no planeta. Mas não é apenas seu senso de humor que demonstra não ser ele um pessimista. Ao falar dos avanços recentes no Brasil, afirma acreditar ser possível mudar o quadro.

O professor da PUC São Paulo participou da mesa de abertura das atividades desta quarta-feira, 30, da 14ª Plenária Nacional da CUT, em Guarulhos, para debater o tema “Desenvolvimento Econômico e Social”.

Com sonoras estatísticas, obtidas a partir do cruzamento de diversas fontes internacionais, ele abriu sua fala pintando um quadro sombrio. Segundo a ONU, 2,2 bilhões de humanos estão na miséria, entre os 7 bilhões que vivem na Terra. Os números do Banco Mundial são mais ásperos, apontando 4 bilhões na miséria.

Se assim não fosse, cada família de quatro pessoas ao redor do mundo viveria com aproximadamente US$ 7 mil por mês. “Isso quer dizer que todos poderiam desfrutar de conforto”, conclui. A conta de Dowbor é de dividir: se o PIB mundial está em torno de US$ 7 trilhões e a população é de 7 bilhões, a renda per capita bem poderia ser outra.

Paraísos fiscais             

A marca da maldade pode ser rastreada. Segundo pesquisa do Instituto Federal Suíço (“o MIT da Europa”, segundo o professor), de US$ 21 trilhões a US$ 31 trilhões estão em paraísos fiscais, aplicados no sistema financeiro, passando por “lavanderias” que recebem dinheiro oriundo do tráfico de drogas, de pessoas, de armas e outros crimes.

“É o estoque do dinheiro no mundo. É o estrangulamento da poupança e do investimento produtivo. Esses números começam a ser divulgados por jornalistas independentes, por pesquisadores, e por publicações como a The Economist. Calcula-se que há o equivalente a 25% do PIB brasileiro em paraísos fiscais”, informou Dowbor.

Dando suporte a esse estado de coisas, 737 grupos empresariais detêm 80% do poder corporativo do mundo. Dentre eles, 147 dominam 40% desse poder. 75% desses grupos são formados por bancos. “Ou seja, não são mais os produtores que mandam. São os intermediários, é o sistema financeiro especulador”, diz.

Santander e o lucro no Brasil

Para ilustrar o comportamento desse setor, o professor da PUC-SP usou como exemplo o Santander, banco que recentemente fez críticas à economia brasileira. “Os juros do cartão de crédito do Santander aqui no Brasil são de 160% ao ano. Na Espanha, são de 0% até o limite de 5 mil euros”, disse.

Mas esses gigantescos diques podem ser rompidos, segundo ele. “A decisão de como uma sociedade vai usar os seus recursos é fundamental. Isso exige organização e luta popular, das entidades populares. E os exemplos históricos mostram que as mudanças não ocorrem da noite pro dia”, lembrou.

“Aqui no Brasil temos registrados muitos avanços, mas a roupa anterior à chegada de Lula à Presidência, a casca, que é a estrutura pública e as reminiscências do neoliberalismo, está travando o processo. Precisamos de reformas para dar um segundo salto”, disse.

Citando dados do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) divulgados seis dias atrás, Dowbor mostra que entre 1991 e 2010 houve o que chama de “revolução extraordinária” no Brasil. “É bom que esses números não cubram apenas o período dos governos Lula e Dilma, pois não permitem que sejamos chamados de parciais”, comenta ele, que fez uma leitura ampliada do último relatório do PNUD.

Elogio à experiência brasileira

No período analisado, o número de municípios brasileiros com IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) abaixo de 0,50 caiu de 85% do total para 32%. “Portanto, gente, não há ‘vôo de galinha’, não há extremismo pessimista de ‘Veja’ ou da oposição capaz de negar o que está acontecendo no Brasil”, afirmou. “Atacar os nossos resultados positivos é um absurdo”.

Lembrou que a expectativa de vida do brasileiro elevou-se de 65 para quase 76 anos no mesmo período. “Agora o brasileiro tem 11 anos a mais para dizer que esse governo não está dando certo”, disse, provocando risos na plateia.

Em sintonia com o princípio de que a superação das desigualdades exige melhor distribuição, Dowbor recomendou a leitura de artigos e livros de sua autoria e de outros pesquisadores que ele coloca à disposição gratuitamente em seu site, http://dowbor.org/, citando especialmente dois: “Plano B 4.0” e “Os Estranhos Caminhos do Nosso Dinheiro”.

Produção versus reprodução

Nalu Faria, da Marcha Mundial de Mulheres, que participou da mesa, defendeu a ideia de que a mesma astúcia do sistema capitalista para criar a “falsa ideia de que desenvolvimento econômico e social são coisas separadas” criou uma artificial diferença entre produção e reprodução.

Como consequência, há um senso comum de que a produção econômica não tem relação com a reprodução humana. Por conta disse, explicou Nalu, persiste a falsa noção de que a reprodução é de foro simplesmente familiar e de que sempre haverá uma mulher para cuidar dos filhos e do serviço doméstico.

“Por conta disso as políticas públicas ainda são marcadas por essa noção de que as mulheres têm todo o tempo disponível para cuidar, sozinha, dessas tarefas, como se não fossem também trabalhadoras no mercado”, disse Malu. “Um exemplo disso são as creches públicas, que servem uma senha para a inscrição às 8 horas da manhã para que a mulher seja atendida somente às 11 h. Por que isso? Porque acham que estamos sempre à disposição”, completou.

Portanto, na opinião de Nalu, a busca por um desenvolvimento social deve ser norteada pelo conceito de bem-estar. “Isso nos colocará na busca pela reprodução da vida, e não na reprodução do mercado”.

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