Por Vinicius Saldanha – Secretário de formação do SinPsi
A diretoria do Sindicato das (os) Psicólogas (os) do Estado de São Paulo saúda a todas (os) trabalhadoras e trabalhadores e, em especial, à categoria das (os) psicólogas (os) por ocasião desse histórico 1o de maio de 2020. Mais do que isso, promove um chamado à tomada de consciência para a luta em um momento que exige de todas (os) nós o engajamento e que tende a impactar significativamente as vidas, não só desta, mas também das futuras gerações.
Como sabemos, todo dia é dia de fazer história. Mas há dias, meses ou anos que se manifestam de maneira tão emblemática que são capazes de transcender seu tempo cronológico. Esse 1o de maio evoca não só toda uma gigantesca trajetória de lutas das (os) trabalhadoras (es), mas o faz frente a um período de mudanças e crises estruturais sem precedentes e de amplas e profundas proporções, o suficiente para ameaçar paradigmas e tornar a construção de utopias, no melhor sentido do termo, algo fundamental.
Dadas as graves ameaças que atingem as múltiplas dimensões da vida humana, conceber outra sociedade, que nos eleve a outro patamar de qualidade de vida, de relações, de produção e de princípios éticos é uma tarefa literalmente obrigatória para a sobrevivência. E é também tarefa fundamental para nossa Psicologia, para a qual o compromisso social é um imperativo ético. Da ciência à prática profissional, somos convocados a zelar pelos direitos universais e lutar por uma sociedade justa, igualitária, e contra todas as formas de violência, crueldade e opressão.
Para além das demandas concretas ligadas às várias crises que se interlaçam, como a crise sanitária, social, política, econômica e ambiental, o momento atual é reflexo da crise do sistema capitalista em si, e deve ser concebida enquanto tal, pois um possível erro de avaliação fatalmente levaria ao erro na tomada de ação. É importante a nitidez sobre o trajeto percorrido para chegar até aqui, assim como as alternativas a serem construídas no horizonte próximo. Colhemos hoje indesejáveis frutos de um sistema que se pauta pela concentração de riquezas e de poderes nas mãos de uma minoria e por uma inerente competitividade que se materializa no dia a dia no total desprezo pelo bem comum, nas condições precárias de vida, na brutal exploração da força de trabalho, na degradação ambiental e na negação de direitos.
Ao mesmo tempo em que o mundo encara a mais absoluta necessidade de somar esforços para o enfrentamento conjunto, ainda vivemos sob um sistema que é incapaz de produzir respostas às demandas do conjunto da sociedade. Pela desigualdade de renda, de condições de moradia, de acesso a bens e serviços, pela desigualdade entre países e pela produção orientada especificamente pelo lucro, o capitalismo não consegue oferecer ao mundo o que de fato mais precisamos, trabalho decente, proteção social, saúde, segurança. E o que se torna mais evidente nesse atual momento é: ou se garante isso para todos, nem mais, nem menos, ou se corre um sério risco de não conseguir garantir para ninguém.
Entretanto, se é uma verdade que nos encontramos todos imersos em uma totalidade que se vê em si mesma ameaçada, também é verdade que somos atingidos de modos distintos. Por isso, não há de se duvidar da capacidade do capitalismo em se adaptar da maneira que for preciso para manter a ordem desigual, em especial no Brasil, que hoje apresenta uma das faces mais cruéis desse sistema, com um governo francamente autoritário, que aposta no ódio e no caos como instrumentos de dominação e que impõe aos seus cidadãos e cidadãs o trabalho em detrimento da proteção à própria vida. O discurso que sustenta toda essa barbárie gira em torno da necessidade de salvar a economia. Sabemos, entretanto, que essa economia que desejam salvar é a dos privilégios para os 1% ao custo dos direitos e das vidas dos outros 99%.
Portanto, para a construção do caminho da sociedade por nós desejada, é necessário estarmos atentos (as). Não é possível conceber a atual crise como algo pontual, dados os limites cada vez mais acirrados entre o modo de produção capitalista e as condições dignas de existência humana, o que se torna cada vez mais evidente frente ao já, há tempos, alertado colapso ambiental, do qual a atual pandemia é uma das primeiras e mais graves consequências. De igual modo, não se pode apostar em resoluções mágicas que supostamente levariam a humanidade a um novo patamar de reflexão e de relação sem o devido trabalho de base e sem o enfrentamento aos seus desafios centrais. Tampouco se pode apostar nas aparentes fissuras na classe capitalista, pois já há exemplos robustos de que ela, no limite, se mantém unida no que lhe é mais fundamental: a continuidade da exploração da classe trabalhadora.
O processo passa, portanto, pelo reconhecimento e pela mobilização da classe trabalhadora enquanto tal. Diante disso, é importante reafirmar que somos psicólogas e psicólogos, trabalhadoras e trabalhadores, que, em seus mais diversos campos e formas de atuação, necessitam de seguridade, de direitos, de garantia de recursos para o exercício técnico e ético da profissão, de políticas públicas fortalecidas e orientadas pelo bem comum, de relações mediadas pelo diálogo, pela participação democrática, pela solidariedade e pelo respeito à diversidade. É hora de, mais do que nunca, lutar para que o necessário isolamento não se transforme em muros que nos afastem de nossos direitos. É preciso lutar por outro modelo de civilização. Não há como se fazer isso sem a crescente reflexão sobre a coletividade. No isolamento. No sair e no voltar pra casa. No trabalho. Na vida.
Por fim, nesse 1o de maio nos somamos as demais forças progressistas que compreendem a importância de derrubar o autoritarismo no Brasil como tarefa inicial para construir, pelas mãos das trabalhadoras e trabalhadores, um país consonante com os desafios que se colocam hoje em escala global e à altura das demandas populares. Por isso, também gritamos: “Fora Bolsonaro! Abaixo ao Fascismo! Viva os trabalhadores e trabalhadoras!”